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Paulo Galvão Júnior é economista, escritor, palestrante e professor de Economia e de Economia Brasileira no Uniesp

  Reflexões críticas sobre o emergente Brasil

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publicado em 09/01/2022 às 08h54

O Brasil foi o país que mais cresceu economicamente de 1930 até 1980 e nestes 50 anos passou de um país pobre e agrícola para um país em desenvolvimento e industrializado, assim se tornou a oitava maior economia do mundo em 1970. O presidente Getúlio Vargas iniciou a industrialização a partir de 1930 e adotou uma nova moeda, o cruzeiro, em 1942, em plena Segunda Guerra Mundial (1939-1945). O Brasil era composto de 41,1 milhões de habitantes em 1930 passando para 119,0 milhões em 1980, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A partir de 1930 com a industrialização por substituição de importações, o Brasil acelerou o seu crescimento econômico. Mas, de 1980 a 2020, o Brasil vem crescendo economicamente muito pouco. Nos últimos 40 anos entrou em recessão econômica nos anos de 1981 (-4,3%), 1983 (-2,9%), 1988 (-1,0%), 1990 (-4,3%), 1992 (-0,5%), 2009 (-0,1%), 2015 (-3,5%), 2016 (-3,3%) e 2020 (-4,1%). A grande recessão econômica começou no segundo trimestre de 2014 e terminou no quarto trimestre de 2016. De 2017 a 2019, a economia brasileira voltou a crescer, mas lentamente, em média de 1,5% ao ano (IBGE). No ano de 2020 uma forte recessão econômica, devido a pandemia da COVID-19 e o Brasil já contava com uma população de 212,6 milhões de habitantes (IBGE) e é a 6ª nação mais populosa do planeta.

O emergente Brasil é um dos países de mais alta concentração de renda do mundo, tem baixa produtividade do trabalhador, baixa poupança doméstica e “os salários são, em geral, muito baixos na economia brasileira” (BRESSER-PEREIRA, 1998, p. 87). Conforme o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), “O salário mínimo necessário é de R$ 5.800,98, em dezembro de 2021, ou seja, 5,273 vezes superior ao salário mínimo de R$ 1.100,00 em 2021”. O novo salário mínimo de R$ 1.212,00 não é suficiente para pagar as despesas mensais como a cesta básica mais a energia elétrica, o botijão de gás, a gasolina, os remédios, entre outros produtos e serviços.

O Brasil é o sétimo país mais desigual do mundo, atrás de seis países africanos: África do Sul, Namíbia, Zâmbia, República Centro-Africana, Lesoto e Moçambique. Além disso, a concentração de renda é a segunda maior do planeta, atrás apenas do Catar. No Brasil, 1% da população concentra cerca de 28,3% da riqueza do país, conforme o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Desde o início da pandemia da COVID-19 a renda dos brasileiros mais pobres caiu 21,5% (NERI, 2021). O 1% mais rico tem renda mensal maior, em média, quase 35 vezes que os 50% mais pobres (IBGE, 2021). Apenas 0,3% da população brasileira recebe R$ 25 mil ou mais por mês (IBGE, 2021). Os 10% mais ricos concentram 59% da renda total, em outras palavras, os ricos ficaram mais ricos e os pobres cada vez mais pobres.

O Brasil tem alto desenvolvimento humano e é o 84° colocado no ranking mundial do índice de desenvolvimento humano (IDH), com IDH de 0,791, conforme os dados de 2019 do Relatório do Desenvolvimento Humano 2020 do PNUD. A grave situação socioeconômica é visível quando encontramos o Brasil com a terceira maior inflação do Grupo dos Vinte (G-20), atrás da Argentina (52,1%) e da Turquia (19,89%), com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado nos últimos 12 meses de 10,74% em novembro de 2021 (IBGE). Com inflação alta as famílias perdem poder de compra e penalizando mais as famílias de renda muito baixa.

A situação socioeconômica é realmente preocupante no País: 100 milhões de pessoas não têm acesso à coleta de esgoto (TRATA BRASIL), 27,7 milhões de pessoas pobres (IBGE), 12,9 milhões de pessoas desempregadas (IBGE), 63,7 milhões de pessoas inadimplentes (SERASA), 38,2 milhões de trabalhadores informais (IBGE), 46 milhões de pessoas sem renda de trabalho (IPEA), 20 milhões de pessoas famintas (IBGE) e 11 milhões de pessoas analfabetas (IBGE).

É importante pensar que a carga tributária bruta terminará em 33% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2021, conforme a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Segundo a OCDE, no Brasil, a tributação mais pesada é no consumo, com 43% do total; em segundo lugar, 27,5% em tributação sobre folha de pagamento; 22,5% em tributação sobre renda; 4,5% em tributação sobre patrimônio e 2,5% em tributação sobre comércio exterior. É importante melhorar o ambiente de negócios e menos tributos trazem significativas melhorias a curto prazo.

