João Pessoa, 23 de junho de 2025 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Participei no dia 13 de junho de 2025 do Chá das Avós – Year3, a convite de minha neta Letícia de nove anos, considerado como momento especial pelo Colégio Maple Bear. Conforme a informação esse encontro faz parte de uma atividade pedagógica da disciplina português, procedimento metodológico ministrado pela professora Camila Santiago. Achei o acontecimento muito interessante, pois a mestra tem o intuito de fazer a transposição didática do conceito linha do tempo – presente e passado, construindo atividades pedagógicas que possam ser mais accessíveis ao entendimento e compreensão dos alunos. Feito de forma concreta e viva. Para tal objetivo planejou várias unidades diversificadas que foram se desenrolando paulatinamente durante o período programático, que permite aos discentes irem internalizando e se apropriando da abstração do significado do tempo no passado e no presente. Isto executado no espaço didático de forma lúdica e prazerosa que deixa as crianças à vontade e libertas para tomarem iniciativas próprias, personalizando individualmente o aprendizado dentro da sua realidade individual-social e, dessa maneira, efetivando a aprendizagem, integrando os domínios da taxionomia – cognitivo, psicomotor e o afetivo, (Bejamin Bloom 1956).
O Colégio Maple Bear, de origem canadense oferece um projeto político pedagógico centrado na “ideia do universo lúdico e mágico associado à infância, onde a imaginação e a criatividade florescem”. Segue um padrão internacional oferecendo a educação bilíngue do inglês e português, em que o inglês é uma língua integrada em todas as áreas do conhecimento e não uma disciplina isolada. Segundo documentos a que tive acesso, a proposta é baseada em Projetos (PBL): Ao desenvolver habilidades com criatividade e autonomia, estimula o desenvolvimento do pensamento crítico e a autoexpressão nos alunos. Pretende preparar os alunos para o futuro, promovendo habilidades socioemocionais como líderes para enfrentarem os desafios acadêmicos e profissionais do século XXI. O colégio segue todas as normas disciplinares do ensino emitidas pelo Ministério de Educação do Brasil e do Canadá. Em João Pessoa a escola existe desde o ano 2012, com a jornada escolar de cinco horas diárias e mil horas anuais, distribuídas em duzentos dias letivos.
Procurei contextualizar o colégio, todavia não é objetivo analisar o seu projeto político pedagógico e sim prender-me especificamente a atuação da minha neta Leticia nessa atividade pedagógica de que foi partícipe. Ao analisá-la faço com o olhar de docente que fui como professora de Didática da UFPB, do Departamento de Metodologia da Educação. Até porque desconheço a linha científica epistemológica adotada pelo Colégio Maple Bear. Como docente, estudando os teóricos em aprendizagem fui adepta em minhas aulas aos princípios de aprendizagem preconizados por Lev Semionovitch Vygotsky (1896- 1934). Psicólogo, proponente da Psicologia histórico-cultural, entendia que o desenvolvimento intelectual das crianças ocorre em função das interações sociais e condições de vida (Psicologia pedagógica. Porto Alegre: Artmed 2003). Vygotsky se opunha aos princípios rígidos do psicólogo/biólogo Jean Piaget que traçava o desenvolvimento da aprendizagem da criança em quatro estágios cognitivos; sensório –motor, pré-operacional, concreto e operacional formal. Vygotsky dizia que o desenvolvimento da aprendizagem independe de estágios biológicos e sim das necessidades e das interações sociais em que a criança é situada e, para isto, cita exemplos onde a estimulação face a necessidade sentida pela criança induz a aprendizagem independente do estágio biológico em que ela se encontra. Eu tive conhecimento de experiência que comprova isto. Numa escola daqui de João Pessoa, situada próximo ao lixão do Roger, os seus alunos apresentavam lógica matemática mais avançada que outra escola situada na periferia da Universidade. Por que? As crianças do Baixo Roger catavam objetos no lixo e sabiam sobre: peso, valor, troca, custo, natureza do objeto etc. Não tinham a linguagem erudita da matemática, mas sabiam resolver os problemas quando estes se apresentavam, o que não ocorria com as crianças da escola do Castelo Branco. As crianças do baixo Roger apresentavam a logicidade e a racionalidade matemática mais avançada porque faziam em decorrência da necessidade de sobrevivência. Daí prova a teoria de Vygotsky que a aprendizagem é mais eficiente levando em consideração o contexto ambiental – social e as relações estabelecidas. Digo isto para valorizar a atividade da mestra Camila que saiu da mesmice exclusiva da aula teórica e partiu para empregar um ensino mais criativo e motivador, capaz e eficiente da aprendizagem de conceitos, partindo do abstrato para o concreto, executando a transposição didática.
