João Pessoa, 07 de setembro de 2025 | --ºC / --ºC Dólar - Euro

ÚltimaHora
Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Verissimo está morto

Comentários: 0
publicado em 07/09/2025 ás 07h00
atualizado em 07/09/2025 ás 09h24

Por que Luís Fernando Verissimo estava a morrer, se ele nunca escreveu lamentações? Por que Verissimo morreu ou precisava morrer, se sua obra se espalhou pela TV, cinema e teatro após ganhar o Brasil nas páginas dos jornais e livros? Porque sim, a morte rompe com a vida – sobrevivemos para isso,  a representação da vida que estanca. Até o arcipreste sabe disso.

Filho de Érico Verissimo, (um dos mais lidos do país), Veríssimo das sacadas caseiras, pungentes, de punhal luminoso, precisava morrer. Ficou na tela do computador a sua morte necessária.

Veríssimo precisava morrer pela desagradável série de complicações do maldito Mal de Parkinson, o acidente vascular, que veio para vasculhar sua eternidade. Precisava morrer, sim. Seu nome não, seu nome não morre.

Precisava morrer porque não havia queixas, inclusive de que as dores, talvez, os desenganos o impedissem de gozar restos de experiência da morte. Ele dizia  que a morte é uma sacanagem, mas a morte não lhe deu ouvidos, ela é superior a literatura, ao cinema, escambau.

O poeta inglês John Donne, disse que “nenhum homem é uma ilha” e outras coisas certas, quase sempre melancólicas. Assim como somos trópicos, alegres e tristes e nunca haveremos de nos acostumar com as perdas. Eu, pelo menos, demorei a acreditar que Walter Galvão morreu, justo ele, que tentou me convencer das perdas.

Séculos depois, Hemingway usa em prefácio um trecho da 17ª Lamentação, de John Donne, algo assim: “não perguntes por quem dobram os sinos; eles dobram por ti”. Com essa indicação, queria Jonne Donne dizer que partilhava da Humanidade, mas a humanidade não é toda burra, é viciada, ignorante e sufocante.

É que quando morremos e morremos todos os dias, desde o velho operário da canção que morre atrapalhando o trafego, outros subindo montanhas, tirando selfies em penhascos – quanta burrice.

Se não me engano, Veríssimo não vivia nas redes sociais. Verissimo não é mais notícia, ficou na memória da semana passada, do mês que vem, que ainda chamamos de coletivo, talvez, talvez. Muitas vezes tomado por impulso, Verissimo era, antes de prosador, um bom escritor; e se fosse poeta, não seria uma ilha, talvez uma península.

Veríssimo, verossímil, é vero, todos nós seres ou não seres chegamos e sumimos. O interesse de Verissimo pela vida como ela é, passou longe de Nelson Rodrigues, mas Verissimo levou a estabelecer uma cidadela com as crônicas mais cotidianas impossíveis, uma ligação dele com outras delicias.

Mas ele ajudou a construir o Brasil que ficou para trás, o símile o facto de seus temas, os pequenos sonhos, mesas e cadeiras e toda a sorte de estranhos que somos, numa faixa perdida de gaza, na linha podre do Equador.

Veríssimo precisava morrer para eu estar aqui escrevendo sobre sua morte, um texto besta, devido a uma cena micênica, uma gargalhada valada nesse comboio suburbano, senão, um murro na mesa

Para completar a banalidade de meu texto, a temida morte é só uma cena, do pão que o diabo amassou e ao papagaio premiado de Drummond, sem travessias, ela desempenha seu papel e mata todos nós.

É isso, Verissimo está morto.

Kaptetadas

1 – Pisa onde eu piso que tu não escorrega.

2 -Tem gente que não fala no viva-voz do celular, faz solilóquio

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

[ufc-fb-comments]