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Francisco Leite Duarte é advogado tributarista, auditor-fiscal da Receita Federal (aposentado), professor de Direito Tributário e Administrativo na Universidade Estadual da Paraíba, doutor em direitos humanos e desenvolvimento. Na Literatura, publicou os romances “A vovó é louca” e “O Pequeno Davi”, uma coletânea de contos chamada “Crimes de agosto”, um livro de memórias (“Os longos olhos da espera”), e dois livros de crônicas.

Meu presente de Natal

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publicado em 26/12/2025 ás 08h27

 

Um ano se passara, desde nossa chegada em Sousa. Já havíamos desasnado um pouco, mas a zona rural é daquelas experiências que fica impregnada na vida da gente para sempre, amém. Imaginem por 18 anos…

Então, quando a matutice mais grossa nos deixou e a afoiteza da novidade sousense já emergia em alguns dos nossos comportamentos, aliado ao fato de já termos conhecido alguns amigos no Colégio Polivalente II, fui apresentado ao Papai Noel.

Como as maçãs e os presuntos, Papai Noel não existia no Sítio Saco Sinhazinha. Papai Noel me chegou cheio de novidades e responsabilidades. Como membro da Juventude Franciscana (JUFRA), seguíamos, a turma, para a catequese de adultos. Naquela vez, visitaríamos um dos bairros mais carentes da cidade, Jardim Brasília, bem afastado do centro da cidade.

Íamos a pé. Como eu morava vizinho ao cabaré de Célia, defronte da Estação ferroviária, seguia pela linha férrea, quase sempre acompanhado. Na época, era a minha farra, uma algazarra que fazia muito bem aos sonhos e aos meus percalços que ainda estavam na adolescência tardia. Eu, Josa, Isnaldo, Formiga, Wilson de Zé Maria, César Campos, Sonia e Lucinha também. Naquele dia, Cosme e Damião não puderam ir. Um desfalque enorme.

A radiola da capela embora quisesse alegria, soluçava sem saber:

“Como é que Papai Noel

Não se esquece de ninguém

Seja rico ou seja pobre

O velhinho sempre vem…”

Eu olhava aquela gente simples. E me via neles. Elevava o olhar para o céu e abria a bocarra sonhadora:

“Botei meu sapatinho

Na janela do quintal

Papai Noel deixou

Um presente de Natal”

Naquela noite, a pregação foi de Júlio César. Ele sempre fora eloquente e a idade o conduzia à subversão de um discurso forte e verdadeiro, mas prolixo. Formiga resumiu a mensagem em três ou quatro frases. Eu, ainda um verde fruto parido na Serra do Desterro…

Quando chegou a minha vez, papai Noel foi mais pragmático do que Formiga: a chuva veio embolada em um vento forte e anarquista; a radiola, como se tivesse engolido areia, engasgava com constância, a plateia se retirou e meu discurso ficou para outro dia, quando eu estivesse preparado.

@professorchicoleite

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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