Quais foram as atividades de Letícia para se apropriar do conceito de tempo presente e passado? Disse-me Andrea sua mãe, que ela passou um bom tempo preparando as tarefas escolares para apresentar no dia do Chá das Avós. Lembro que um dia chegou aqui em casa dizendo que queria me entrevistar. Com uma série de perguntas abertas procurou conhecer minha vida desde criança até os dias atuais. Havia momentos que achava graça. E você fazia assim voinha? Era assim? Hoje dizia ela: é completamente diferente. Eu dizia: com a evolução do tempo as coisas vão mudando. Foi perguntado a Letícia uma coisa ou fato que ela lembra do passado e que tinha em sua memória e que ela guarda até hoje? Ela devia escrever em uma moeda de ouro simbolicamente feita de cartolina amarela e devia guardar como uma coisa importante de sua vida, ela escreveu: A foto da primeira vez que eu comecei a andar. Foi solicitada pela professora que escrevesse uma carta para a avó e que devia expressar o seu sentimento para com ela. Ela escreveu no dia 02 de junho de 2025.
Oi, voinha Regina
Estou com muitas saudades, quero almoçar com você no Shopping de novo. Estou sentindo muito sua falta, espero de ver e almoçar com você no próximo sábado ou domingo como agente fazia. Você aceita?
Tchau, tchau, te amo!
Leticia Targino
Outra atividade foi construir a árvore genealógica da família. Ela montou direitinho, partindo dos pais, dividiu os ancestrais do lado materno e do lado paterno, colocando as fotos, formando assim um painel, em cartolina, muito interessante. Elaborou um cenário com pessoas com roupas mais atualizadas e com outras usando trajes de épocas passadas, mostrando a evolução que sofreu o vestuário ao longo do tempo. Outra atividade foi demonstrar os passos do progresso dos transportes e a escolhida por Leticia foi evidenciar o desenvolvimento do transporte aquático e o fez em várias etapas, ilustrando com desenhos transparentes segundo o seu conhecimento de antigamente: desenhou o homem em cima de uma tábua ou toco de pau que boiasse segurando outro pau imitando um remo que permitia locomover-se, ir para onde queria e pescar para arranjar o sustento de sua família. Num outro desenho ela fez uma canoa que poderia locomover-se carregando mais pessoas; na terceira figura coloca um navio tipo veleiro que não usava os remos mas utilizava a ajuda dos ventos e permitia as pessoas viajarem para outros lugares. E por último, veio um grande navio transatlântico, enorme, que podia carregar até mais de mil pessoas transportando-as para lugares distantes, citando que não precisava nem de remo nem de vento, mas de motor movido a eletricidade e que movimentava o navio com grande rapidez.
O momento presencial do Chá das Avós inicia-se com a apresentação das crianças cantando a música de Lulu Santos – Como uma onda, nada do que foi será, De novo do jeito que já foi um dia, tudo passa, tudo passará, A vida vem em onda…. Escolha da música própria e adaptada ao tema que o momento didático tinha como objetivo. Trabalhar a evolução do tempo com enfoque no presente e no passado. Após a apresentação, as crianças, com as avós, iam mostrando e explicando oralmente os cartazes que exibiam suas tarefas,
Ao participar dessa atividade como avó de Letícia quero congratular-me com a docente Camila por sua criatividade ao trabalhar com as crianças o conceito de tempo que, para elas, que estão iniciando suas vidas, os vêm tão distante e tão abstrato, e da maneira metodológica que foi construído conseguiu fazer a transposição didática. O professor é esse sujeito que, através de procedimentos pedagógicos, oportuniza aos alunos alcançarem o entendimento e a compreensão do difícil e que eles, sozinhos, seriam incapazes de atingir. Desmistificou o abstrato, tornando-o real e fácil compreendê-lo alcançando a verdadeira função do professor – educador. Ele só ensina se os alunos aprendem. Parabéns para Camila!
Profª. Emérita da UFPB e membro da Academia Feminina de Letras e Artes da Paraíba (AFLAP
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