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Professora Emérita da UFPB e membro da Academia Feminina de Letras e Artes da Paraíba (AFLAP]. E-mail: [email protected]

Lourival Moura, um médico de antigamente

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publicado em 02/07/2021 às 18h05
atualizado em 02/07/2021 às 15h13

Ao conversar no grupo de colégio pelo WhatsApp, escutei vários depoimentos da amiga Cléa Moura sobre seu genitor e o que me chamou mais atenção foi a maneira como exercia a medicina de forma filantrópica, o que o faz ser lembrado como um profissional de perfil singular. Nos primórdios, ao longo dos séculos, Hipócrates, ateniense que uniu a filosofia à medicina, considerado como seu pai, lidou com problemas de doenças em busca de se alcançar a saúde, compreendendo o funcionamento do organismo humano, no afã de encontrar explicações racionais para o seu controle e o que escreveu sobrevive até os dias atuais. O objetivo principal centra-se no salvar vidas como missão mais especial do médico. Com este propósito a medicina evoluiu e incorporou conhecimentos técnico- científicos indo dos procedimentos terapêuticos tradicionais até a medicina robótica, surgida em 1985, quando um robô PUMA 560 ajudo numa biopsia. Os avanços são inúmeros, todavia jamais substituirão a relação interativa do médico – paciente. As máquinas não possuem sentimentos, por isso o atendimento humano tem que ser valorizado.

Ser médico é mais do que opção: é uma abnegação. A grande responsabilidade de cuidar da saúde da população é a missão diária do médico. Plantões, acompanhamento de pacientes hospitalizados, cirurgias e noites mal dormidas fazem parte do dia-a-dia de quem abraça a vida médica profissional. Eu acompanho de perto pois possuo um filho médico e vejo sua luta cotidiana.
Quem é o médico Lourival Moura? Lourival nasceu em 30/09/1896, bairro de Tambiá, no casarão à rua N. S. Mãe dos Homens, n°39, filho de João de Brito de Lima e Moura e de Esther de Gouveia Moura, sendo o quinto filho de uma família de sete irmãos. Fez sua alfabetização e o primário com a mestra Francisca Moura e seu Curso de Ensino Médio e Colegial no Liceu Paraibano.

Cursou medicina na Faculdade da Bahia. Na época só existiam duas faculdades, a da Bahia e a do Rio de Janeiro. Terminou medicina em 1923, conforme o quadro pertencente à família, em foto onde constam, ele, os formandos e os professores. O deslocamento para lá era feito de navio, por não haver avião. Iam de navio no começo do ano e só voltavam no final. No início, em Salvador, passou uma temporada no Hotel Americano, no Colégio Spencer e em uma pensão que ficava na rua Sete, mas foi na Baixa do Sapateiro na “República dos Sete Pecados” e no Largo de São Miguel, que diz ter vivido os melhores anos de sua vida.

Cléa conta episódios da vida estudantil de Lourival: “Ele contava que onde se hospedavam chamava-se República dos sete Pecados, dos estudantes e por cada período um era presidente. Numa ocasião Lourival foi presidente e nesse período eles quebraram a sopeira da casa. O dinheiro estava curto. Naquela época o dinheiro era enviado pelos pais através dos comerciantes com muita dificuldade. Ele desceu para o comércio na Baixa do Sapateiro pra comprar uma sopeira, pesquisaram, mas o dinheiro não dava, era caro. Na casa trabalhava para eles uma senhora, chamada Jardelina.

Tiveram a ideia de comprar um penico de louça já que estava dentro das possibilidades. Os colegas relutaram, disse que teriam repugnância, mas ele os convenceu que não tinha nada demais, era uma louça como outra qualquer, virgem e que ninguém havia tocado. Não precisava ficar constrangido. Compraram a peça que nem embrulharam e saíram pela rua com a sopeira-penico. Acrescentou que o penico foi aposentado depois que o seu irmão, já formado em engenharia, foi a Salvador almoçar com eles, e, durante o almoço, ele falou pra Jardelina, traga o feijão e ela serviu no penico; logo ele retrucou: “não! Vou comprar para vocês uma sopeira de vergonha”. Ele conta várias histórias interessantes, decorrentes da estadia em Salvador, que se intitula “Memórias Confissões no primeiro quartel do século”. Editado pela UFPB este livro foi lançado em um jantar e ele distribuiu com as pessoas amigas. Diz Cléa: naquela época estudar para ser médico apresentava muitas dificuldades, além das que já eram comuns como locomoção e hospedagem etc. Os livros das diversas disciplinas eram em francês o que obrigava aos alunos dominar outro idioma, para prestarem os exames. Fazia ele um esforço de estudar o francês, pois se tornava condição “sine qua non” para ter acesso aos conteúdos curriculares do curso.”

