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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Continuam pobres

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publicado em 20/07/2021 às 08h06
atualizado em 20/07/2021 às 05h14

Fazia tempo que eu não via o salão cheio. Vi os pobres diabos e os pobres de espírito. Farinha do mesmo prato. Uns com um humor negro cortante que chega a transfigurar o rosto. Outros, de um mal gosto que beira o fanatismo. Conheço vários. Acho que uns 40 anos mil de certeza não menos, poucos mais terá.

Ao longe, a silhueta é a mesma de há trinta anos, corpos esquálidos, ou barrigudos, as mãos enfiadas não sei onde, no fundo nos bolsos apertados das calças, tão antigas como as vantagens que contam.

Vivem num apogeu aparente, mas com ocupação conhecida, sempre ali, de um lado para o outro, de dia em dia, como um gato a esgueirar-se por portas entreabertas. Mas é gato, é gato.

Não são deste mundo. De mundo nenhum. Adoram dinheiro e o pouco que têm, não se contentam. Costumam ajudar as pessoas, mas fazem disso um show. Só falam em fortunas, as imaginárias, é claro. Eu nunca tenho dinheiro sobrando. O que ganho é o suficiente.

Ia descendo a avenida Epitácio Pessoa, quando no sinal fechado, um pobre diabo me acenou, dizendo: “Olha meu carro novo, Sr K”. Eu estava cantando “Cucurrucucú, Paloma” e não consegui ver. Pow!

Eu fico chateado, quer dizer, ficava, quando tinha que sair de casa para comer uma coisa, ou festejar outra e me encontrava com pessoas que só falavam em dinheiro.

Eu sempre acreditei na sobrevivência, trabalho para isso, trabalho dia e noite. Nunca entendi porque tais pessoas sabem quanto ganham as outras e fazem questão de falar isso nos lugares públicos, dos mínimos aos de alto escalão. Não me interessa.

A vida continuou.

Torneiras, prateleiras, gavetas que não fecham, portas que não abrem, relógios, perfumes, um blazer novo, tudo me parece igual. Não vejo porque pobres de espírito fazem discursos desnecessários, em mesas de bar. Bares, não sei mais onde ficam. E extrapolam. Vendem a alma e ficam devendo até o último suspiro.

Outros, não aparecem mais. Quando surgem, fazem as coisas como devem ser. Na deles.

Toda gratidão aos amigos, as escadas, o arroz comido, o prato lavado. Esses, contam comigo.

Com ripas de madeira erguidas sobre a paisagem, a miséria cresce no território de ninguém.

Nos baldios, sem nada para fazer, a descascar os dias, essas criaturas vão vivendo numa interminável mentira. Não tenho pena, mas não gosto desses pobres diabos, colchas de retalhos, de aplicações, citações milionárias ou gente que vive da vida alheia.

O modus operandi é o mesmo.

Quem é rico não conta vantagens.

Kapetadas
1 – Ser adulto é preciso provar o tempo todo que é adulto.
2 – Eu acho que a vida de adulto é uma cantiga de roda. Somos escravos de jobs.
3 – Som na caixa: “Pobre de quem acredita/Na glória e no dinheiro para ser feliz”, Caymmi

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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