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O experimento foi simples, mas revelador: os participantes foram convidados a inventar brinquedos a partir de um tijolo e um ventilador. Quem usou o ChatGPT gerou ideias muito semelhantes, com mais de 90% apresentando conceitos sobrepostos. Nove participantes, inclusive, deram exatamente o mesmo nome ao produto: “Castelo de Construção de Brisa”. Já os que não usaram IA apresentaram soluções únicas e variadas. O resultado evidencia um problema pouco debatido: a IA tende a padronizar a criatividade.
O uso de inteligência artificial tem se tornado comum em processos criativos e decisórios nas empresas. É eficiente, rápido e gera um certo encantamento. No entanto, o estudo alerta que, quanto maior a dependência da IA nesses contextos, menor a pluralidade de visões, um risco especialmente sério quando estamos buscando inovação. Repetição de ideias, ainda que bem formuladas, é o oposto do que se espera em um brainstorming de verdade.
Isso não quer dizer que a IA deva ser banida das equipes criativas, mas sim que deve haver cautela em como e quando usá-la. O excesso de confiança na tecnologia pode limitar a abertura para perspectivas divergentes, que são justamente a matéria prima das grandes invenções. Como dizem os autores do estudo, o valor de um brainstorming está na diversidade de pensamentos, e não em muitas pessoas dizendo a mesma coisa com palavras diferentes.
Esse alerta é ainda mais urgente em tempos de adoção acelerada da IA no mercado de trabalho. Empresas têm se apressado em substituir funções humanas por algoritmos, nem sempre com clareza sobre os impactos dessa decisão. Uma pesquisa da Orgvue revelou que mais da metade dos líderes empresariais que implementaram IA de forma apressada se arrependeram. Muitos perceberam, tarde demais, que não sabiam exatamente onde a máquina seria útil ou o que ela acabaria substituindo de fato.
A relação com a IA precisa ser mais madura. Nos processos seletivos, por exemplo, 87% dos candidatos entrevistados em uma pesquisa americana disseram que preferem ser avaliados por pessoas e não por robôs. Eles acreditam que apenas um humano consegue captar nuances como empatia, atitude e compatibilidade cultural. Mesmo os mais jovens, que crescem usando IA para escrever currículos e treinar entrevistas, reconhecem que o fator humano continua sendo essencial.
Esse contraste revela uma chave importante: a IA pode ser uma grande aliada, mas não substitui a escuta, a sensibilidade e a intuição humanas. Em vez de delegar tudo à máquina, é hora de pensar em parcerias inteligentes, onde humanos e tecnologia atuam juntos, cada um com seus pontos fortes. Criatividade não é apenas gerar ideias rápidas, é sustentar visões diferentes, acolher o inusitado, conectar o improvável.
Lideranças que desejam promover inovação real precisam cultivar ambientes onde a diferença seja bem vinda. É da colisão entre visões distintas que surgem soluções originais. Se todos os caminhos levarem ao mesmo “Castelo de Construção de Brisa”, talvez seja hora de desligar um pouco a IA e ouvir mais o que cada mente humana, com sua história e repertório únicos, tem a dizer.
No fim das contas, uma equipe criativa não é aquela que pensa igual com eficiência, mas aquela que ousa pensar diferente com propósito. A diversidade de ideias não é um detalhe, é o motor da reinvenção. E isso, até agora, nenhuma inteligência artificial conseguiu simular com fidelidade.
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BOLETIM DA REDAÇÃO - 01/07/2025