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Juiza de 9a Vara Civel de João Pessoa. Especialista em Gestão Jurisdicional de Meios e Fins e Direito Digital

            O PANÓPTICO DE BENTHAM NA ERA DIGITAL

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publicado em 02/11/2025 ás 15h52

O Panóptico foi um conceito arquitetônico e filosófico concebido pelo jurista e filósofo  britânico Jeremy Bentham no final do século XVIII,  proposto como um modelo de prisão ideal, cuja intenção era maximizar a eficiência na vigilância e na reforma dos detentos, através do isolamento por intermédio de divisórias, para que os presos não pudessem se comunicar uns com os outros.[1]

Contudo, foi Foucault quem, em sua obra “Vigiar e Punir” (1975),[2] elevou o nível da metáfora, que foi poderosa para analisar as relações de poder, disciplina e controle presentes em diversas instituições da sociedade moderna, como escolas, hospitais, fábricas e trânsito.

Mas sabia Bentham, muito meno Foulcaut, que na era digital, nós teriamos um panóptipo que não seria de vigilância através das prisões, ou mesmo através de câmeras instaladas em escolas, trânsito e hospitais, mas dos algoritmos, que nos tornam prisioneiros da tecnologia.

Os microfones dos celulares ouvem nossas conversas e nos aprisionam em bolhas de consumo e de interesses específicos, para efeito de controle comercial e social, com massivo volume de dados que são coletados para efeito de previsão de comportamento, com potencial chance de controle social pelos Governos, que nos conduzem e nos induzem a comportamentos incentivados pelos devaneios de nossos rastros e pegadas digitais, a cada momento que consultamos ou curtimos algo, ainda que sem pretensões determinadas, mesmo que involuntariamente, somos todos vigiados panopticamente pelos algoritmos das Big Techs.

Essa vigilância através dos algoritmos cria problema, como no caso da rede de supermercado american Target, que baseada no “escore de gravidez” gerado pelo modelo algoritmo, enviou cupons de desconto de produtos de bebê para uma clientes adolescente. A história se tornou pública quando o pai da adolescente tomou conhecimento e procurou o gerente da loja para tomar satisfação,  incomodado porque a loja havia enviado cupons de desconto de produtos para bebê a sua filha de apenas 16 anos, que ainda estava no ensino médio.  Porém o gerente se desculpou, mas insistiu que o pai que estava enganado. De fato, a adolescente estava, realmente, grávida, tendo a loja previsto isso, antes mesmo da própria família saber.[3]

Para o direito fica o desafio de garantir dignidade,  privacidade e autonomia do indivíduo, frente a suas escolhas, quando o olhar digital se torna onipresente, promete segurança e conveniência em troca de soberania. Legislações como a GDPR (General Data Protection Regulation) na Europa e a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) no Brasil são passos importantes, mas o escopo global e a velocidade das inovações tecnológicas exigem uma reflexão contínua e muito mais aprofundada para que a privacidade e dignidade sejam preservadas.

A tarefa que se apresenta é desenhada por novas arquiteturas legais e éticas que abordem o data ownership e a accountability dos algoritmo, além da necessidade da digital literacy para todos, para  que se possa enxergar através das persianas algorítmicas, transparência e confiança neste espaço onde o eco constante da vigilância parece que não ter limites.

[1]Panóptico digita,. Disponível em <https://ricardoesper.com.br/2023/02/panoptico-e-privacidade-digital/> Acesso em 21 out. 2025.

[2]Foucout, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão; tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis, Vozes, 1987.

[3]Caso Target Disponível em <https://conteudo.traycorp.com.br/target> Acesso 21 out 2025.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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