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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Não esqueça o lençol

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publicado em 20/08/2023 às 08h44

Como quem se atira num lago, em busca de um afago, um dedo de prosa, na lembrança mais remota das canoas e caronas, de repente um uber falante, o carro caindo aos pedaços, uma mulher nua na estrada, e o prazer de estar no Rio de Janeiro, não existe outro igual.

O sol a queimar a moleira e eu ali, atravessando o céu, o mar, louco para o que uber chegasse logo em Copacabana, mas o jeito foi puxar conversa com o motorista que entrou calado e saiu um grilo falante. Cheke to Check, só com uma dona que acenou pra mim, embarcando em outro avião, para London, London.

De encontro com o retrovisor, antes, as malas que não cabiam na carro, eu vi que foi o jeito apertar e embarcar. Estávamos eu e o Alex, chegando de outros mares, e somos todos chineses, para o show “Transa” de Caetano Veloso, no Festival Doce Maravilha.

Não me surpreendo mais com nada, na antecâmara da loucura alheia, veio uma fogosa ideia: eu nasci na Paraíba, o senhor conhece o Nordeste? “Quem sou para conhecer o Nordeste” respondeu o motorista Ludovicu, bem mais delirante que eu, um mulato primo do moleque Ricardo, que nos conduzia para o Cristo Redentor.

Você é carioca, Ludovicu? “Não, nasci em Caxias. Você sabe que muita gente que nasceu e mora em Pavuna, Penha e Caxias, não conhecem o Rio?, indagou. Achei cruel a assertiva, mas a vida em sina, meu bem, meu mal

Logo lhe apresentei meu amigo, o empresário Alex do Prato, filha de Dona Edith e do Dr. Arnaldo, natural do Ceará. O motorista disse que adoraria conhecer Teresina a capital do Ceará, e tomar meia dúzia cajuína. Tá com a bexiga.

O que é isso aqui?, perguntei apontando para um desenho de chipanzé no muro em que aparecia do lado um desiludido governo e uma imagem da Xuxa e seus adoráveis baixinhos .“Isso o quê? Ah! Ali é a Feira de São Cristóvão. O senhor já foi feira, é a melhor do Rio, tem tudo, galinha, bolo baeta, pimenta do reino, coentro e laranja bahia”. Nesse tempo, o Alex falava com Dona Pri, sua mulher, lá do outro lado do mundo. E priu.

Continuei a conversa com o motorista. “Doutor, o senhor sabia que o Galião fica na Ilha do Governador?” Não sabia, eu sei que “Eu Mataria o Presidente”, da amiga Adelaide Carraro. Ele não entendeu nada. Eu disse amém, ou quase, quase nada.

Eu tentei recolher as palavras e voltar para o Nordeste, mas ele sempre mudava de assunto. Quando chegamos na Linha Amarela, ele mudou a sintonia do rádio e veio a voz de Geraldo Vandré, perguntei se Ludovicu estava ligado, ele disse que não, que não gostava de droga e de repente um calor quase fogo nos meus olhos, nenhuma bala perdida, nenhuma dor, tudo em cima.

Depois de uma longa conversa jogada fora, do Galeão a Copa, eis que regresso e deparo-me com um olhar amoroso sobre o Rio, quando ele disse: “vocês conhecem bem o Rio?” Eu disse não, só a parte da Lapa, Santa Tereza e o túnel Dois Irmãos. Ele deu uma risada estrambólica.

Convidei o Ludovicu para conhecer a Paraíba, as mulheres bonitas de Atenas, o Bolerão de Ravel do Jurandy, tapiocas e pé de moloque, incapazes de resistir.

Ufa! Chegamos. O motorista desceu para tirar as malas do Fusca lá fora, deu a aúltima gargalhada, olhou pra gente e disse: “ me aguardem, um dia vou conhecer o estado que vocês, o Maranhão” E eu, tá certo, mas não esquece os lençóis.

Kapetadas

1 – -Oi, sumida! O que anda fazendo? – Procurando outro esconderijo. Deu a bexiga

2 – Amar o próximo é fácil, quero ver tolerar o anterior.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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