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Clara Velloso Borges é escritora, professora de literatura e mestranda em Estudos Literários pela Universidade Federal de Minas Gerais. E-mail: [email protected]  

Fala a minha língua

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publicado em 14/04/2023 às 07h00
atualizado em 13/04/2023 às 15h21

Era tapuia aquele que, no período de colonização brasileira, não falava tupi. Como a língua é dinâmica, tapuia virou muitas outras coisas, como a designação étnica de um povo indígena em Goiás. Entretanto, no texto de hoje, fica a semântica daquele que não fala a minha língua.

Apesar do glotocídio indígena (ou seja, do assassinato de línguas indígenas) no Brasil, ainda há um quê de tupi nos nomes que nos batizam. Recentemente, jantando com uma amiga natural de Itabirito, fui pega de surpresa numa trívia, indagada se sabia o que significava o nome de sua terra natal. Prontamente, respondi: “é uma pedra”. Oras, se desconheço sua cultura, não me escapa sua toponímia: “ita” é pedra em tupi. De imediato, com nome de pedra, me vieram logo à mente a paraibana Itapororoca e a mineira Itabira, de onde saiu Drummond.

Resistiu o tupi, um dos troncos linguísticos da América Latina, como definidor de muitos atributos brasileiríssimos. E digo que resistiu, efetivamente, porque os portugueses até tentaram fazer com que nossas fauna e flora tivessem sotaque europeu. Contudo, o plano fracassou. Vieram de línguas indígenas a maior parte dos nomes de plantas e de animais brasileiros. Todos de uma sonoridade deliciosa e muito nossa: sabiá, cutia, tamanduá, baiacu, perereca, jabuti.

A diversidade ambiental é refletida no nosso idioma oficial. Idioma este, aliás, instituído por decreto português, e imposto muito antes, com a chegada de Cabral. Em 1758, Marquês de Pombal, então primeiro-ministro de Portugal, decretou a língua portuguesa como idioma oficial do Brasil. Obviamente, uma língua não se institui por decreto, mas essa já estava aqui desde 1500, mediante uma série de violências coloniais.

Sem muita escolha, fomos falando, desfiando o verbo, fazendo um cafuné, pendurando um azulejo na parede. Ficou encantador o português brasileiro. E toda vez que abro a boca, emendando um “oxe” com tantas expressões do mundo afora, eu sinto, como cantou Caetano, a minha língua roçar na língua de Luís de Camões. (foto)

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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