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Poeta, escritor e professor da UFPB. Membro da Academia Paraibana de Letras. E-mail: [email protected]

Turismo rural

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publicado em 03/03/2021 às 08h37

Mesmo que Puxinanã não esteja bem no que tange aos requisitos básicos do turismo rural, como assinalou pertinentemente meu confrade Evaldo Gonçalves, em coluna da semana passada, esta cidade do Cariri paraibano (foto) detém, como tantas outras dessa sagrada microrregião, imenso potencial para a prática do turismo.

Falta de boas estradas, água com lixões por perto e carência de bons serviços constituem entraves, sim, mas não diluem a naturalidade atrativa, peculiar para a visitação, daquele céu azul, claro e límpido, das telas e afrescos do pintor Miguel Guilherme de Oliveira, estendido pela vastidão das grotas, das serras e sítios de Sumé; dos cerros desertos, áridos e catingueiros que, de Puxinanã, atravessando as léguas rasas e agrestes de Pocinhos, parecem varar o mundo, recortando Soledade e Juazeirinho, Assunção e Taperoá, na branca solidão dos descampados onde reinam cactos e marmeleiros; dessa geografia mágica encravada nas locas e lajedos que de Serra Branca refletem a história geológica das pedras de Queimadas e de Aroeiras, as súplicas noturnas que ecoam dos alcantis isolados de Pai Mateus, a descortinarem a infinita beleza da paisagem parda e azulada tecendo o fio enigmático das distâncias.

Todos esses burgos, dos velhos e novos cariris, esbatidos pelos ventos frios que fogem dos costados da Borborema e que fazem seus dias tépidos e suas noites, úmidas, possuem uma fisiografia geodésica e uma estética natural, rudes e belas, capazes de irrigar o imaginário turístico de quem ousa jornadear pelos seus vales e desfiladeiros, tangenciando seus rios temporários, descortinando seus magros barreiros e seus riachos esquecidos, seus paus d` arcos floridos, seus umbuzeiros solitários.

A sensibilidade e a imaginação do turista, sobretudo do turista educado para o turismo e suas reservas telúricas e culturais, saberão do valor de tocar o chão adusto dos mapas sagrados; de colher as pétalas do silêncio que se abriga nas furnas infinitas, como que a suspender o ritmo horizontal do tempo e fazer, do repouso à beira das estradas, instantes raros das mais simples epifanias; de observar, com as lunetas do coração ecológico, a poesia arcaica dos bois pastando suas oferendas vitais sob a sombra de vetustas baraúnas e algarobas, acalentados pela sinfonia silvestre dos azulões, canários da terra e galos de campina.

Cada pedaço de pedra, cada fazenda na curva do caminho, cada igrejinha quase arruinada, cada vilarejo vazio e desterrado, cada matuto com seu bornal de lembranças, cada cidade, com ou sem teatro, com seus coretos, praças e tosca arquitetura, enfim, cada elemento, do ar, da água, do fogo e da terra, pode imprimir valor ao patrimônio turístico, em sua histórica, racional e poética mobilidade. O que é preciso é descobrir a alma das coisas, a vida que pulsa, com todo o cortejo de suas verdades essenciais, de seus símbolos modelares, de suas imagens características, sob o sol inclemente – deus soberbo e arredio – na esfera renovável desses longínquos povoados. Puxinanã é, sim, uma cidade turística!

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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