João Pessoa, 25 de maio de 2025 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Numa reunião semanal em uma empresa de tecnologia em Campina Grande, o estagiário se preparava para apresentar uma ideia. Antes que concluísse, a gerente o interrompeu: “Isso é bonito, mas não ajuda a bater a meta do mês.” O silêncio que se seguiu foi mais eloquente que qualquer gráfico. A proposta ousada ficou na gaveta. E junto com ela, o entusiasmo de quem queria contribuir além do mínimo esperado.
Essa cena resume um dilema recorrente nas empresas contemporâneas. Estamos viciados em metas, prazos e indicadores e estamos esquecendo de cultivar ideias, escutar vozes novas e valorizar o pensamento criativo. O resultado é uma cultura de repetição, onde o foco exclusivo no desempenho imediato sufoca o potencial de transformação que mora na liberdade de imaginar.
Edward Deci, um dos principais nomes da psicologia da motivação, chama isso de motivação extrínseca: quando o comportamento é guiado apenas por recompensas externas, como bônus, status ou reconhecimento público. Embora eficaz no curto prazo, ela tende a corroer o engajamento autêntico. As pessoas passam a fazer apenas o necessário para atingir o alvo. Pensar além se torna risco. Ousadia vira desperdício. E o trabalho perde a alma.
A criatividade não nasce do medo. Nem floresce sob pressão constante. Para que ela apareça, é preciso criar ambientes que acolham a curiosidade, o erro e o improviso. Empresas que estimulam a motivação intrínseca entendem que produtividade não é apenas cumprir metas, mas também gerar valor a partir do que se é, e não apenas do que se mede. Dar sentido ao trabalho é tão importante quanto organizar tarefas.
Na prática, isso exige mudança de mentalidade. Significa trocar o controle excessivo por confiança. Significa aceitar que nem tudo pode ser mensurado em planilhas e que o valor de uma boa ideia não aparece imediatamente nos relatórios. É ter coragem de ouvir quem nunca falou, testar o que nunca foi feito e permitir que o inesperado aconteça, mesmo que não encaixe no cronograma.
No interior do Cariri paraibano, um pequeno ateliê de design decidiu substituir o sistema rígido de metas semanais por desafios mensais abertos. Cada colaborador escolhe como vai contribuir. O resultado? Mais engajamento, mais inovação e, curiosamente, mais resultados. Os clientes perceberam a diferença. As entregas ficaram mais originais. E o time, mais motivado. Tudo isso sem precisar de bônus ou pressão. Apenas com propósito.
Há uma diferença enorme entre cobrar produtividade e estimular protagonismo. A primeira exige. A segunda convida. Quando uma empresa foca apenas em metas, corre o risco de premiar a obediência em detrimento da criatividade. E numa economia onde inovar é questão de sobrevivência, isso é uma armadilha silenciosa. Um talento calado hoje pode ser um negócio perdido amanhã.
É claro que metas são importantes. O problema está em torná-las o único critério de valor. Trabalhar sob metas pode ser inspirador quando elas estão conectadas a um significado maior. Mas quando viram muros que impedem novas ideias de nascer, passam de estratégia a sabotagem. E o que era para ser impulso vira freio.
Cada vez que uma empresa silencia uma boa ideia porque ela “não ajuda a bater a meta do mês”, ela se distancia do futuro. Ideias não são interrupções no caminho do lucro. São pontes para ele. São elas que abrem novas rotas, descobrem atalhos e desafiam o previsível. E nenhuma empresa cresce de verdade sem desafiar o que é previsível.
Então, a pergunta que fica é simples e urgente: sua empresa está premiando a obediência… ou libertando o talento?
* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB
EM CAMPINA GRANDE - 21/05/2025