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Professora Emérita da UFPB e membro da Academia Feminina de Letras e Artes da Paraíba (AFLAP]. E-mail: [email protected]

A Modernidade Líquida de Bauman

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publicado em 01/06/2020 às 14h48

Na solidão do confinamento a que fomos obrigados, fica-se a meditar sobre o domínio de um microrganismo sobre o mundo. Faz-nos ver que somos muito vulneráveis, dependentes e às vezes impotentes. Sentimo-nos dominados por algo que não vemos mas sabemos que existe, que nos domina, dita comportamentos e nos oprime. Isto é a visão holística verdadeira do fenômeno. Um vírus é componente diferente do todo mas ao mesmo tempo é essência e parte da totalidade organizada que atinge o globo terrestre.

Diante da crise nesta época pós-moderna, ao nosso pensamento afloram vários aspectos sobre os acontecimentos que nos cercam. Procurando justificativas para estas reflexões, nos reportamos a ótica do mundo atual na lente do sociólogo Zygmut Bauman (2001). No livro “Modernidade Líquida” tenta explicar a situação que vivemos, opondo-se ao que ele mesmo escrevera sobre modernidade sólida, onde tece críticas apontando aspectos negativos, mas reconhece atitudes construtivas como: rigidez disciplinar e institucional, seriedade e credibilidade, durabilidade e firmeza nas relações humanas e sociais.

Bauman chama o momento atual de modernidade líquida, considera as relações sociais, econômicas e de produção frágeis, fugazes e maleáveis como os líquidos, como também os laços entre pessoas e destas com as instituições. Toda criação do ser humano – a ciência, a técnica, a política, a educação, a saúde, as relações humanas, são submetidas a lógica do capitalismo do consumo. O ter é mais importante que o ser, inclusive os valores éticos e morais. Diz que as relações econômicas são sobrepostas às relações sociais e humanas. Pessoas passaram a ser valorizadas pelo que elas compram e não pelo que elas são. Os contatos pessoais foram intermediados e substituídos pelos aparelhos eletrônicos, a internet e a cibernética.

O emprego nessa lógica é questão do empreendimento do indivíduo e o seu sucesso ou não só depende dele, pois ele vende sua força de trabalho ao empreendedor que possui o capital. As redes sociais mudaram completamente as relações humanas para a intensificação do que Bauman chamou de amor líquido, a relação pseudoamorosa, que busca o prazer a qualquer custo. O sujeito tornou-se objetificado, ele é aquilo que consome. O consumo é objeto de status. Quanto mais conexões a pessoa tiver mais célebre e requisitada se torna. O sexo é mero prazer, sem amor e sem vínculo, eventual. A reprodução é uma consequência. Esse capitalismo provoca a mudança fazendo crer que através dele alcança-se a felicidade. Ela é momentânea, movida pelo consumo, que não satisfaz gerando a necessidade constante de alcançá-la de forma infrutífera porque ela nunca vai chegar. Os sujeitos tornam-se tristes, ansiosos, sobrecarregados e às vezes depressivos.

Quanto às questões provocadas por Bauman, assemelham-se às que vivemos na atualidade. Observa-se uma globalização de fato que atinge a todos os seres humanos. No período de quarentena verifica-se a liquidez moderna nas relações sociais, instabilidade política e fragilidade econômica com a quebra das bolsas de valores, desmantelando o “status quo” presente. A tecnologia da informação surge neste contexto como uma ferramenta de orientação e entretimento. Experimenta-se o poder do estado, aliado ao poder do vírus, sobre os cidadãos, acompanhado de motivações religiosas doutrinárias. Cremos que se não fosse a crise esses aspectos não produziam os efeitos desejados e não aconteceriam espontaneamente.

Constata-se, diante do caos estabelecido pelo coronavírus, que a humanidade se curva e é refém da moeda do saber científico, que nesse contexto manifesto não é a força, o dinheiro ou castigo, mas a inteligência que detém o conhecimento, apontada como a fonte de poder capaz de sanar a questão existente. As organizações: exércitos, empresas, governos e outros terão que se submeterem a razão cientifica que explicará o comportamento das pessoas frente à problemática. A punição será a última coisa contra os recalcitrantes, pois isto deverá ser resultado de um processo de conscientização interna de cada indivíduo. A negação à ciência tornaria as orientações impróprias e ilegítimas. Nesse contexto, a religião, a mídia, a imprensa, o rádio e a TV exercem um poder influenciador, determinante sobre a sociedade. Enquanto isto, esperemos pela vacina, para que possamos ter mais segurança e voltarmos a vida normal.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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