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Titular em Letras Clássicas, professor de Língua Latina, Literatura Latina e Literatura Grega da UFPB. Escritor, é membro da Academia Paraibana de Letras. E-mail: [email protected]

Carta aberta à população e às autoridades governamentais

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publicado em 20/08/2023 às 12h14

Na parte mais importante do seu centro histórico, João Pessoa tem três vias paralelas, de que se originaram as transversais: Rua General Osório, Rua Duque de Caxias e Avenida Visconde de Pelotas.

A Rua General Osório já (foto) foi Marquês de Herval, título honorífico do patrono da Cavalaria. Antes disso, foi batizada na sua origem com o nome de Rua Nova, por ser a primeira via aberta, com a intenção de ser rua, não apenas um caminho. Ali se situou o Mosteiro de São Bento e, no seu início, talvez por isto mesmo tenha sido construída, a Igreja de Nossa Senhora da Neves, nossa catedral, hoje basílica menor.

A Rua Duque de Caxias, por sua vez, já foi Rua São Gonçalo. Notabilizou-se, no entanto, por muito tempo, com o significativo nome de Rua Direita. Acredito que o nome tenha se originado tomando como referência a religião e a geografia. Se nos voltarmos para o norte, ponto de referência aos viajantes, desde tempos imemoriais, por causa da estrela polar da Ursa Menor, e por causa da Ursa Maior, única das duas constelações a ser vista no hemisfério sul, onde nos encontramos, postando-nos, portanto, diante da catedral, a nossa direita estará o leste ou o oriente, também ponto de referência inequívoco, devido ao nascer do sol. A Rua Direita poderia ser, pois, direita por ser reta e plana, ou direita por se situar, por conta das causas apontadas, do lado direito da Rua Nova.

Não importa o motivo do nome. O que importa é a Rua Direita é uma das mais significativas vias de nossa capital. Sem entrar no mérito, que já expliquei em outros artigos, ela abrigou por dois anos o nosso maior poeta, Augusto dos Anjos, razão pela qual defendo a mudança do nome da rua, sem ter nada contra o Duque de Caxias, o patrono do Exército, que lhe dá o nome atual. Como diria Camões a lança só tem valor se na outra mão estiver a pena. A pena, por si só, é de um valor inestimável.

Além de o poeta ter ali residido, entre os anos de 1908 e 1910, a Rua Direita é o cenário da Igreja da Misericórdia, a mais velha de João Pessoa. Como se não bastasse, no seu final, já no antigo Campo do Comendador Felizardo, hoje Praça João Pessoa, encontra-se a convento fundado por Gabriel Malagrida, em que funcionou a primeira sede do Liceu Paraibano, de que Augusto dos Anjos foi aluno e, depois, professor.

Não vou falar da antiga Rua da Cadeia, a atual Avenida Visconde de Pelotas, a não para acentuar a importância das três vias, de que se originaram as vicinais que as cortam no sentido leste e oeste, como a Conselheiro Henriques, antigo Beco do Carmo; a Ladeira da Borborema, a Braz Florentino, a Ladeira Feliciano Coelho, Rua Miguel Couto, Rua Peregrino de Carvalho, Praça Aristides Lobo, Rua Guedes Pereira…

Este núcleo urbano, de grande importância está, minhas Senhoras e meus Senhores, entregue à própria sorte, com o seu rico acervo arquitetônico minguando e suplicando por socorro urgente. João Pessoa necessita de nossa ajuda para a revitalização do seu centro histórico, voltando a ser área de residência, o que ajudaria a revitalizar o comércio.

Do jeito que o centro histórico se encontra, entregue à degradação do tempo e dos homens, não só estamos perdendo a nossa riqueza cultural, mas estamos favorecendo o lixo, o entulho, a insalubridade, a vagabundagem, o vício, o tráfico, a bandidagem, enfim. Sabemos que, quando o poder público se ausenta, os donos malévolos surgem das trevas para ocupar os espaços… A situação é lastimável e, na sua etimologia, deplorável.

Em lugar de se gastar dinheiro com projetos caros e mirabolantes, como o que se propala, em relação à orla, projeto que será, sem dúvida, uma agressão jamais vista ao meio-ambiente (olha, que nem sou ativista…), o poder público deveria empregar o dinheiro da população – tomado compulsoriamente através dos impostos, que nos lega o falso nome de contribuinte, quando deveríamos ser chamados de espoliados ou esbulhados –, na reconstrução de um patrimônio reconhecidamente valioso.

Todos, minhas Senhoras e meus Senhores, ganhariam com isto, até pelo fato de que seria infinitamente mais barato e menos danoso à natureza do que o faraônico projeto da orla…

Parafraseando-os, faço meus os versos de Manuel Bandeira, na defesa à cidade de Ouro Preto:

Minha gente,

Salvemos João Pessoa.

Meus amigos, meus inimigos,

Salvemos João Pessoa.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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