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Francisco Leite Duarte é Advogado tributarista, Auditor-fiscal da Receita Federal (aposentado), Professor de Direito Tributário e Administrativo na Universidade Estadual da Paraíba, Mestre em Direito econômico, Doutor em direitos humanos e desenvolvimento e Escritor. Foi Prêmio estadual de educação fiscal ( 2019) e Prêmio Nacional de educação fiscal em 2016 e 2019. Tem várias publicações no Direito Tributário, com destaque para o seu Direito Tributário: Teoria e prática (Revista dos tribunais, já na 4 edição). Na Literatura publicou dois romances “A vovó é louca” e “O Pequeno Davi”. Publicou, igualmente, uma coletânea de contos chamada “Crimes de agosto”, um livro de memórias ( “Os longos olhos da espera”), e dois livros de crônicas: “Nos tempos do capitão” …

Tudo sou eu nessa casa

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publicado em 10/05/2024 às 07h00
atualizado em 09/05/2024 às 17h56

(Que mãe nunca disse essa frase?)

E o filho da puta do Fabrício com a cara mais deslavada do mundo vem me pedir cinquenta reais emprestados. Escroto! Saiu de casa de manhã. Foi esfriar a cabeça com uma breja gelada acompanhado dos amigos do futebol.

A  escrava, não! Acordou-se às cinco horas com a cara mais amassada do que um maracujá seco. Forrou a cama das crianças, passou a camisa de Juninho, que há dias ia todo engelhado para a escola, lavou os pratos do jantar do outro dia, fez uma omelete relâmpago para Celinha, pôs uma tonelada de roupa suja na máquina, lavou os banheiros, sentou-se.

Sentar-se? Há,há,ha! Sininho pulou no meu colo e latiu:

– Mamãe.

A bichinha estava um horror. Tinha carrapato até no fiofó. Corri para a Petalegria, providenciei o que tinha de providenciar, lavei Sininho, pus o vermicida, beijei a cabecinha dela, mas o dia ainda era a proa do seu início.

A geladeira estava imunda. Cuidei disso. Desentupi duas bocas do fogão, piquei a verdura e temperei a carne da semana, varri a casa, passei um pano molhado no piso, tirei a roupa do varal, cortei as unhas de Juninho, que pareciam garras afiadas, organizei as gavetas do guarda-roupa, separei a papelada para o empréstimo da casa, pus a panela no fogo, mas vi que tinha acabado o arroz. Fui à mercearia. Voltei afogueada do juízo.

Lá do quarto, Celina gritou:

– Mamãe, quanto é a raiz quadrada de 136?

– Celina, mulher, pesquise. Não tenho cabeça pra isso e se tiver, ela deve ser raiz quadrada de um número negativo.

Celina riu bem alto.

Fabrício chegou por volta das 13 horas. Pendia de um lado para o outro. Com a voz trôpega, sem um tostão furado no bolso, quis me engabelar:

– Por que não almoçamos no bar do Zeeeeca?

Eu olhei o canalha de soslaio. Tive pena. E nojo. Peguei o celular, pesquisei por Valdique Soriano, aumentei o volume o máximo que pude:

–Eu não sou cachorro não, pra viver tão humilhado. Eu não sou cachorro não…

Meu Deus! Mais branca do que  uma tapioca de coco, Celina aparece na cozinha com os olhos espantados:

–Mamãe, mamãe, menstruei.

Era Dia das Mães. Ali com uma mocinha agarrada no meu abraço, chorei, chorei, chorei.

@professorchicoleite

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