O prédio da faculdade antiga, hoje, é o Memorial de Medicina da Bahia. Visitando Salvador, Clea foi conhecer o memorial e adentrou numa das salas onde há um móvel composto de gaveteiros com os registros documentais de todos os alunos que estudaram naquela época. Cléa identificou o nome de seu pai, puxou a gaveta e constatou que estavam lá o histórico escolar, a tese, a inscrição na faculdade e todo memorial referente a sua vida acadêmica. Revela Cléa: “Foi muita recordação, emocionante! Fez-me reviver o passado quando em conversa descrevia-me sua vida de estudante com muito entusiasmo. Mexeu no âmago do meu coração e não contive as lágrimas. O mobiliário muito bonito, tudo da época e muito bem conservado.” Para transparecer a personalidade de seu genitor expressa: “Há um fato que ele contava, que demonstrava o seu espirito de doação, generosidade e personalidade. Narra: “Certa vez tinha um colega muito humilde que morava em Guarabira e não podia viajar no navio nem de primeira nem de segunda classe. Como ele não queria que o colega voltasse sozinho, veio com ele de terceira classe do navio que era um amontoado e misturado com os bichos, em situação muito desconfortável. Vomitou a viagem todinha”. Acrescenta: “quando chegamos ao porto de Cabedelo, as tias estavam esperando todas muito chiques, de chapéu, vestidas ao caráter da época. Quando ele as avistou disse para o colega: elas não sabem por onde eu estou vindo”. Por toda a sua vida foi generoso e muito caridoso e nunca cobrou consulta ou conta de ninguém”.

No dia 24 de novembro de 1931, contraiu matrimônio Lourival Moura com a mademoiselle Olivia de Athayde, de família conceituada da alta sociedade paraibana. Filha de Alfredo José de Athayde e Maria Sales de Athayde em cerimônia celebrada pelo Padre Raphael de Barros Moreira, de modo singelo, recepcionando os convidados com um almoço, na casa de seu pai para a família, amigos íntimos e seus colegas. Foram passar a lua de mel na Praia de Ponta de Mato, numa casa bucólica, acolhedora e romântica à beira mar. Simples, mas na sua singeleza estava a profundidade dos sentimentos que a união daquele casal fizera daquela morada seu ninho de amor. E para surpresa minha essa residência pertenceu a meu pai, Serafim Rodriguez Martinez, e que por herança ficou para mim. Foi vendida e hoje já não existe, deu origem a um educandário. Tiveram quatro filhos Suzana, João de Brito, Suzete e Cléa. Celebrou, com uma bonita festa, as Bodas de Prata, 25 anos de casados, com lauto jantar. Tudo preparado dentro do maior esmero pela maior idealizadora da época em eventos sociais, Clara Otto Amorim, que realizava a ambientação e o buffet, tudo de primeira qualidade servido com requinte e muito bom gosto. Dr. Lourival gravou um disco com mensagens para ser ouvido durante o jantar, além das palavras dirigidas a sua amada, mulher e companheira Olivia, recordando as juras de felicidades, de dever, de paz e de amor infinito….”

Para comemorar seu centenário, em 1996, seu filho João de Brito de Athayde Moura, médico dermatologista, renomado, em João Pessoa, publicou o livro “Centenário Lourival de Gouveia Moura, “Com o objetivo de guardar a sua memória como pessoa e profissional. Recém formado e solteiro, Dr. Lourival foi nomeado para ser o primeiro diretor do Hospital do Pronto Socorro, mas declinou em função do convite para combater a epidemia de febre tifoide em Santa Luzia do Sabugy, no alto sertão da Paraíba. Ia permanecer cinco meses e passou lá cinco anos. Com muito trabalho obteve sucesso vencendo a epidemia. Na sua saída, em 1929, mereceu o reconhecimento da população mediante manifestação para entrega de um cartão de ouro assim escrito; “Ao Dr. Lourival Moura, o povo de Santa Luzia pede que fique.” Diz Cléa: “sabe o que ele fez? Tirou a foto do cartão, e naquela época muita gente usava dente de ouro. Ele, amigo de Dr. Burity, odontólogo, disse para ele: “tome esse cartão e faça dente de ouro, porque estou já com a foto é o bastante “. Atuou na cidade de Itabaiana durante um ano. Diz Cléa, emocionada: “Eu tenho muito orgulho de meu pai pela maneira como viveu, pelo sacerdócio dele demonstrado no exercício da medicina. Foi o homem da minha vida”.