O Banco Mundial pesquisou 188 países e apontou que o Brasil é uma das três economias mais fechadas do mundo, atrás apenas da Nigéria e do Sudão, com grau de abertura de 22% em 2017. Segundo o último relatório do Banco Mundial, a posição do Brasil no ranking mundial da Doing Business 2020, entre 190 países, era de 124° colocado, com 59,1 pontos e entre os onze indicadores quantitativos, a pior colocação foi no pagamento de impostos (ou seja, impostos e contribuições obrigatórias que as empresas devem pagar ao longo do ano, além do tempo e processos envolvidos), na 190ª colocação, com 1.051 horas gastas por ano para preparar, declarar e pagar tributos. Infelizmente, ainda temos 92 tributos (13 impostos, 34 taxas e 45 contribuições) vigentes nas cinco regiões do País.

No prefácio da terceira edição do livro intitulado Economia Brasileira: uma introdução crítica (1998, p. 13), o economista Luiz Carlos Bresser-Pereira ressaltou que, “O Período Industrial pode ser dividido em duas fases: a fase da Revolução Industrial Brasileira, entre 1930 e 1960, e a de Subdesenvolvimento Industrializado, entre 1960 e 1980”. Destacamos que ocorreu o “milagre econômico” no Brasil, onde a taxa de crescimento do PIB acelerou de 9,8% em 1968 para 14,0% em 1973 (IBGE) e o PIB brasileiro cresceu em média, 11,1% ao ano, entre 1968 e 1973 (IBGE).

Conforme o professor Bresser-Pereira (1998, p. 14), “A partir do segundo choque de petróleo em 1979 e do violento aumento das taxas de juros internacionais ocorrido nesse mesmo ano, tem início a Grande Crise da economia brasileira – a crise dos anos 80”. O Brasil teve sua primeira década perdida na década dos anos 80, quando ocorreu o baixo crescimento econômico, a hiperinflação, a elevada dívida externa e o elevado desemprego. O PIB brasileiro cresceu apenas 1,6% ao ano, em média, entre 1981 e 1990 (IBGE).

De 1986 a 1994 ocorreram sete planos econômicos para debelar a inflação, Plano Cruzado (1986), Plano Cruzado II (1986), Plano Bresser (1987), Plano Verão (1989), Plano Collor (1990), Plano Collor II (1991) e o Plano Real (1994). Em janeiro de 1999 o Brasil sofreu com a crise da abrupta desvalorização do real. “Entre 2003 e 2008, 34 milhões de pessoas encorparam as classes A, B e C no Brasil” (EXAME, 28.07.2010, p. 24). Em 2011, o Brasil ultrapassou o Reino Unido no PIB nominal e se tornado a sexta maior economia do mundo. Entre 2003 e até os dias atuais lidamos com as principais mazelas como a desigualdade social, a corrupção desenfreada (Mensalão, Petrolão e Operação Lava Jato), o baixo crescimento econômico, o aumento da informalidade, o crescimento da violência e o sucateamento de vários órgãos públicos municipais, estaduais e federais.

Quando o Brasil voltará a ter um projeto de nação? Quando o Brasil entrará no seleto grupo dos países desenvolvidos? Para Bresser-Pereira no livro Em Busca do Desenvolvimento Perdido: um projeto novo-desenvolvimentista para o Brasil (2018) é preciso discutir e, principalmente, definir um projeto de nação. Um projeto de desenvolvimento econômico claro e objetivo, que permita que políticos competentes, dotados de espírito republicano e solidários com seu povo, liderem o democrático Brasil de volta ao desenvolvimento perdido, combatendo a desindustrialização e a burocratização da economia brasileira.

É preciso entender a conexão econômica entre as economias avançadas e as economias emergentes em plena Indústria 4.0. É necessário superar a armadilha da renda média a longo prazo. É primordial crescer o consumo das famílias por bens e serviços. É fundamental mais investimentos privados na geração de empregos formais na indústria, porque é o motor do crescimento econômico. É vital aumentar as exportações de produtos industrializados para o resto do mundo, ressaltando que a balança comercial brasileira registrou um superávit comercial de US$ 61 bilhões em 2021 (MINISTÉRIO DA ECONOMIA).

De acordo com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) eram 11,3 milhões de microempreendedores individuais (MEIs) ativos em janeiro de 2021, cujo negócio tem um faturamento máximo de R$ 81 mil por ano. O empreendedorismo é indispensável para o crescimento econômico robusto do País, sendo importante para desenvolver tecnologias que consomem menos recursos naturais e emitem menos dióxido de carbono.

Para Bresser-Pereira é fundamental entender a lógica dos rumos das cinco principais taxas macroeconômicas como a taxa de juros, a taxa de inflação, a taxa de câmbio, a taxa de salários e a taxa de lucro. Para o crescimento econômico do Brasil, Bresser-Pereira defende uma intervenção moderada do Estado na economia e em defesa do interesse nacional e defende também uma taxa de câmbio mais competitiva, uma taxa de juros mais baixa, uma taxa de inflação muito baixa, uma taxa de salários crescendo com a produtividade e uma taxa de lucro satisfatória para os empresários.

