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Palmarí H. de Lucena é cronista, escritor e ativista social. Atuou em causas humanitárias no Brasil e no exterior e publica regularmente sobre cultura e memória.

Quando o Bolero Parou no Ar

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publicado em 01/11/2025 ás 20h55

Quando o Bolero Parou no Ar

Ele não partiu em silêncio.
Levou consigo o compasso lento de um bolero,
aquelas notas que dançam entre a saudade e o sonho.
Dizia que o bolero era a alma conversando consigo mesma,
num idioma que só os corações feridos compreendem.

Quando o som de Los Panchos enchia a sala,
ele sorria —
um sorriso antigo, de quem já amou demais
e ainda acreditava que o amor é a única eternidade possível.
Falava de Manzanero como quem cita um profeta,
recitava “Contigo Aprendí” olhando o vazio,
como se lá, no invisível, alguém ainda o esperasse.

Agora, quando a noite cai e o rádio insiste em tocar
aquele acorde suspenso de “Sabor a Mí”,
sinto sua presença ao lado da taça meio cheia,
seu olhar viajando por lembranças que só o bolero alcança.

Seu Neivinha Era um homem de gestos lentos,
de silêncios cheios de sentido,
de amores que não se explicam — apenas se recordam.
E talvez por isso o bolero fosse sua pátria sonora:
um território onde a dor e a beleza
se abraçam para não se perderem.

Hoje, ao ouvi-lo, percebo que não morreu —
apenas virou melodia,
soprando leve entre violões e trompetes,
dançando devagar,
como quem eterniza no ar
o último passo de um amor.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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