João Pessoa, 10 de abril de 2025 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Vamos entender a sutileza da perdição?
No mundo contemporâneo, onde a pressa se tornou o compasso da vida, a reflexão se perde em meio ao barulho. Recentemente, assisti a uma entrevista em um podcast que me fez parar e pensar. Um dos entrevistadores, em um momento de ousadia, fez uma pergunta ao ChatGPT: “Se você fosse o Diabo, como destruiria o homem do século XXI?” A resposta ecoou em minha mente como um aviso sutil.
“Se eu fosse o Diabo”, começou a voz, “não tiraria nada de você. Nem seus desejos, nem seus sonhos, nem sua fé. Eu apenas os distorceria. Sutilmente. Para que você acreditasse que está no controle, enquanto eu o conduzo.”
A primeira manobra seria com o tempo. Não para atrasá-lo, mas para acelerá-lo. Eu o faria correr tanto que você nunca mais conseguiria parar. O descanso se tornaria um fardo; a pausa, uma tortura. E assim a vida passaria, enquanto você se tornasse um mero produtor.
Depois, mexeria na linguagem. Tornaria tudo mais curto, mais superficial, mais urgente. Você se comunicaria com todos, mas se conectaria com ninguém. As palavras perderiam seu peso e seu significado.
Em seguida, confundiria o desejo. Faria com que você trocasse desejo por carência e que cada incômodo parecesse uma falha sua ou uma falta do outro. Você estaria sempre em busca de algo, mas sem saber o que realmente procura.
E por fim, tocaria nos vínculos. Convenceria você de que depender é fraqueza e que amar é perigoso. A vulnerabilidade seria vista como uma falha de quem não se ama o suficiente. E assim você se blindaria até se tornar uma fortaleza vazia.
Você teria liberdade, mas viveria isolado; teria sucesso, mas sentiria um cansaço sem nome.
Ao ouvir isso, um silêncio profundo tomou conta de mim. Não porque falava do Diabo em si, mas porque ressoava com a nossa realidade — com a minha e com a sua. E lembrei-me de algo que a psicanálise ensina: o Diabo não precisaria inventar nada novo; bastaria acionar o que há de mais humano: o medo da falta, a angústia do desejo e a negação da fragilidade.
A psicanálise nos revela que não somos destruídos pelo mal em si, mas pelas formas que criamos para tentar evitá-lo. É na busca incessante por escapar da dor e da dependência que podemos acabar entregando tudo o que nos torna humanos.
Assim, mesmo cercados por pessoas — redes sociais repletas de rostos — muitas vezes estamos sozinhos. Somos ilhas cercadas por mares de superficialidade e ansiedade.
E no fim das contas, será essa realmente a vida que desejamos? Uma existência apressada e desconectada? Que possamos encontrar coragem para desacelerar e redescobrir os laços genuínos que nos fazem humanos. Que possamos viver com intensidade e sinceridade — mesmo que isso signifique abraçar nossas fragilidades e vulnerabilidades.
Porque é nesse espaço entre os medos e os desejos que reside nossa verdadeira natureza
* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB
QUALIDADE DE VIDA - 24/04/2025