João Pessoa, 25 de julho de 2023 | --ºC / --ºC Dólar - Euro

ÚltimaHora
Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Cadê o Arigó?

Comentários: 0
publicado em 25/07/2023 às 07h00
atualizado em 25/07/2023 às 04h55

(para todos que amam as árvores e os animais)

No quarteirão onde moro no Cabo Branco, cresce o cenário das demolições. É o antigo progresso. O capitalismo, a insegurança, mandam destruir casas e árvores, deixando só fotografias.

Parece que a derrubada das árvores, das casas, acontece no escuro. Os espigões crescem em velocidades estúpidas dentro do bairro. Cadê o Arigó?

Morar perto do mar, não é como uma onda, além das correntezas. Um bando de craqueiros cracados avançam mais que as construções, mas isso é uma questão de polícia, dos direitos humanos, fulanos e sicranos.

Sal nos meus olhos. Faz tempo.

Sábado passado entrei numa rua, noutra, só para ver Aparecida Stropp passeando com sua cadela Malu, cega de um olho. Ali mesmo me deparei com uma casa no chão e duas árvores, cujo corte, foi na carne, comprometendo a vida de dois bouganvilles. Não importa, era uma árvore, um crime, uma sombra.

Casas projetadas para o alto. Tudo isso já foi um lar. A realidade aqui é uma “mise em scèse”.

Mas fala sério, quem se importa ou quem é quer ler, saber do meu texto, se estamos todos no cenário?

Lembrei do poema “A Arvore da Serra” de Augusto dos Anjos e faço de tudo para não esquecer esses versos.

As árvores, meu filho, não tem alma!
E esta árvore me serve de empecilho…
É preciso cortá-la, pois, meu filho,
Para que eu tenha uma velhice calma!

– Meu pai, por que sua ira não se acalma?!
Não vê que em tudo existe o mesmo brilho?!
Deus pôs almas nos cedros… no junquilho…
Esta árvore, meu pai, possui minh’alma!…

Eu escrevo em fuga, vejo o tempo passando, mas não finjo ter visto – não tem jeito: passa tudo, a moça, o velho calção de banho, as crianças, os jardins, daqui a pouco só teremos prédios e ninguém se encontra mais.

Cenários indicam o vazio. Como podem derrubar as árvores, se casas de papelão se espalham a olho nu na beira mar?

A vida triturada, o carro do lixo, sumiu o homem vigia sumulado, a letra tremida nas paredes. O cenário lembra a sensação de outra pandemia, além do trânsito em transe.

Eu escrevo da prisão dos meus sonhos, e nunca mais teremos árvores.

Sempre a ganância. Artifícios. Tudo é simulacro.

Entre as coisas mais inexplicáveis da vida estão as explicações desnecessárias. É o fim.

Kapetadas

1 – Todo mundo de rosa, do jeito que Damaris gosta, adora.

2 – “Por que você mudou comigo?” Eu não mudei com você. Eu mudei comigo.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

Leia Também