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Tragédia da Lagoa em João Pessoa completa 40 anos

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publicado em 24/08/2015 às 12h23
atualizado em 24/08/2015 às 12h55

João Pessoa, domingo, 24 de agosto de 1975, 17h15. O sol desaparecia atrás de alguns prédios e das palmeiras imperiais da Lagoa do Parque Solon de Lucena, no Centro da cidade, onde o Exército Brasileiro promovia, desde o início da semana, uma exposição alusiva ao Dia do Soldado- 25 de agosto- e proporcionava passeios de 20 minutos pelo espelho d’água em um barco vindo de Natal, com capacidade para 60 pessoas.

Testemunhas da época dizem que, na última viagem daquele dia, o barco levava cerca de 200 pessoas. Foi uma tragédia. Minutos depois da partida, o barco começou a afundar nas águas poluídas e escuras da Lagoa. O desespero tomou conta da 200 pessoas bordo e das centenas que não puderam embarcar e ficaram à espera de seus parentes. Quem ficou fora do passeio assistiu tudo da calçada. Ouviu os gritos desesperados de socorro sem nada poder fazer. Pelo menos 35 pessoas morreram afogadas, a maioria crianças e adolescentes. Muitas das pessoas que se salvaram foram hospitalizadas.

Naquele terrível fim de tarde e início de noite, a população recebeu atônita, pela Rádio Tabajara, a notícia da tragédia. Quem deu a notícia foi o jornalista Gilvan de Brito, que também era jornalista do Correio e fez uma detalhada cobertura de tudo o que ele presenciou naquela tarde.

Gilvan de Brito estava na fila da morte com a esposa e os três filhos pequenos, que insistiram para entrar no barco, apesar da discordância dele, que se sentiu aliviado depois que o barco partiu e eles ficaram. Hoje, aos 74 anos, Gilvan de Brito, que fez a cobertura para o Correio e para o Diário de Pernambuco, ainda se emociona quando lembra da tragédia, que completa 40 anos  amanhã.

No livro “Opus Diaboli”, que significa Obra do Diabo, em português, Gilvan de Brito conta que cismou em não entrar naquele barco com a família por dois motivos. Primeiro, não simpatizava com o que ele chama de “carreira das armas”, muito menos com o regime militar, cuja ditadura instalada em 1964, perseguia jornalistas, prendia, torturava, matava e cometia toda sorte de atrocidades contra quem se atrevesse a discordar dos sistema vigente. O segundo motivo fora um pesadelo que Gilvan de Brito teve na noite anterior, que o deixou atormentado e pensativo, o dia todo. No pesadelo, segundo ele, havia pessoas mortas.

O jornalista diz que só foi até à Lagoa por insistência da esposa (Auta) e dos três filhos (Junior, 10 anos; Denyse, 9 anos; e Louis Hélvio, 6 anos) e que, após presenciar o barco afundando, de imediato correu para o carro estacionado nas proximidades da Lagoa, na Rua Getúlio Vargas, entrou no veículo e se dirigiu na contramão, pegando a Avenida Pedro II, até à sede da Rádio Tabajara, na Rua Rodrigues de Aquino. A rádio que transmitia um jogo entre o Campinense e o CSA de Alagoas, direto de Campina Grande. No estúdio da emissora, encontrou o radialista Geraldo Cavalcanti.

“Preciso falar agora mesmo”, disse Gilvan de Brito a Geraldo Cavalcanti, que, de imediato, interrompeu a transmissão do jogo para que a notícia fosse dada. Gilvan de Brito assim falou: “Desculpe a interrupção do jogo, mas uma informação que não pode deixar de ser tr4ansmitida com a máxima urgência: Durante as comemorações da Semana do Exército, um barco vem fazendo regularmente passeios com crianças e adultos na Lagoa do Parque Solon de Lucena. Ocorre que, na viagem iniciada há pouco, o barco começou a afundar com dezenas de crianças e adultos. Ao que parece, o excesso de lotação está levando o barco pára o fundo da Lagoa”.

E continuou Gilvan de Brito: “Pelo motivo, quero chamar a atenção dos integrantes do Corpo de Bombeiros e de todas as pessoas que saibam nadar, ou que possuam bóias e objetos inflados, que sigam imediatamente para a Lagoa, a fim de salvarem as vidas de mais de uma centena de crianças que estão afundando”.

“Repito: o barco que realiza passeios com crianças na Lagoa está afundando n este momento. Chamo a atenção dos bombeiros e de pessoas que possam ajudar de alguma forma, que se encaminhem imediatamente para a Lagoa a fim de salvarem vidas que se debatem nas águas. O barco encontra-se no ponto mais profundo, entre a fonte luminosa e a borda da lagoa, próximo à Rua Padre Meira”, concluiu. Em seguida, retornou para a Lagoa, onde encontrou milhares de pessoas desesperadas.

“Ainda se podia ver as pessoas sobre o barco, que não afundara totalmente. Mas já se as viam algumas apenas do joelho para cima. Pais empunhando crianças para o alto. Adultos e crianças maiores ainda se encontravam no que restava do barco meio afundado. E aos poucos, estes foram desaparecendo com as que ficaram se debatendo nas águas. Era o caos”, narra Gilvan no livro.

Segundo ele, as pessoas foram tomadas pelo desespero em volta da Lagoa, por se tornarem impotentes “para esboçar qualquer ação nas águas, temendo também sucumbirem com as vítimas”. “Então começou a chegar o socorro dos bombeiros. Pessoas que ouviam a transmissão do jogo (pela Tabajara) tambérm se apresentavam conduzindo boioas e outros opbjetos flutuantes”, frisa Gilvan de Brito no livro.

Adelson Barbosa (Jornal Correio da Paraíba)

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