João Pessoa, 24 de maio de 2025 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Quem já viveu um São João em Campina Grande sabe: a festa é grande, mas a correria dos bastidores é ainda maior. Lembrei disso ao ouvir a história de seu André, dono de uma pequena fábrica de camisas juninas. Na véspera da festa, ele recebeu uma encomenda grande, daquelas que chegam sem aviso nem planejamento. Sem tempo para fazer contas ou montar planilhas, seu André olhou a equipe, puxou da memória o estoque e decidiu: “Pode mandar!”. Dois dias depois, a entrega estava feita, no improviso, mas dentro do prazo. Sorte? Intuição? Ou será o cérebro do empreendedor fazendo o que sabe melhor?
Situações como essa se repetem todos os dias nos pequenos negócios da Paraíba. E hoje, a ciência começa a entender melhor como funciona a mente de quem empreende. Estudos recentes mostram algo curioso: em muitos aspectos, o cérebro do empreendedor opera de maneira diferente. Ele reage ao risco e à incerteza não como ameaça, mas como desafio criativo. Enquanto muita gente trava diante do imprevisto, o empreendedor se move. Às vezes sem ter todas as respostas, mas movido pela ação.
Pesquisadores como Peter Bryant e Elena Ortiz Terán têm encontrado evidências de que os fundadores de negócios ativam áreas cerebrais ligadas à ação rápida e à baixa inibição diante de problemas. Em outras palavras: o empreendedor é aquele que, diante do caos, decide agir. Não se trata de imprudência. É coragem treinada. É instinto lapidado pela prática, pela repetição de desafios diários, pelas incontáveis vezes em que improvisar foi a única opção para seguir em frente.
Outro ponto interessante é a importância da intuição no processo de decisão. Mas não é agir sem pensar, como muitos imaginam. Trata-se de uma intuição construída com base na experiência. A academia chama isso de “aprendizagem tácita”. No linguajar popular, é simples: só quem vive a realidade entende o que precisa ser feito. É aquela inteligência prática que nasce do contato direto com o cliente, da observação do mercado, da tentativa e erro que não aparece nos livros, mas molda a sabedoria empreendedora.
Penso em Dona Fátima, que vende bolos no Alto do Mateus há mais de vinte anos. Ela nunca frequentou um curso de marketing, mas sabe, com precisão, qual sabor vende mais em cada época do mês, onde montar a barraca para atrair mais clientes e quando é hora de ajustar os preços. Não foi em sala de aula que ela aprendeu isso. Foi na prática, na escuta silenciosa do mercado, no feeling desenvolvido dia após dia.
Mas é importante reconhecer que esse tipo de mente paga um preço. O cérebro que corre riscos também carrega o peso da pressão constante, do excesso de estímulos, do estresse de ter que dar conta de tudo. É como um motor potente: se não houver cuidado, pode fundir antes da hora. Descansar, para o empreendedor, também é uma estratégia. A pausa é necessária para manter a mente afiada.
Mais do que um traço biológico, a mentalidade empreendedora é, acima de tudo, uma escolha de atitude. Ela não está restrita a quem tem CNPJ ou escritório montado. Ela aparece em quem toma iniciativa, em quem resolve problemas mesmo sem um roteiro pronto, em quem confia no próprio faro para agir. Muitas vezes, o que falta para avançar não é mais um curso ou certificado. É apenas confiar um pouco mais na inteligência prática que a vida já nos ensinou.
O cérebro empreendedor é, antes de tudo, um cérebro em movimento. E, como professor, vejo que o futuro pertencerá a quem souber manter esse movimento vivo, equilibrando coragem e sabedoria na hora de decidir.
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EM CAMPINA GRANDE - 21/05/2025