João Pessoa, 30 de junho de 2025 | --ºC / --ºC Dólar - Euro

ÚltimaHora
Bacharel, Especialista e Mestre em Administração (UFPB/UNP). Mestre Internacional em Comportamento Organizacional e Recursos Humanos (ISMT – Coimbra/Portugal). Especialista em Neurociências e Comportamento (PUC-RS) e em Inovação no Ensino Superior (UNIESP). Membro Imortal da Academia Paraibana de Ciência da Administração (Cadeira 28). Professor universitário (UNIESP), consultor empresarial, palestrante e escritor best-seller da Amazon. E-mail: [email protected]

Geração Z confia mais na IA do que no chefe?

Comentários: 0
publicado em 30/06/2025 ás 09h23

Geração Z confia mais na IA do que no chefe?

A Geração Z está reconfigurando o modo como lidamos com emoções no trabalho. Uma pesquisa recente revelou que 76% dos jovens trabalhadores dessa geração já utilizam ferramentas de inteligência artificial, como chatbots, não apenas para automatizar tarefas, mas para entender e responder a situações delicadas com colegas e gestores. Em vez de buscar conselhos com superiores, muitos preferem perguntar à IA o que fazer. Para quem nasceu num mundo digital, isso parece natural, mas o fenômeno revela muito mais do que um simples uso de tecnologia.

A maioria desses jovens não está usando a IA apenas para corrigir textos ou organizar planilhas, mas para analisar e-mails de chefes, entender o tom das mensagens e até para se preparar para conversas difíceis. Cerca de 75% já pediram ajuda a um chatbot para interpretar comunicações escritas, como mensagens no Slack ou e-mails. Quase um terço afirma que utiliza IA para isso “o tempo todo”. O dado é curioso e, ao mesmo tempo, revelador: estamos diante de uma nova forma de mediação emocional no ambiente profissional.

Essa geração valoriza respostas rápidas, sem julgamentos, e o ambiente dos chatbots proporciona exatamente isso. Para muitos, a IA funciona como uma espécie de espelho seguro, que devolve respostas com base lógica e sem os filtros emocionais que costumam gerar desconforto. Isso tem aumentado a sensação de validação e confiança em si mesmos, segundo especialistas. É como se os trabalhadores da Geração Z tivessem encontrado na IA uma espécie de conselheiro neutro, sempre disponível.

Por outro lado, nem tudo são flores. Quase metade dos jovens admitiu que mudou a forma de se comunicar depois de consultar a IA, sendo que muitos se tornaram mais assertivos, o que pode ser positivo, mas outros apenas reforçaram padrões já existentes, inclusive crenças tendenciosas. Há relatos de que alguns passaram a se desculpar mais, enquanto outros simplesmente reforçaram a negação de responsabilidades. Isso mostra que, se mal utilizada, a IA pode acabar sendo mais um reforço de bolhas emocionais do que uma ferramenta de amadurecimento.

Um dos principais riscos, segundo os especialistas, é o esvaziamento da responsabilidade pessoal. Quando a IA confirma uma visão sem confrontá-la com diferentes perspectivas ou sem considerar o contexto humano, ela pode alimentar uma postura de fuga e vitimismo. Em vez de gerar aprendizado, a ferramenta pode servir como escudo contra críticas e crescimento. É como se a máquina dissesse sempre “você tem razão”, mesmo quando seria mais saudável ouvir um “reflita melhor sobre isso”.

Há também limitações importantes: nenhuma IA consegue interpretar linguagem corporal, captar desequilíbrios de poder ou considerar as sutilezas de uma cultura organizacional. A ausência de empatia verdadeira e de escuta ativa são obstáculos que não podem ser contornados por códigos e algoritmos. Em conflitos interpessoais, a presença humana ainda é insubstituível. E nesse ponto, a confiança irrestrita na IA pode representar um empobrecimento das competências socioemocionais.

A pesquisa ainda revelou que mais da metade dos trabalhadores da Geração Z enxergam as ferramentas de IA como colegas de trabalho, e quase metade prefere conversar com elas do que procurar seus chefes. Isso acende um alerta: estamos substituindo o diálogo humano por interações com máquinas? Em que medida isso enfraquece os laços entre líderes e liderados? Quando o colaborador prefere falar com a IA do que com o gestor, algo na cultura organizacional precisa ser repensado.

Nesse cenário, os profissionais de Recursos Humanos têm um papel crucial. Não se trata de proibir o uso da tecnologia, mas de ensinar como integrá-la de forma ética, consciente e equilibrada. As emoções fazem parte da experiência profissional e precisam ser acolhidas, não ignoradas nem terceirizadas para softwares. Promover uma cultura emocionalmente saudável é mais do que uma tendência: é uma necessidade diante dessa nova realidade.

O desafio das empresas não é competir com a inteligência artificial, mas garantir que ela complemente, e não substitua, os vínculos humanos. A IA pode ser útil para mediar conflitos ou organizar argumentos, mas é a empatia que sustenta relacionamentos profissionais duradouros. É preciso lembrar que equipes fortes não se formam apenas com lógica: elas se constroem com afeto, escuta, confiança e presença.

Talvez a maior lição que a Geração Z esteja nos ensinando seja essa: que a busca por segurança emocional no trabalho é legítima. Mas, ao mesmo tempo, essa segurança não pode ser delegada a um algoritmo. Ela precisa ser construída, dia após dia, nas relações reais, entre seres humanos que erram, aprendem, se expressam e evoluem juntos.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

[ufc-fb-comments]