Na Introdução do seu livro Globalização e Competição, Bresser-Pereira (2018, p. 3) diz que, “(…) as altas taxas de juros e as taxas de câmbio não competitivas, são inimigas do crescimento”. O crescimento econômico robusto e sustentável requer uma taxa de juros baixa e uma taxa de câmbio competitiva, para evitar novas ondas de recessão econômica. A taxa Selic atual é de 9,25% ao ano (BACEN) e um dólar americano já é equivalente a R$ 5,63, com as incertezas da nova variante do novo coronavírus, identificada na África do Sul e denominada de Ômicron pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Entre 2011 e 2020, ocorreu a pior década perdida no País, o crescimento anual do PIB foi em média de 0,3%. A dívida pública bruta terminará em 80% do PIB no ano de 2021 (MINISTÉRIO DA ECONOMIA). Recentemente, a agência Austin Rating divulgou que o Brasil tem a quarta maior taxa de desemprego do mundo, com 13,2% da população economicamente ativa (PEA), atrás apenas da Costa Rica (15,2% da PEA), Espanha (14,6% da PEA) e Grécia (13,8% da PEA).

Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Brasil é a décima segunda maior economia do planeta, com o PIB nominal de US$ 1,3 trilhão em 2020. Os EUA com o PIB de US$ 20,5 trilhões e a China com o PIB de US$ 14,8 trilhões são os dois países mais ricos do mundo. É preciso ressaltar que a China é o maior parceiro comercial do Brasil no planeta desde 2009 e os EUA são o segundo grande parceiro no comércio mundial, ressaltamos que em 2021, 31,28% das exportações brasileiras foram para a China, o país mais populoso do planeta, a fábrica do mundo e a maior frota mundial de carros elétricos e de trens-bala.

Analisando as perspectivas econômicas para o PIB brasileiro no ano de 2022, 17 instituições públicas e privadas, nacionais e internacionais, apontam as seguintes projeções: CEPAL (2,2%), Ministério da Economia (2,1%), Banco Mundial (1,7%), FMI (1,5%), OCDE (1,4%), CNI (1,2%), IPEA (1,1%), Goldman Sachs (0,8%), Bradesco (0,8%), Santander (0,7%), FGV (0,7%), Citibank (0,6%), Boletim Focus do BACEN (0,3%), BTG Pactual (0,0%), XP Investimentos (0,0%), Itaú (-0,5%) e Credit Suisse (-0,5%). Então, concluímos, pela média, a projeção de crescimento do PIB brasileiro em 0,8% para 2022.

É preciso ressaltar que o Brasil é um dos líderes mundiais do agronegócio global, sendo o primeiro lugar no ranking de produção de açúcar, café, suco de laranja e soja em grãos; é o segundo colocado no ranking de produção de carne de frango, carne bovina, óleo de soja e farelo de soja; além de terceiro lugar na produção de milho e algodão (RIZA ASSET, 2021). O agronegócio brasileiro teve um crescimento recorde no ano de 2020, mas no ano de 2021 enfrentou a pior crise hídrica no Brasil dos últimos 91 anos e que provocou tombo de 8% no setor no terceiro trimestre, sendo o grande responsável pelo retorno da recessão técnica no País, após a queda de 0,1% no terceiro trimestre de 2021 (IBGE, 2021).

O avanço da vacinação da COVID-19 nas cinco regiões do Brasil foi muito importante para o crescimento da indústria da construção civil em 2021. A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) aponta um crescimento do PIB setorial de 5% em 2021 e será o melhor desempenho do setor desde 2012. Podemos crescer muito mais neste setor, porque temos um déficit habitacional de 5,8 milhões de moradias em todo o País (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2019). No ano do bicentenário da independência brasileira temos vários problemas econômicos e sociais, entre eles, milhões de pessoas miseráveis sobrevivendo em milhões de moradias irregulares como palafitas e mocambos.

Em conclusão, o Brasil é um país muito rico em recursos naturais e com afinco continuamos em busca da superação do atraso econômico em que vivemos nos últimos 40 anos e na construção de um Brasil melhor e moderno. Temos um longo caminho a trilhar para o continental Brasil deixar de ser um país emergente e com grandes investimentos públicos e privados em educação de qualidade, em infraestrutura logística, em pesquisa e desenvolvimento (P&D) e em energias renováveis, assim, passará a ser um país desenvolvido. O ano de 2022 será inesquecível, o pleno emprego poderá ser retomado a partir de 2023 e as ondas de incertezas provocarão reflexões críticas sobre o emergente Brasil. Enfim, precisamos do crescimento econômico inclusivo e sustentável!

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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