João Pessoa, 24 de junho de 2025 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Escutar parece simples, mas é um dos maiores desafios da vida moderna. No meio da correria, da ansiedade por responder rápido, da vontade de mostrar que sabemos, esquecemos o essencial: ouvir. E ouvir de verdade. Escutar com presença, com empatia, com o coração aberto. A maioria das conversas hoje se parece mais com monólogos alternados do que com trocas reais. Cada um esperando sua vez de falar, sem realmente acolher o que o outro está dizendo.
A comunicação não começa na fala, começa na escuta. E é isso que a maioria de nós ignora. Quando alguém nos conta algo importante, costumamos interromper, julgar, dar conselhos antes mesmo de entender o que está sendo dito. Isso porque, muitas vezes, escutamos com pressa ou já armados com respostas prontas. O problema é que essa escuta apressada gera ruído, desconexão e, muitas vezes, mágoa. A pessoa sente que não foi ouvida, que sua dor, sua dúvida ou sua alegria não tiveram espaço.
A escuta de verdade começa quando tiramos os filtros. Quando paramos de achar que já sabemos o que o outro vai dizer. Quando deixamos de lado o “eu no centro” e passamos a considerar a perspectiva do outro com interesse genuíno. Isso não significa concordar com tudo, mas sim estar disposto a compreender, mesmo que pensemos diferente. Uma boa escuta não quer vencer, quer entender.
Nos diálogos mais difíceis, isso é ainda mais importante. Quando escutamos sem julgamento, a outra pessoa se sente acolhida, e a conversa muda de tom. Sai da defensiva e entra no terreno do entendimento. Thomas Brieu, especialista em escutatória e storytelling, explica que só conseguimos realmente escutar se esvaziarmos a mente do excesso de julgamentos, distrações e urgências. É preciso “desocupar as gavetas”, como ele diz, para que haja espaço para o outro entrar.
Outro ponto importante é o uso da palavra certa. Quando dizemos “mas”, por exemplo, anulamos tudo o que veio antes. Se eu digo “Gosto muito de você, mas…” já criei um conflito. Se troco por “e”, o efeito é totalmente diferente: “Gosto muito de você e gostaria de conversar sobre algo que me incomodou”. Parece detalhe, mas muda tudo. As palavras têm peso, tom e direção. E a forma como usamos esses elementos define se estamos construindo pontes ou levantando muros.
Na escuta, o corpo também fala. O olhar que foca, o gesto que acolhe, o silêncio que permite. Às vezes, a melhor resposta é apenas um “entendo”. Em outras, repetir com suas próprias palavras o que o outro acabou de dizer pode demonstrar que você realmente se conectou. E isso gera confiança, vínculo, proximidade. Quando alguém se sente escutado, se sente validado. E isso é mais raro e valioso do que se imagina.
Escutar é um gesto de amor, de humildade e de presença. É abrir mão do controle da conversa para mergulhar no universo do outro. É deixar de lado a necessidade de estar certo para dar espaço à vulnerabilidade da troca. Muitas brigas, tanto no trabalho quanto em casa, começam por falhas de escuta. E muitas reconciliações começam exatamente no momento em que alguém decide, enfim, ouvir com atenção.
Nosso cérebro primitivo, o sistema límbico, é acionado toda vez que nos sentimos atacados. Por isso, a escuta agressiva aquela que já vem com julgamento ou ironia faz o outro se fechar, fugir ou revidar. Em vez de comunicação, viramos um campo de batalha. Já uma escuta verdadeira acalma, abre espaço para o diálogo e transforma o clima da conversa.
Se queremos relações mais saudáveis, mais produtivas e mais leves, precisamos escutar mais, e melhor. Porque toda boa conversa começa em quem sabe calar com intenção. E, no silêncio atento, brotam as palavras que realmente fazem sentido.
Você tem escutado para entender ou apenas para responder?
* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB
SÃO JOÃO NA 'HORA H' - 20/06/2025