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Passei muito tempo procurando o primeiro CD de Lô Borges, conhecido popularmente como o “disco do tênis”, em referência à imagem da capa – o álbum é um marco de Lô Borges que tinha apenas 20 anos. Um ex-amigo me falou que eu encontraria na Galeria do Rock, São Paulo. Achei. Bem caro, paguei em dez vezes. Faz tempo.
Há tempos fora de catálogo, sem reedição em vinil e tendo sido lançado no país em CD pela última vez em 2002, o álbum é tão bonito e fez cabeça de muita gente, gente que nem sabia, nem frequentava o Clube da Esquina, mas já se incluía no Trem Azul.
Com a ajuda do letrista e irmão Márcio Borges e de uma galera bacana Beto Guedes, Toninho Horta, Tenório Jr. e Robertinho Silva, Lô em várias ocasiões precisava compor uma canção de manhã e já levá-la ao estúdio à noite.
São 15 faixas transbordando delírio e psicodelia, surrealismo e espírito estradeiro, tudo misturado a porções de jazz, folk, forró, hard rock e harmonias vocais. Uma obra de arte, o o “disco do tênis”
Das capas que fiz para o Caderno de Cultura do Jornal Correio da Paraíba, cujo editor era Renato Félix, tive a oportunidade de entrevistar Lô Borges algumas vezes – a primeira, acho, foi quando ele lançou um disco com Samuel Rosa e aproveitei o gancho para perguntar sobre a histórica da capa do “disco do Tênis” do par de tênis, e ele disse: “é uma foto do meu tênis” Lembrei do Caetano, quando perguntaram a ele no Canal Livre, quem era Caetano Veloso, ele disse: “sou eu”
A quinta faixa “do disco Tênis”, “Não foi nada”, só tem duas frases – em que Lõ Borges diz que sonhou que nunca existiu, e viu que ele nunca sonhou” é uma canção de uma imensa beleza, e na terceira faixa “O Caçador” ele conta que viu um caçador com um revólver apontado para lua e que precisou esconder seu cabelo da tempestade. É demais, né?
Dizer que ele sonhou que nunca existia em 1972, já era um sinal de que quebrara as prstas da puberdade e ele realmente não existia, não como se diz por aí: “K vc não existe” Não há outra coisa que eu pense e já ouvi várias vezes esse disco, mais vezes de quando comprei o CD, que agora está disposição em todas as plataformas. É um som diferente, letras viajantes.
O estranho silêncio na rua que ele canta em Homem da Rua, reflete em sua imagem, a despedida, onde coube muitas vozes dos coral em seu velório. Lô Borges um hóspede inesperado cuja arte e sentimentos ligados à nossa vida e não a morte, sua voz diferente, à vontade com o excesso de palavras ou a falta delas.
Dar para imaginar a solidão, a mobília, os retratos, o piso, os castiçais da casa dos pais dele, a mesmice, os livros, mas é tudo coisa da minha imaginação. O disco é tão bonito que segue tudo desviado como rostos que riem para um jardim, que fica para lá.. além do planeta Minas
Eu era pequeno, com 12 anos e Lô Borges já era artista, agora recordo-o, quando o vi num show em São Paulo na década de 80 com a jornalista Selma Tuarge, ela me dizendo: “ele é bárbaro, bárbaro” e eu o olhava ele cantar em silêncio.
Lô, um artista que possa ter sido cheio de ser, está morto.
A última entrevista foi em abril passado, quando ele lançou um disco com Zeca Baleiro. Ficou na minha cabeça.
Kapetadas
1 – O futuro chegou, Lô Borges. E veio armado.
2 – Eu sou entusiasta desta grande e incontestável verdade: “Quem é, não sente necessidade de provar”
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"INCLUSÃO DIGITAL" - 03/11/2025