José Nunes
Nestes versos do Fernando Pessoa (Álvaro de Campos), expresso a minha saudade de Nathanael Alves:
“Mestre, meu mestre querido!
Coração do meu corpo intelectual e inteiro!”
A essa saudade iniciada em abril de 1981, ano de sua partida, acrescentaria mais estes versos do mesmo poeta português:
“Meu mestre e meu guia!” (….)
“Meu mestre, meu coração não aprendeu a tua serenidade”.
Nosso derradeiro encontro aconteceu no hospital. O momento em que apertei a sua mão é a lembrança quase inapagável na memória. Depois, solitário no meio de tanta gente, eu tocaria o caixão com seu corpo inerte, antes de ser colocado na terra fria, na tarde de nossa despedida derradeira.
A perda dele trouxe orfandade literária ao jovem que sonhava ser poeta, mas terminou jornalista. Quando cheguei à capital paraibana, refulgiam os brilhosos raios do grande jornalista que deram luz aos caminhos quando entrei na mocidade. As muitas palavras que ouvia dele eram como um recado para aumentar o ânimo deste que titubeava entre a poesia e o burburinho da redação de O Norte, na fase da juventude. A ação de Nathanael Alves dominava as atuações de muitos jornalistas tarimbados e focas, a mim principalmente porque recorria à sua casa, a fim ouvir palavras indispensáveis no ambiente de definições.
Ele era um homem de gestos simples. Não tinha complexo de superior na alma. Diversamente, era de espírito conciliador e de sentimento de solidariedade, mesmo não querendo reconhecer-se portador.
Mestre, meu amado mestre. Nada diminuiu a admiração e o trato do artista da palavra, ao vê-lo na câmara mortuária. Custava acreditar que o homem de muita sabedoria, autor de belos artigos e ensinamentos, estivesse mudo e inábil para todo e sempre. Mestre, meu estimado mestre, tarde aprendi a te admirar. Foste a consciência da liberdade, da imprensa guardiã, da liberdade do pensamento que me ensinou a viver nos ensinamentos caros de aprender e difíceis de esquecer.
Ele foi um representante vivaz da robustez da Imprensa da Paraíba em uma época das liberdades limitadas. Apesar da vida breve, do tempo curto como foi o de grandes gênios da humanidade, ele deixou lições para quem deseja seguir os caminhos do jornalismo. Voltando à leitura de seus textos, em livro ou esparsos em jornais, percebe-se a fecundidade extraordinária do seu pensamento. Tendo publicando crônicas, contos e poemas caracterizados pela excelência, ele precisa ser revisto pelos que integram as redações dos jornais.
Poucos cronistas na Paraíba tiveram a alma humilde semelhante à de Nathanael, que nunca desejou sair de Arara. Sempre tratou a palavra com originalidade na elaboração dos artigos que escreveu desde a adolescência, quando ainda morava na casa de Padre José Coutinho. Sua glória como jornalista, que destacamos galhardamente, perdurou pelo menos duas décadas, até retornar à terra de origem.
Diante da dor física, Nathanael nunca desanimou, mesmo quando – como revelou ao amigo Gonzaga Rodrigues, em visita ao hospital onde estava em tratamento de saúde – disse que “não dava mais”, sem demonstrar que estava amargurado. Em nosso último encontro, segurando minhas mãos trêmulas, afirmou aquilo que me atormenta até hoje: “Zé, me perdoa…” Como eu não pude falar, porque tinha a voz cortada, ficou sem ouvir minha resposta.
Agora, décadas depois, posso responder: Mestre, meu amado mestre, me perdoa se não correspondia ao que você esperava. A arte, porém, ajuda na minha resposta.
Tantas vezes o percebia acabrunhado, triste, sem revelar as dores do corpo, mesmo angustiado com a situação da sociedade. Mas nunca desanimou. Algumas vezes, sentia nele a alma abatida, contudo “a arte, que é a liberdade, era a força medicatriz do seu espirito”, no dizer de Machado de Assis sobre José de Alencar.
Será justo perpetuar a sua memória, assim como a de outros que se destacam nas letras da Paraíba. A reverência a certos nomes da Imprensa, veneráveis jornalistas de época as distintas, quando plantaram sementes viçosas, deve ser revelada em iniciativa da Associação Paraibana de Imprensa. Aguardemos.
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