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Médico. Psicoterapeuta. Doutor em Psiquiatria e Diretor do Centro de Ciências Médicas da Universidade Federal da Paraíba. Contato: [email protected]

Sem patente e sem dinheiro

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publicado em 11/08/2020 às 07h00
atualizado em 10/08/2020 às 16h58

Disseram que haveria um novo normal. Se o conceito de normal já era complicado para mim, imagina um “Novo normal”. Normal remete-nos a conflitos vários. Na sua etimologia latina, normalis seria algo como, de acordo com as medidas ou de acordo com as regras. Se uns gostam de seguir regras, outros se propõem a quebrá-las. É confusão! Se não há consenso sobre o que é ou não normal, imagina encarar um normal novo. Não acho que tenhamos mudado.

Depois de cem mil mortos, continuam-se procurando os culpados. São muitas estórias. De Mandetta que odiava o Capitão, que odiava prefeitos e governadores, que não amavam o povo, que, em parte, tinha um mito; em outra, um mitomaníaco. Todos arbitrados pelos supra luminares que, muito ocupados, esquivaram-se. Resumo: continuamos pior do que quando começamos em março: sem lenço e sem São João. No carnaval, só vão sair os blocos dos papangus e dos sujos.

Vou lhes contar a história de um senhorzinho nascido na Polônia em 1906. Estudioso de doenças infecciosas, desmentiu a teoria de que o contágio se dava pelo nariz, e apontou o trato digestivo como porta de entrada. Contestou uma vacina feita a partir de vírus mortos e aplicada por injeção . Juntou-se a cientistas soviéticos, mexicanos e holandeses, e fabricou uma vacina oral, aceita oficialmente nos Estados Unidos em 1960. Seu maior gesto? Não patenteou a vacina, renunciando aos ganhos que teria, para que todos, em qualquer parte do planeta, pudessem fabricá-la. A vida de crianças muito acima do dinheiro!

Não ficou em laboratórios. Veio ao Brasil algumas vezes, e até se casou com uma brasileira. Ajudou em certas campanhas, mas, aqui, fracassou. O motivo? Pelo seu posicionamento de que o Brasil precisaria de um “programa nacional de vacinação contra a poliomielite, organizado de forma altamente eficiente e realizado anualmente”. E pontuou: “No entanto, esse trabalho continua sendo impedido por entraves burocráticos e funcionários não confiáveis.” Entravou na burocracia! Não é tudo tão igual?

Eu tiraria algumas lições do nosso bom velhinho Albert Sabin (foto) . A teoria prevalente no instante, pode não ser a verdadeira. Devemos ser menos arrogantes no que afirmamos. E mais: a primeira vacina pode não ser a melhor, em especial, feita às pressas, e sem os passos rigorosos que só o tempo permite percorrer. Sozinho, ninguém é tão eficaz (nem feliz!). É preciso , humildemente, aproximar saberes e sabedores. O objetivo último de um cientista, não é a riqueza, mas a realização, a descoberta. Se era para erradicar a poliomielite e salvar milhões de crianças, esse seria o seu fim. Ele assim o fez.

Estamos em agosto? Foi no dia 26 que nasceu A. Sabin. Em sua homenagem, pergunto: Se não aprendemos com exemplo tão grandioso, aprenderemos alguma coisa nova com tantos exemplos ignóbeis, como temos assistido nessa pandemia de 2020? Eu quero o velho normal de Sabin, sem patente, sem poder e sem dinheiro, mas salvando todas as vidas que ainda existam. As nossas também!

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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