Registra ainda o livro de Dr. João de Brito que seu pai se notabilizou na medicina da Paraíba na área da tisiologia, sendo o pioneiro no Estado na criação e fundação de vários órgãos nesse campo, contado e descrito nessa obra com peculiaridades originais. Realizou curso no Rio de Janeiro, na especialidade de tisiologia, credenciando-o para que, na sua volta, assumisse o Ambulatório Cardoso Fontes, que oferecia serviços de pneumotórax, abreugrafia, imunização da vacina BCG. Foi o primeiro médico tisiologista da Paraíba. Teve oportunidade de criar: O Hospital Clementino Fraga, que devia acolher doentes de cavernas abertas, hemoptoicos e outros serviços; O Pavilhão de “Doenças Infecciosas”; o Hospital Guedes Pereira, o primeiro no gênero no Estado; A “Liga Paraibana contra Tuberculose, a qual se dedicou de corpo e alma. Fundador da Faculdade de Medicina da Paraíba. Intelectual que primava pelo português escorreito, publicou vários trabalhos originais como: Aplicação do pneumoperitônio no Brasil, Combate a terapêutica do azul de metileno, tese de doutorado em 1923, na Bahia, e teve como orientador Miguel Couto. Recebeu uma medalha em reconhecimento aos trabalhos originais como o da esquistossomose no Brasil, por ter sido pioneiro no estudo na Paraíba, em junho de 1918. Possuía trabalhos originais o que o fez membro correspondente da Academia Nacional de Medicina. Além de outros vinte trabalhos publicados.

Cléa fala da vida profissional de seu pai. “Ele foi um dos fundadores da Sociedade Médica da Paraíba, que antigamente situava-se na rua das trincheiras, em frente à antiga Faculdade de Economia, e também da Sociedade dos Escritores Médicos da Paraíba; do Hospital Clementino Fraga, da faculdade de medicina, quando foi cogitado para diretor e professor e não quis, renunciou e quem assumiu, foi Dr. Guilhardo Martins. A Academia de Medicina do Estado da Paraíba, queria homenageá-lo como patrono, porém segundo regimento não podia, porque ele estava vivo. Hoje seu filho, João de Brito de Athayde Moura ocupa a Cadeira nº 27, cujo patrono é Dr, Antônio Cruz Cordeiro Sênior, tomou posse no dia 25/05/1993. Recebeu a medalha, já doente, da Campanha Nacional contra a tuberculose. Ao ligarem para sua residência querendo falar com ele, foi dito que estava doente e acamado, mas tinha uma extensão no quarto e se falaram. Ele ficou limitado, mas o AVC não prejudicou a voz não. Ele disse: “estou recebendo esta honraria em virtude das injustiças sofridas”. Sem poder escrever, ele ditou para Suzana sua irmã, o discurso do que desejava dizer por ocasião da entrega que ocorreu em sua casa, com a presença de familiares e autoridades, como: Clovis Bezerra, governador e Edme Tavares, deputado, que foi quem entregou, no dia 18 de novembro de 1978, a medalha Azevedo de Lima, pelo mérito e reconhecimento do seu trabalho no campo da tisiologia no Estado da Paraíba”.

