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Bacharel, Especialista e Mestre em Administração (UFPB/UNP). Mestre Internacional em Comportamento Organizacional e Recursos Humanos (ISMT – Coimbra/Portugal). Especialista em Neurociências e Comportamento (PUC-RS) e em Inovação no Ensino Superior (UNIESP). Membro Imortal da Academia Paraibana de Ciência da Administração (Cadeira 28). Professor universitário (UNIESP), consultor empresarial, palestrante e escritor best-seller da Amazon. E-mail: [email protected]

Sua empresa é de verdade ou só faz de conta?

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publicado em 17/04/2025 ás 20h25

Você já reparou como muitas empresas na Paraíba se apresentam como defensoras de valores nobres? Basta visitar um site, folhear um panfleto ou rolar o feed das redes sociais para encontrar slogans inspiradores: “gente em primeiro lugar”, “aqui somos uma família”, “qualidade acima de tudo”, “nosso maior ativo são as pessoas”. Palavras bonitas, cheias de boas intenções — pelo menos no papel. Mas uma conversa com os colaboradores ou uma visita desavisada ao ambiente de trabalho costuma revelar uma realidade bem diferente. Ali, onde a rotina acontece longe dos holofotes, os discursos se desfazem.

Essa incoerência não é exclusividade da Paraíba, mas aqui ela ganha contornos particulares. Em muitas pequenas e médias empresas, especialmente nas familiares, a palavra “família” é usada como símbolo de proximidade e acolhimento. Só que, na prática, vira desculpa para sobrecarga, falta de limites, improviso e, não raro, episódios de assédio moral disfarçados de “brincadeira”. A contradição entre o que se diz e o que se faz é uma das feridas silenciosas do mundo corporativo — e uma das mais difíceis de curar.

Na teoria da cultura organizacional, chamamos isso de “valores expostos”: aquilo que a empresa declara acreditar. Mas se esses valores não estão alinhados com os comportamentos, com a estrutura da organização e, sobretudo, com as crenças mais profundas das lideranças, o que nasce é uma cultura de incoerência. E incoerência, na gestão, custa caro. Não apenas em números — custa em confiança, em engajamento, em verdade.

É fácil encontrar empresas que estendem faixas com frases como “colaborador feliz, cliente satisfeito” na recepção, mas cultivam líderes despreparados, comunicação agressiva e um clima organizacional pesado nos bastidores. Nessas empresas, os valores são peças de marketing institucional, não princípios de gestão. O ambiente diz mais do que qualquer discurso ensaiado. E os colaboradores percebem.

Essa cultura do “diga uma coisa, faça outra” tem impactos profundos. Ela mina a credibilidade das lideranças, compromete o alinhamento da equipe e contamina a reputação da empresa. Em tempos de redes sociais, sites de avaliação e grupos de WhatsApp, não dá mais para maquiar a cultura. As pessoas falam, compartilham, expõem. Cultura organizacional não é o que a empresa diz que é — é o que as pessoas sentem, vivem e replicam.

Aqui mesmo, na Grande João Pessoa, quantas empresas dizem investir em inovação, mas punem o erro com bronca pública? Quantas distribuidoras afirmam valorizar o colaborador, mas não oferecem nem água gelada em dias de calor escaldante? Quantas startups juram ser “horizontais e abertas”, mas concentram todas as decisões nas mãos de uma única pessoa? São relatos que chegam em visitas, em rodas de conversa, em estudos de campo. Não são julgamentos — são constatações. E o primeiro passo para transformar uma cultura é admitir a distância entre o que se fala e o que se faz.

O risco dessas mentiras sinceras é a desmotivação silenciosa. O colaborador percebe que o discurso é só fachada, e, com o tempo, para de acreditar, de se engajar, de propor. A cultura se torna cínica. O ambiente, tóxico. O resultado? Uma empresa que se distancia cada vez mais de sua própria identidade.

Mas é possível sair desse ciclo. E começa com um gesto simples e corajoso: ser honesto consigo mesmo. Fazer perguntas reais. O que está nos nossos valores e realmente é praticado? O que é só enfeite? Que comportamentos são recompensados — mesmo quando contradizem os princípios que colocamos nos murais?

Ouça mais. Observe os rituais do dia a dia. Questione os velhos hábitos. Cultura não muda com frases de efeito, mas com coerência cotidiana.

Se a sua empresa diz que “as pessoas são o maior patrimônio”, prove isso em cada decisão, especialmente nas mais difíceis. Se você fala em respeito, pratique-o nos momentos de tensão. Se quer ser inovador, comece inovando na coragem de reconhecer onde está falhando. Porque, no fim das contas, os colaboradores não esperam perfeição. Esperam verdade. E verdade, quando praticada, tem um poder transformador que nenhum slogan consegue encenar.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB