João Pessoa, 09 de outubro de 2025 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Na Paraíba, a política tem sobrenome. E é sob o peso desses sobrenomes que se costuram as alianças, se decidem candidaturas e se distribuem apoios. O nepotismo eleitoral — esse velho hábito de transformar o poder público em herança familiar — continua a definir, com sutileza e persistência, o rumo das eleições estaduais.
O eleitor percebe o movimento, mas o sistema o naturalizou. Pais, filhos, sobrinhos e afilhados se revezam entre gabinetes, prefeituras e secretarias. A sucessão de 2026, que se desenha entre João Azevêdo e Cícero Lucena, não escapa dessa lógica. Por trás dos discursos sobre continuidade ou renovação, o que se move é uma rede de lealdades e conveniências que ultrapassa partidos e ideologias.
O governador João Azevêdo, hoje favorito a uma das vagas no Senado, depende de uma base que mistura fidelidade política e vínculos familiares. Muitos dos seus principais apoiadores no interior herdaram cargos ou capitais eleitorais de parentes. É essa teia de relações que mantém viva a capilaridade do Palácio da Redenção — e que, ao mesmo tempo, dificulta qualquer tentativa de renovação real.
Cícero Lucena, por sua vez, reeleito com folga na capital, é herdeiro de uma linhagem política que atravessa décadas. Sua trajetória, marcada por experiência administrativa e moderação, o coloca como pivô de alianças que envolvem nomes conhecidos, famílias tradicionais e lideranças que orbitam entre o PSB, o MDB e o PT. No entanto, mesmo um político experiente como ele sabe que, em tempos de desconfiança generalizada, a política familiar pode ser tanto um ativo quanto um fardo.
O nepotismo eleitoral cria estabilidade aparente, mas cobra um preço alto. As alianças se formam mais pela conveniência de preservar espaços do que pela afinidade de projetos. É uma política que tende a perpetuar a mesmice: o discurso da mudança é repetido, mas os protagonistas são sempre os mesmos. Quando o eleitor se depara com as urnas, muitas vezes não escolhe entre ideias, e sim entre dinastias.
Ainda assim, esse sistema não é imutável. A força crescente das redes sociais, o cansaço com a política de herdeiros e a busca por novas lideranças locais começam a alterar o equilíbrio. Na Paraíba, onde a cultura política é profundamente personalista, qualquer ruptura exige coragem — e cálculo.
Entre João Azevêdo e Cícero Lucena, a política segue um jogo de xadrez em que cada movimento é medido à sombra dos sobrenomes que moldaram o Estado. As alianças que se formarão até 2026 não dependerão apenas de partidos ou programas, mas de um intricado mosaico de famílias, heranças e reciprocidades.
No fim, o desafio não é apenas vencer uma eleição, mas vencer o ciclo hereditário que faz da política um negócio de família. A Paraíba precisa de líderes que compreendam que a verdadeira sucessão é a das ideias — e não a dos parentes.
* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB
VEREADOR QUESTIONA - 09/10/2025