Em seus relatos Cléa desabafa: “Fui tomar a vacina em uma Unidade de Saúde e lá me deparei com uma pequena placa enferrujada, feia, ao lado de outra, bonita, toda bem incrementada para identificar a Unidade de Saúde. Aquela placa pequenina, descuidada, era destinada a memória de meu pai, cujo prédio foi comprado com a venda da Liga. Não resisti a dor que bateu em meu peito ver retratado ali o descaso e o abandono daquele que lutou e acreditou nos seus sonhos e ideais de médico, comprometido com os mais humildes, totalmente esquecido”. Então contou:” A família doou um terreno em Mandacaru, na época o prefeito era Damásio Franca ele dizia que queria construir um posto de saúde com o nome de papai, então a família fez a doação e quando Ricardo Coutinho assumiu a prefeitura da cidade de João Pessoa, construiu o PSSF e tirou logo o nome de papai do prédio antigo e usou não sei para que… não sabemos qual foi a função que teve e retirou o nome dele e aí, ficou por isso mesmo. Observa-se que hoje a palavra do homem não existe mais. Meu pai dizia: “É minha palavra e acabou-se e se respeitava e pronto”. Os valores hoje são outros que chocam. Os homens tinham palavra, porque eram homens íntegros. Realmente é revoltante. Isso foi uma das coisas que me deixou entristecida. A outra: meu pai construiu a Liga Paraibana contra Tuberculose para atender aos pacientes de alta hospitalar do Hospital Clementino Fraga, e os vindos do interior principalmente os do sertão. Naquele tempo não existia o tratamento ambulatorial, e eles não tinham onde ficar. Os pacientes não bacilíferos achavam que estavam bem e abandonavam o tratamento ou por ignorância ou por falta de oportunidade de continuar o tratamento ambulatorial, porque no interior não existia. Meu pai, sensibilizado com isso, com seu dinheiro e ajuda de amigos conseguiu um patrimônio, comprou uma granja em Gramame, e lá colocava as pacientes mulheres, para continuarem o tratamento ambulatorial. Construiu duas vilas de casas, tinha uma casa no Bessa, um terreno e uma casa por trás da Igreja N. S. da Mãe dos Homens em Tambiá. Resultado: com o passar dos anos ele sentindo-se debilitado e sem mais condições de saúde, já pela idade, de administrar e dirigir a Liga, teve a ideia de entregar ao presidente do Rotary Club, que como ele era tisiologista e achava que estaria em boas mãos para dar continuidade.

Não teve a malícia de fazer como os Guedes Pereira que quando doaram o terreno para a Praça da Independência o Dr. Walfredo Guedes Pereira incluiu uma cláusula: “a praça da independência será praça e se não for utilizado para praça volta para a família”. E no caso, se não fosse mais a Liga de Tuberculose, o terreno deveria ser destinado a uma outra instituição. Hoje não teria mais finalidade e estava superada a existência da Liga, mas seria outra instituição ou para idoso ou dependente químico etc. Ele pensou que eu devia assumir a Liga e hoje arrependo-me amargamente quando não assumi a direção da Liga. Como Assistente Social, com outros profissionais, formaríamos uma equipe multiprofissional e poderíamos ter feito um trabalho muito bom. Achei que iriam dar continuidade. Venderam o patrimônio e disseram que iam construir uma unidade de saúde para carentes. Ficou na intenção.” Cléa, ao falar ficou bastante comovida e decepcionada em ver o esforço do genitor e as realizações de uma vida, doando seu patrimônio, dedicada a uma causa que acreditou e perseguiu serem desfeitos e desaparecerem com as promessas esquecidas. O que a faz amargurada e desacreditar que elas jamais serão concretizadas, foram transformadas em lembranças.

Expõe sobre o relacionamento médico-paciente:” O primeiro aparelho de raio X da Paraíba foi dele, nem os Institutos IAPC, IAPB, IAPTEC tinham. Entendia medicina como um verdadeiro sacerdócio, doava-se muito. Não tinha hora para assistir seus pacientes. Aos clientes que iam a seu consultório, ele dava o filme, o laudo radiológico e a medicação. Terminada a consulta perguntava: “meu filho você tem dinheiro para comer? O paciente respondia: Tenho não doutor. E então tome esse dinheiro, e vá comer agora. Porque não era de vender nada. Dizia minha mãe: “eu não posso misturar os alugueis das minhas casas com o dinheiro de seu pai porque se não a gente vai passar fome. Ele gostava de dar tudo ao povo”. Ele se encontrava com Padre José Coutinho, e este falava: “Lourival, o dinheiro para os meus pobres?”. Ele entregava a carteira e dizia: tira aí Zé.” A vida dele era dar aos outros. Dizendo: “eu já tenho muito está bom demais, já tenho televisor, refrigerador, telefone, carro e casa para que eu quero mais? Eu tenho é que ajudar os outros”. Ele tinha um coração muito grande”.

