João Pessoa, 05 de novembro de 2025 | --ºC / --ºC Dólar - Euro

ÚltimaHora
José Nunes da Costa nasceu em 17 de março de 1954, em Serraria-PB, filho de José Pedro da Costa e Angélica Nunes da Costa. Diácono, jornalista, cronista, poeta e romancista, integra a Academia Paraibana de Letras, o Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, a União Brasileira de Escritores-Paraíba e a Associação Paraibana de Imprensa. Tem vários livros publicados. Escreveu biografias de personalidades políticas, culturais e religiosas da Paraíba.

As janelas  de Neide

Comentários: 0
publicado em 05/11/2025 ás 07h00
atualizado em 04/11/2025 ás 21h18
 
         Enquanto observávamos o espaço onde estão os livros e outros objetos, guardados com esmerado cuidado depois da passagem do seu marido, a professora e imortal Neide Medeiros mostra sua produção de quadros tendo as janelas como tema, pintados em momentos de rara inspiração. Ela trabalha com pinturas figurativas, rostos humanos, mas são as janelas guardadas na memória que estão presentes nas suas aquarelas.
         Neide revelou que o gosto de observar o mundo pelas janelas vem desde o tempo de criança. Demonstra tanto apego pelas janelas que, de um impulso, começou a pintar janelinhas e a escrever poemetos, alguns usados como ilustrações de sua produção literária.
         Suas pinturas participaram de uma exposição no ano de 2010. Algumas janelinhas, transformadas em cartões postais, adornam casas com silenciosa poesia.
         As janelas são um atrativo a mais na vida das pessoas. Quem não gosta de se debruçar na janela para ver o tempo passar, ou observar a vida lá fora.
         Da janela se olha o mundo. O mundo ao largo ou o mundo interior.
         O diretor de cinema John Ford usou a janela para mostrar novos conceitos de observação do que se passa lá fora, trazendo para dentro de casa a paisagem perdida na vastidão do mundo deserto do Arizona antigo, de forma poética, mesmo que devastada.
         As janelas indiscretas guardam segredos que mesmo usando binóculo é possível decifrar.
         Fotógrafos do mundo inteiro têm dedicado atenção especial a registrar seu olhar na perspectiva da janela.
Uma fotografia do Antônio David de tempos atrás, mostrando Gonzaga Rodrigues na janela de sua antiga casa em Alagoa Nova, olhando o mundo da sua infância, traz uma profunda saudade. O olhar de Gonzaga se perde na imensidão dos canaviais sobre as serras, esperando o entardecer, que parece nos cobrir com sua sombra.
         As janelas de Tapuio continuam abertas na minha lembrança, de onde víamos a vida passar pela estrada que nos levava a Serraria, Arara e Solânea.
         “Sempre tive uma predileção pelas janelas. As janelas me acompanham desde o tempo de criança e adolescente, quando olhava a movimentação da nossa cidade”, recorda a professora Neide.
         As janelas são como as cachoeiras, recordam a vida pelo som que deixam penetrar em quem está perto. Mesmo que a cachoeira seja pequena, a música da queda da água faz bem a nossa alma. Assim como o vento que entra pelas janelas traz emoção, as cachoeiras são janelas que convidam à contemplação ao mundo ao seu redor.
         Assim como os poetas, com ousada sensibilidade, os pintores usam as janelas como metáforas para olhar o mundo, para mostrar a esperança ao largo.
A janela convida para a contemplação nos mais variados aspectos humanos.
Da janela é possível se observar muitas coisas.
         Para o poeta Mário Quintana, quem escreve um poema, abre uma janela. Sendo assim, quem pinta uma janela, abre espaço para entrar a brisa que aquece a alma e perfuma o ambiente.
         Entre quem escreve um poema e quem pinta uma janela, existe um contato sensível, afetuoso entre dois espíritos no uso de instrumentos diferentes para se comunicar e sonhar.
Na janela, sentindo o vento, é possível a integração com a vida, em noite com estrelas e luar.
Em um poema revelador, a poetisa Adélia Prado assim fala da “janela, palavra linda”. No poema ela jura que a “Janela é o bater das asas da borboleta amarela. Abre pra fora as duas folhas de madeira à-toa pintada, janela jeca, de azul”.
Drummond, que reconhecia existir um estilo para se “chegar à janela, de espiar a rua”, da janela olhar o mundo. “O mundo é grande e cabe nesta janela sobre o mar”, canta o poeta de Itabira.
As janelas de Neide Medeiros ajudam a olhar o mundo lá fora, os rios de nossa vida, porque há tantos sonhos que podem ser vistos se abrirmos a janela do nosso coração.
Os sonhos da infância que alçam voos pelas janelas, são como os pássaros ao serem libertos das gaiolas.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

[ufc-fb-comments]