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entrevista ao portal maispb

Lenine lança ‘Eita!’ álbum de estúdio dez anos depois, uma celebração ao Nordeste

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publicado em 13/12/2025 ás 12h04
Lenine ao lado do novo álbum, 'Eita' - Foto: Malu Freire

Kubitschek Pinheiro

Fotos – Malu Freire

Eita! Lenine é um danado, espirituoso e cheio de sacadas. O artista  retorna ao estúdio e lança “EITA´dez anos depois – um trabalho reúne disco e média-metragem, disponíveis e estourados nos aplicativos de música e no YouTube.

O som reafirma uma ligação forte do artista com o Nordeste, sua terra, traz em cada canção a síntese de sua trajetória experimental.

EITA” já nasce clássico, como um projeto moderno. O artista assume todas as etapas do processo criativo.

São 11 faixas inéditas que cruzam fonteiras e palcos, cinema, rios, com arranjos de Carlos Malta, Henrique Albino e Martin Fondse. A direção artística é dele e a produção musical é de Bruno Giorgi.

A expressão popular que dá nome ao álbum orienta o percurso afetivo da obra. Lenine dedica o trabalho a Dominguinhos, Hermeto Pascoal, Letieres Leite e Naná Vasconcelos.

O Nordeste vem como raiz, barro do chão e o criador está em todas as faixas A formação do disco reúne jovens compositores, como Carlos Posada e Gabriel Ventura, e mestres como Arnaldo Antunes, Dudu Falcão, João Cavalcanti, (seu filho mais velho) Lula Queiroga e Siba.

O álbum também reverencia o Terreiro Xambá por meio da família Bongar, que traz toques, loas e danças. As participações de Maria Bethânia é uma maravilha, Maria Gadú, Siba e Gabriel Ventura abre diálogos mundiais.

Capa do álbum

Lenine – Foto: Malu Freire

O MaisPB conversou com Lenine e traz o resultado, o trabalho, a novidade, a literatura musical

MaisPB – Vamos começar pela capa – que beleza essa arte, trabalho de Luíza Morgado, com foto de Flora Pimentel…

Lenine – A capa nasceu antes mesmo de eu conhecer o trabalho da Luiza. Eu já tinha na cabeça a imagem de uma xilogravura, aquele processo de talhar a madeira para depois imprimir. Quando vi a reedição do Paêbirú, aquele disco antológico do Lula Côrtes e do Zé Ramalho, fiquei encantado com o trabalho que ela fez em linogravura. Ali entendi na hora: era ela quem tinha que realizar a capa do EITA. A foto da Flora Pimentel completou esse universo visual que eu já intuía desde o começo.

MaisPB –  Abre o disco com “Confia em mim”, que lembra “Paciência”, de 1999… Estou certo?

Lenine –“Confia em Mim” lembra, sim, um pedaço do meu cancioneiro, esse território das baladas onde eu sempre acabo transitando. Cada disco meu carrega uma canção desse tipo, como “O Silêncio das Estrelas”, “A Medida da Paixão”, “É o Que Me Interessa”, “Simples Assim”. E, na maioria das vezes, essas baladas eu faço em parceria com o Dudu Falcão. Nós dois, de alguma forma, somos herdeiros do bolero, e isso acaba aparecendo naturalmente nesse tipo de composição.

MaisPB – Eita! Foi uma boa sacada e lá vem Lenine falando coisas da vida da gente, das pancadas… E, em certo momento, você dialoga com a canção. Vamos falar sobre isso? 

Lenine – EITA é a canção que dá título ao projeto inteiro. É uma interjeição daquelas que carregam muitos sentidos e que, na música, acaba falando do que estamos vivendo, do que já vivemos e do que continuamos a viver. Essa herança recente que caiu no colo de todo mundo – ódio, violência, a normalização disso quase como uma moeda corrente – é algo muito esquisito. O EITA nasce dessa perplexidade, desse espanto diante de tanta violência e dissimulação. É um jeito de nomear esse estado das coisas.

