João Pessoa, 28 de junho de 2025 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Era o fechamento do mês em uma empresa de logística do interior da Paraíba. O gerente regional chegou pontual à reunião com a pauta em mãos. Mas antes mesmo de abrir qualquer ponto estratégico, lançou a pergunta que todos já esperavam: “Cadê o relatório de horas extras?” O clima no ambiente mudou. Um dos supervisores cochichou: “Lá vem ele de novo com esse negócio de custo…” Durante toda a reunião, ninguém falou sobre clientes insatisfeitos, nem sobre os atrasos nas entregas. O foco era claro, o que o chefe cobrava era o que importava. E ele só cobrava números.
Essa cena, comum em tantas organizações públicas e privadas, revela algo profundo sobre a cultura organizacional: ela não nasce do que o líder diz, mas daquilo que ele acompanha, cobra e valoriza no dia a dia. A cultura se forma menos pelo discurso e mais pelo foco. E o foco do líder funciona como um farol silencioso, iluminando o que deve ser visto e apagando o que não interessa.
O pesquisador Edgar Schein, referência mundial em cultura organizacional, já afirmava: a forma como os líderes medem resultados, reagem a falhas e tomam decisões é um dos principais mecanismos de formação da cultura. Isso quer dizer que, mesmo sem querer, o líder está ensinando o tempo todo. O problema é que nem sempre ele percebe o que está ensinando.
Na Paraíba, já presenciei empresas onde a liderança falava sobre criatividade, mas nunca perguntava sobre novas ideias. Dizia incentivar o aprendizado com os erros, mas respondia com ironias ou punições veladas quando algo não dava certo. Em outros casos, a chefia defendia o “espírito de equipe”, mas recompensava apenas os resultados individuais. A incoerência entre o discurso e a prática gera confusão, medo e conformismo.
Cultura organizacional não se escreve na parede se transmite no gesto. Quando um líder interrompe um colaborador que tenta sugerir algo novo, ele comunica que questionar não é bem-vindo. Quando foca obsessivamente em números e ignora o clima da equipe, ele ensina que sentir não importa. Quando reage mal a uma crítica construtiva, ele ensina que é mais seguro calar do que contribuir.
Quer transformar a cultura da sua organização? Mude suas perguntas. O que você cobra nas reuniões? O que você elogia espontaneamente? O que você nunca comenta, mesmo sabendo que está errado? O silêncio do líder é um sinal e muitas vezes, mais forte do que suas palavras.
Cada comportamento de liderança é um microensinamento. Quando um gestor insiste em falar de propósito, mas age com pressa e indiferença, ele esvazia o discurso. Quando diz que valoriza pessoas, mas só olha para planilhas, ele deixa claro que resultados importam mais do que relações. E quando faz promessas que não cumpre, contribui para uma cultura de descrença.
É tempo de repensar como estamos educando nossas equipes não apenas com treinamentos e reuniões, mas com aquilo que fazemos enquanto lideramos. Cultura não é o que está no papel institucional, é o que está no olhar dos colaboradores quando o gestor entra na sala. E esse olhar diz muito.
Na administração pública e nas pequenas empresas paraibanas, isso é ainda mais urgente. Muitos líderes foram formados tecnicamente, mas nunca refletiram sobre o impacto simbólico de suas atitudes. Liderança não é sobre saber mais, mas sobre ensinar melhor e isso se faz pelo exemplo cotidiano.
O que você presta atenção define no que sua equipe vai prestar atenção. A pergunta que fecha este texto é simples, mas poderosa: sua equipe está aprendendo o que você realmente quer ensinar ou apenas o que você repete sem perceber?
* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB
centenário - 27/06/2025