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Fora da lei e contra o bom senso. Esse é o título do novo artigo do procurador-geral do Estado, Gilberto Carneiro, publicado neste domingo (14) no Correio da Paraíba. Carneiro trata e se posiciona contra a proposta de plebiscito agitada pela presidente Dilma Roussef.
Na opinião de Gilberto, a tese “flerta com a inconstitucionalidade e desafia as leis do bom senso”.
Para o estudioso e professor universitário medida que altera a estruturas da Constituição Federal “não pode ser tratado dessa forma, atropelando instrumentos mais adequados, como as propostas de emendas constitucionais e de projetos de leis em curso”.
Confira o texto na íntegra.
Fora da lei e contra o bom senso
Ao apresentar no Congresso Nacional uma proposta de plebiscito para implantar ampla reforma política no Brasil, a presidente Dilma Roussef (PT) flerta com a inconstitucionalidade e desafia as leis do bom senso.
Primeiro porque um tema amplo, complexo e que alterará em estruturas da Constituição Federal não pode ser tratado dessa forma, atropelando instrumentos mais adequados, como as propostas de emendas constitucionais e de projetos de leis em curso. Depois, porque o tempo sugerido para todo o processo de discussão e definição das novas regras, que já seriam aplicadas nas próximas eleições, é impraticável e ameaça o princípio constitucional da anualidade ou anterioridade, conforme redação do artigo 16 da nossa Lei Maior que prescreve: "a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência".
Mudanças radicais na interpretação da Constituição devem ser acompanhadas da devida e cuidadosa reflexão sobre suas consequências, tendo em vista o postulado da segurança jurídica. Não só a Corte Constitucional, mas também o Tribunal que exerce o papel de órgão de cúpula da Justiça Eleitoral devem adotar tais cautelas por ocasião das chamadas viragens jurisprudenciais na interpretação dos preceitos constitucionais que dizem respeito aos direitos políticos e ao processo eleitoral.
Não por menos a Ordem dos Advogados do Brasil e alguns membros ou ex-integrantes do Supremo Tribunal Federal, assim como o ministro Carlos Ayres Brito se posicionaram contra o plebiscito. Teme que perguntas que alterem a Constituição saiam da esfera já consagrada da proposta de emenda constitucional, para recair sobre a consulta popular como se fosse um cheque em branco.
Além do mais, torna-se evidente que a ideia do plebiscito reflete o desejo do Palácio do Planalto de criar uma cortina de fumaça para encobrir os verdadeiros anseios da população, aduzidos nas ruas durante às manifestações. E, por tabela, permitir o desenho de uma reforma que atenda aos planos da atual gestão, tão somente.
Ora, o povo não quer saber, nem muito menos saberá em pouco tempo, de discutir se o voto deve ser distrital misto ou distrital puro, nem muito menos se é preciso acabar com as coligações proporcionais. E tudo num tempo, como registramos, que deverá atropelar tudo o que foi construído no aparelho jurídico e legal brasileiro. É como se Deus, na criação do mundo, resolvesse fazê-lo em dois dias no lugar de seis e ainda colocasse os impasses da complexa e grandiosa criação para decisão de Adão e Eva. E mais: num custo exorbitante, em torno de R$ 500 milhões, apenas quando se contabiliza os custos diretos.
Se quisesse realmente dar ao povo o direito de escolher uma reforma fruto do desejo popular no Brasil, a presidente deveria sugerir uma consulta sobre a redução de impostos perguntando se o brasileiro gostaria de pagar menos IPTU, IPVA ou Imposto de Renda, ou de quanto deveria investir obrigatoriamente em saúde, educação e segurança pública.
Com sua natureza desviante, o plebiscito impõe uma pauta que colocará o Brasil, a mídia, as instituições e a sociedade nos próximos meses numa corrida frenética pra saber se teremos ou não financiamento público de campanha ou se suplente de senador tem que ser votado. Temas que, apesar de urgentes de serem tratados, não podem desviar a pauta exigida pelo povo.
Atualmente tramitam no Senado as PEC´s 38/2011, do senador Renan Calheiros, 55/2012, senador Ricardo Ferraço (PMDB/ES), 41/2011 e 48/2012, da senadora Ana Amélia (PP/RS), 73/2011, do ex-senador paraibano Wilson Santiago, 65/2007, do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB/PE), todas versando sobre reforma política e tramitando no Senado. Basta um esforço concentrado e vontade política para o Congresso Nacional discutir e votar as matérias, podendo submeter a sociedade à deliberação através do instituto do referendum, se for o caso.
A presidente disse que ouviu a voz das ruas. Deve ter entendido mal. As ruas pediram por mais recursos na educação, na saúde, acabar com a corrupção, melhoria na mobilidade urbana e na qualidade dos serviços públicos, entre outras proteções e garantias.
Gilberto Carneiro da Gama
Advogado, Professor Universitário e atualmente Procurador Geral do Estado
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