MaisPB –  A faixa “Meu Xamêgo” é uma declaração de amor?

Lenine – “Meu Xamêgo” é, sim, uma canção de amor. É mais uma que eu dedico à Anna Barroso, minha companheira. Em cada disco que faço, sempre tem uma canção para ela.

MaisPB – Essa música com a participação da Maria Gadú, “O Rumo do Fogo”, é uma performance muito interessante! Vamos falar sobre?

Lenine – “O Rumo do Fogo” é uma parceria com Lula Queiroga, meu parceiro dos mais antigos e permanentes. A canção fala de algo fundamental, que é a questão dos povos originários e desse débito que a gente carrega. Eu já trato do ambientalismo há muito tempo e, quando entro nesse território dos povos originários, encontro naturalmente a Gadú, que é uma militante dessa causa. Foi tudo quase simultâneo: a canção surgir, lembrar imediatamente da Gadú e dedicar a obra a Kopenawa e Krenak.

MaisPB – Por que tanto tempo sem gravar um disco novo?

Lenine – Essa demora tem vários fatores. Na verdade, não são exatamente dez anos sem lançar algo novo. Em 2018, fiz um projeto gravado ao vivo que, embora não fosse de estúdio, trazia músicas inéditas. Depois veio a pandemia, que atravessou tudo, e veio também o nascimento prematuro do Otto, meu quinto neto. A família inteira precisou se mobilizar. Esses acontecimentos todos foram adiando, pouco a pouco, o lançamento do EITA. Foi um tempo necessário.

MaisPB – Que sacada essa canção “Foto de Família”! Parece uma oração, sinais antigos…. E convidou a pessoa certa para cantar, Maria Bethânia, que já gravou uma canção sua. Fala pra gente desse encontro fantástico?

Lenine – “Foto de Família” é uma parceria minha com o meu filho mais velho, João Cavalcanti. A letra, que é dele, nasceu a partir de uma foto real da nossa família, um clássico lá de casa: minha mãe e meu pai no centro, cercados por todos os netos. Todo mundo tem uma cópia dessa foto. Foi esse afeto que guiou a canção. E, quando ela ficou pronta, me pareceu imediato chamar a maior intérprete que já vi cantar e interpretar, Maria Bethânia. Assim como todos que participam do disco, eu tenho algum tipo de intimidade com ela. Mostrei a música, ela aceitou participar, e gravamos juntos no estúdio, ao mesmo tempo: ela cantando para mim e eu tocando para ela.

MaisPB – “Boi Xambá” é cara do Recife, né?

Lenine – “Boi Xambá” é a cara do Recife porque é boi, é brinquedo de carnaval, mas também é a cara de Pernambuco porque é Bongar, é o terreiro de Xambá, é tradição, é permanência. E essa canção eu fiz a pedido de um querido, Guitinho, do Xambá, um dos fundadores do Bongar, que nos deixou. Poder gravá-la no disco e dedicar a ele foi uma forma de honrar toda essa ancestralidade.

MaisPB – Já “Malassombro” lembra os blues antigos dos cancioneiros americanos…

Lenine – “Malassombro” não é exatamente uma referência aos blues antigos. A origem dela está mesmo nos cantadores repentistas do Nordeste. Eu compus do modo como eles fazem: primeiro vem o mote, e o mote era justamente malassombro. Liguei para o Siba e propus que ele criasse os versos dele, já imaginando nosso reencontro depois de tanto tempo sem nos vermos. Ele fez a parte dele, eu fiz os meus versos, sempre orbitando esse tema do malassombro.

MaisPB – Vai sair pelo Brasil em turnê com EITA?

Lenine – Sim. O nosso desejo é, depois do Carnaval, aprontar o espetáculo homônimo ao projeto, que inclui o álbum e o filme em média-metragem disponível no YouTube. Portanto, EITA vai sair pela estrada, vai circular pelo Brasil, vai ganhar o mundo. Aí eu disse: EITA

MaisPB