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Paraibano da Capital. Tocador de violão e saxofone, tenta dominar o contrabaixo e mantém, por pura teimosia, longa convivência com a percussão, pandeiro, zabumba e triângulo. Escritor, jornalista e magistrado da área criminal do Tribunal de Justiça da Paraíba.

O novelo de Alveriano

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publicado em 21/10/2025 ás 19h23

Há quem consiga estabelecer linha rígida entre arte erudita, estudada e aprendida em escola, ou, aos pés de um grande mestre, e arte popular, surgida espontaneamente entre os povos, em todas as épocas e todos os cantos da Terra.

Afora os critérios puramente estéticos e as técnicas usadas, pessoalmente, encontro muita dificuldade em traçar essa linha divisória. Daqui para lá, a arte é erudita, de lá para cá, é popular.

No campo das artes plásticas, é um pouco mais nítida a distinção. Mesmo gênios, na maioria dos casos, carecem de aprendizado. Leonardo da  Vinci precisou tomar aulas do Mestre Verrocchio, e só tornou-se o Da Vince que conhecemos após estagiar por anos no ateliê do notório artista florentino. Mas, a questão persiste: quem será deu aulas aos escultores e pintores da Grécia Antiga? Quem foi o professor de Fídias?

Trazendo para o nosso tempo, quem lecionou J. Borges , Bento de Sumé ou Costa Leite? Não se sabe. O que se tem notícia é que esses artistas foram autodidatas, esculpindo na madeira suas respectivas realidades, aquilo que  observavam ao redor. Utilizando o critério da espontaneidade, esta arte seria, portanto, popular.

Na escrita, essa formação do artista – sim, quem escreve é artista – é sobremaneira interessante. Não existem escolas de  formação de poetas, sem resultados desastrosos e risíveis. Como ensinar alguém a fazer soneto, a lançar sua confissão de sentimentos em forma de poema? Vale dizer que toda poesia é popular? Provavelmente sim.

Olhando o nosso caso, vemos exatamente essa raiz do povo. Como não perceber o traço popular, escancarado, em Gregório de Matos:

Anjo no nome, Angélica na cara, 

Isso é ser flor e anjo juntamente, 

Ser Angélica flor, e Anjo florente

 Em quem, senão em vós, se uniformara?

 

Mesmo poetas, digamos, mais refinados, como Mário Quintana, não perdem seu viés do povo:

Todos esses que aí estão

Atravancando meu caminho,

Eles passarão…

Eu passarinho !

Nesse caminho, encontramos, brotando como uma flor de cacto, a poesia de Cordel, as Trovas , a Aldravia, o Repente , e tantas outras expressões do poeta popular brasileiro. A opulência de nossa cultura continua a espocar nos rincões, nas estradas de barro, nas feiras livres, na bodegas e nas praças do Nordeste.

O “Novelo Poético” de Alveriano Dias, Editora Guedes, 2025, constitui substancial enriquecimento para o acervo cultural de nosso país. Em trovas, haicais  e seu ancestral tanka, o poeta faz exatamente aquilo que lhe cabe: fala do seu meio, confessa sentimentos.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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