Continuou: “Nós tínhamos umas casas alugadas na frente da que morávamos, que ficava na esquina da rua desembargador Bôtto com a Walfredo Leal. Então seus pacientes que careciam de maior assistência, ele colocava para morar perto dele, como foi o caso de dona Maria José de Dr. Burity, eles moraram muitos anos, como nossos vizinhos, quando ainda Tarcísio Burity estava no seminário. Ele fazia assim, com pacientes a quem queria bem. Isto, naquela época, em que as pessoas tinham medo da tuberculose e que havia um distanciamento e muitos tabus. Os pacientes não bacilíferos eram levados lá para casa para almoçar conosco. Ele não é mais bacilifero pode ficar conosco, e aqueles pacientes quando saiam do hospital não eram mais bacilifero para terminar o tratamento ambulatorial, colocava lá em casa para cozinhar. Pacientes que saim do hospital e vinham direto lá para casa, as vezes sua mãe relutava; ele afirmava: Eu não sou irresponsável pode deixar na cozinha. Ela está apta.”.

Dr. Lourival não era adepto a festas em clubes e reuniões sociais grandiosas, mas gostava de comemorar e celebrar com seus amigos de coração e familiares, datas e momentos significativos, dentro do aconchego de seu lar. Expressa Cléa: “ Quando veraneava na casa de meu tio Aníbal Moura, na praia de Tambaú, já início do Bessa, vestia o pijama, reunia com os amigos Dr. Oscar de Castro, Dr. Ernesto e iam jogar dama, na casa de Dr. Edrise Vilar, pois suas casas ficavam próximas, principalmente à noite. No dia 29 de junho é o aniversário de Dr. Edrise. Então ia todo o pessoal da minha casa para sua casa deliciar as comidas gostosas que dona Carminha cozinhava muito bem. E no dia 30 de setembro, que era o aniversário de papai, todos também iam lá para casa. Moravam na praia todos juntos Dr. Oscar de Castro, Hélio (irmão de Germana), Edrise, juntavam-se para fazer susto ao mulherio. Na praia eram mais unidos e, na cidade, só nos almoços de final de semana, que se davam por rodizio na casa de cada um. Era uma felicidade, pelo ambiente e pelos amigos.

Ele teve um AVC (acidente vascular cerebral), passou 7 anos e meio acamado e sondado, o que comprometeu um lado do corpo que ficou morto, e assim permaneceu, mas nunca reclamou, do seu calvário, sempre resignado e sublimando aquela situação. Falava só perguntando como estava a sonda? Naquele tempo, há mais de quarenta anos, não havia fisioterapeuta, porque o tratamento não era como o de hoje. E foi assim até o final da vida. Faleceu em 14 de dezembro de 1982. A sua genitora, viúva ficou com uma pensão vergonhosa. Ele era do INSS, credenciado, porque tinha os aparelhos, mas nunca foi funcionário. Era do Estado e teve uma aposentadoria pequena. A sua mãe já velhinha, com cem anos, dizia: “Minha filha, se eu fosse viver da medicina do seu pai vocês todos estavam me sustentando”. Eu falava: “Mamãe não tinha problema”. Ela retrucava: “Cada um tem seus compromissos. Graças a Deus tenho minhas casas e posso me sustentar, se não ia precisar de vocês”. Tenho certeza que deve estar em um bom lugar porque foi um homem bom na expressão da palavra”.

Constata-se que o Dr. Lourival Gouveia de Moura deixou um legado, um bem que não sabemos aquilatar o valor em termos do que foi construído durante sua trajetória terrena e eternizada, fazendo-se presente, reverberando nas pessoas que receberam os benefícios decorrentes das lições, aprendizados, tratamentos e ações generosas que sempre estavam na disposição de ajudar. Identificamos o Dr. Lourival como pessoa e profissional de grande quilate, rara no mundo contemporâneo, principalmente no trato com seus pacientes, onde o principal objetivo era a sua cura independente de honorários que viessem lhe render. Até porque o contexto em que atuava não lhe proporcionava as condições necessárias. Tinha de criá-las, com seus próprios recursos, e o fez. Dava tudo de si, dedicação integral, às vezes saindo do conforto da intimidade de seu lar e mesclando o ser amigo e ser médico. Constatei um homem desapegado às coisas materiais, porque entendia que elas passam muito rápido e não tem valor algum comparado com que você pode fazer para tocar a alma e o sentimento das pessoas. Assim, foi sua prática. Sujeito humano extraordinário, que não só dominou os conhecimentos da medicina que exercia, mas o mundo das letras. Era exímio no português, no falar e no escrever. Ele será motivo de inspiração e exemplo para aqueles que desejem exercer a medicina. Foi o médico de antigamente.

Obrigado Lourival, sua vida valeu!

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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