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É raro que crianças tomem gosto por geometria e álgebra semelhante ao que sentem por jogos, astronomia e histórias sobre heróis ou dinossauros. Não culpo inteiramente os professores e seus métodos de ensino, que têm sua parcela de responsabilidade. Há casos em que as melhores técnicas pedagógicas seriam incapazes de produzir resultados satisfatórios. Estes são em número maior do que se imagina.
Falamos de conhecimentos com grau de abstração elevado que necessitam de um tipo peculiar de raciocínio, de uma disposição mental que a maioria das pessoas não desenvolveu ou não possui. Intrinsecamente não há nenhum mal nisso. Ninguém é obrigado a gostar de matemática, literatura, filosofia, história ou física.
Faço parte desse conjunto de pessoas com dificuldades naturais para o entendimento da matemática. Durante parte da minha vida escolar achei-a tediosa e incompreensível. Porém, quando estive realmente dedicado ao seu estudo obtive notas altas nos exames. Ocorre que durante esse período nunca senti verdadeira paixão, nem dei lampejos de genialidade. Tudo acontecia mecanicamente. Precisava decorar alguns procedimentos mentais por um curto período e transcrevê-los para o papel. Tenho imensa curiosidade a respeito do funcionamento do universo e interesse latente pela lógica moderna. Por isso guardo pequeno desapontamento pela falta de habilidade matemática, por ter deixado escapar a oportunidade de desenvolvê-la.
Todos precisam adquirir o mínimo de conhecimentos matemáticos, independentemente de maiores afinidades com a área. A aritmética é indispensável para a vida prática, assim como noções elementares de geometria. O mesmo não é possível afirmar da álgebra – espero que ela não se sinta desprestigiada com tal declaração. É preciso salientar que o mesmo não se afirmaria no campo científico. Acredito que as crianças precisam experimentar a matemática para descobrir se sentirão amor pela coisa. Às vezes, a resposta positiva surge gradualmente e o ódio à matéria vai aos pouquinhos se transformando em paixão. Numa certa altura ficará claro se possuímos aptidões que, se confirmadas, precisam ser estimuladas ao máximo.
Naturalmente é difícil precisar a capacidade intelectual de alguém, sobretudo quando se trata de uma pessoa jovem. Crianças com genialidade precoce como a do matemático Alan Turing são valiosas exceções. Especialistas dizem que o pendor para a matemática tende a aparecer até os 14 anos, mas desvios à regra não deixam de existir. Os professores ficam obrigados a não descartar ninguém – esse deveria ser um imperativo categórico aplicado às demais disciplinas acadêmicas.
Importantes cientistas de nossa época foram matemáticos medíocres. Outros só demonstraram proficiência tardiamente ou tiveram problemas na escola. Albert Einstein já foi reprovado na seleção para a Escola Politécnica de Zurique e expulso do Ginásio Luitpold – fato atribuído à insatisfação com o autoritarismo pedagógico da instituição. Acabou desacreditado por professores que o rotularam como “mentalmente lento, não sociável e sempre perdido em seus sonhos”. Diziam que o jovem “não chegaria a lugar nenhum”. Thomas Edison passou por algo parecido. O inventor da lâmpada elétrica e do gramofone já foi considerado um “asno” por seus professores. O mesmo aconteceu com outras figuras eminentes. A genialidade de Darwin só seria reconhecida tempos depois. Pais e mestres acreditavam que sua capacidade intelectual estava bem abaixo da média.
Histórias assim povoam o universo da música. Ludwig van Beethoven, um dos mais extraordinários compositores de todos os tempos, sofreu com prognósticos desalentadores a respeito de sua capacidade criativa. Segundo os biógrafos, ele não era um instrumentista virtuoso e tinha até certo desalinho com o violino, em parte consequência do interesse em tocar suas próprias músicas. Seus professores diziam que o rapaz seria um compositor fracassado – o que a 5ª e a 9ª sinfonia, obras que estão entre as mais executadas, conhecidas e importantes da música erudita ocidental, viriam mais tarde contradizer. Kirk Hammett, guitarrista da banda Metallica, grande nome do instrumento, chegou a ser desacreditado durante suas primeiras aulas com Joe Satriani, que o aconselhou a abandonar a guitarra. Hammett sofria com problemas de coordenação motora, que desapareceram depois de 12 horas de treinamento diário.
A música, ao contrário da matemática, exerce maior fascínio sobre as crianças, mas também parece depender de algum tipo de habilidade especial ou dom – esta palavra soa mal aos ouvidos dos sociólogos. Não significa, entretanto, que seja necessário tocar um instrumento e adquirir conhecimentos acadêmicos relativos ao assunto para se dar bem nessa área. Grandes compositores da música popular eram leigos em teoria musical e sequer sabiam tocar. Lamartine Babo, por exemplo, desconhecia teoria e técnica musical. Limitações que não impediram que criasse canções formidáveis que hoje fazem parte do imaginário nacional.
Encerro aqui com o sentimento de que essa discussão merece outro artigo.
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