João Pessoa, 21 de outubro de 2025 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
O status de profissional de saúde relaciona-se à grande cobrança e expectativa por parte da população. Espera-se de um bom profissional que esteja atualizado, bem humorado, descansado, atento, bem vestido e atendendo em plenas condições de saúde e de modo educado.
É comum às pessoas que atuam na área da saúde mental, quer sejam estas, médico(a)s, psicólogo(a)s, enfermeiro(a)s, terapeutas ocupacionais, educadores físicos etc., que se coloquem na posição de cuidadores ou curadores, e muito pouco lembrem que também têm uma metade “paciente” que é frágil e, portanto, como qualquer ser humano podem adoecer e entrar em desequilíbrio físico e emocional, e, consequentemente, precisarem de ajuda. Aos olhos da sociedade em geral e de muitos destes profissionais, há uma crença enraizada, que estes têm obrigação de serem saudáveis, afinal o papel deles é de cuidar dos outros e não de serem cuidados.
Assim, alimenta-se uma crendice que, os próprios profissionais de saúde, por possuírem toda uma bagagem de informações e conhecimentos, podem cuidar de si próprios, o que não é tão simples assim. Estes técnicos, são tão humanos e frágeis quanto qualquer outra pessoa, e por estarem inseridos nessa mesma cultura de autossuficiência, comumente evitam procurar ajuda, e quando o fazem é de forma tardia. O ditado popular: “Sou cuidador, logo me cuido”, se constitui numa afirmação que nem sempre é real.
A rotina dos profissionais de saúde, especialmente médico(a)s e enfermeiro(a)s é normalmente repleta de estados de tensão, expectativas de funcionamento técnico apurado, insalubridade ocupacional etc., e tais fatores têm um caráter altamente estressante e ansiogênico, facilitando assim o comprometimento da saúde mental destas pessoas.
Mesmo diante dessa realidade, há muita resistência e até negação por parte desses trabalhadores da saúde em admitir ocasionalmente a condição de pacientes que necessitam de ajuda de terceiros. Tal fato alicerça-se certamente, no pouco conhecimento da importância dos fatores psicológicos e sociais nos processos de adoecimento e cura, tanto em si quanto nos pacientes, também na hegemonia da compreensão biomédica e do modelo cartesiano de ciência, e também como já citado, na crença da autossuficiência, dentre outros motivos. Tudo isto faz com que seja comum a negação em assumir que estão com problemas, especialmente quando se trata do aspecto mental / emocional.
É importante esclarecer que, para suportar a sobrecarga de trabalho comum aos profissionais de saúde, e o consequente estresse, alguns destes recorrem ao uso indevido de substâncias psicoativas, lícitas e ou ilícitas. Isto faz com que o uso nocivo e a dependência química entre os profissionais de saúde, sejam tão frequentes quanto na população em geral, sendo menos prevalente o tabagismo e mais comum o consumo de benzodiazepínicos e derivados opioides. O abuso de álcool e drogas ilícitas como autoindulgência por um estilo de vida estressante e caótico também é citado na literatura médica.
Segundo levantamentos nacionais, a síndrome de burnout (esgotamento profissional), que está caracterizada em três dimensões: exaustão emocional, baixa realização profissional e despersonalização, tem sido experimentada comumente por profissionais que desempenham atividades em que está envolvido um alto grau de contato com outras pessoas, a exemplo dos prepostos da saúde. Acrescentam ainda, que a principal causa de aposentadorias precoces destes profissionais decorre de transtornos psiquiátricos, sendo os diagnósticos mais comuns os transtornos de ansiedade, depressão e dependência de álcool.
Assim, pela importância desses profissionais para a saúde e bem estar de toda a sociedade, faz-se necessário e indispensável cuidar dos cuidadores. E este cuidado começa pela conscientização destes valorosos trabalhadores, que precisam aprender a admitir suas incompletudes e fragilidades, comuns a todos os seres humanos. È certo que o conhecimento destes nessa área é muito importante, e também que, o automonitoramento pode ser útil, mas este tem eficácia limitada, visto que a autoavaliação pode estar prejudicada em diversos transtornos mentais ou mesmo na dependência química, daí o papel imprescindível dos colegas em orientar e ajudar àquele(a) que está com problema.
Portanto, repito, deve-se reconhecer que as dificuldades fazem parte do cotidiano de todos os profissionais, e que em relação aos atores da saúde não é diferente. Todos passarão por períodos de turbulências emocionais e o possível surgimento de quadros de ansiedade, depressão ou mesmo o uso abusivo de substâncias. Mas, os problemas existem para serem resolvidos e não para serem camuflados pelo cobertor do silêncio, do uso indevido de drogas e ou da negação em receber ajuda. Geralmente quem primeiro percebe que há sofrimento mental são àquelas pessoas próximas como o cônjuge, os pais, um filho mais próximo, um amigo mais presente e ou os colegas de trabalho. A opinião e apoio destas pessoas é utilíssima. Desta forma o que se espera de todo profissional é uma análise honesta do estado de coisas que tem vivido e a humildade de aceitar auxílio quando necessário, e da sociedade como um todo, a consciência que os cuidadores também precisam ser cuidados.
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