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Francisco Leite Duarte é advogado tributarista, auditor-fiscal da Receita Federal (aposentado), professor de Direito Tributário e Administrativo na Universidade Estadual da Paraíba, doutor em direitos humanos e desenvolvimento. Na Literatura, publicou os romances “A vovó é louca” e “O Pequeno Davi”, uma coletânea de contos chamada “Crimes de agosto”, um livro de memórias (“Os longos olhos da espera”), e dois livros de crônicas.

O X da questão

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publicado em 05/04/2024 ás 07h00
atualizado em 04/04/2024 ás 18h37

Há um movimento decorrente dos novos tempos que avança demasiadamente sobre o vocabulário, encurtando-o, escravizando-o, reduzindo-o, empobrecendo-o, restringindo a capacidade de pensamento que se realiza, indubitavelmente, à proporção da riqueza vocabular.

Não falo da necessidade de clareza e simplicidade na escrita. Isso é necessário e belo, por suposto. Contraria-me essa tendência que caminha avassaladora sobre a linguagem, castrando-a e que se irradia por diversos  segmentos da cultura.

Também não defendo a escrita empolada, palavras estrambóticas dispostas inoportunas e impropriamente, como aquelas malditas peças do juridiquês inútil ou o retorno da linguagem rebuscada e confusa do Barroco. Alto lá.

Na música, as letras são paupérrimas, melodias piores, ritmos deficientes. Diga-o bem certas músicas miadas, monotemáticas, repetitivas e maçantes. Na Literatura, a coisa está  mais feia. Os redatores de texto, como o word, por exemplo, assediam os escritores, propondo um vocabulário rasteiro. Em breve, a inteligência artificial viciada pela linguagem do tic toc e de outras redes sociais irá se compor em um universo de um pouco mais de 500 palavras e olhe lá.

Veja-se que há redes sociais que só admitem 120 caracteres para a enunciação da mensagem.  Com poucas palavras, menos ideias, menos mundo, maior facilidade de dominação, a vertigem da velocidade que não aceita o pensamento crítico.

Esse é o X da questão: chegará o tempo em que as pessoas não terão palavras para expressar suas emoções. Nesse momento, todos estarão com os seus olhos bem pregados admirando o nada e o inútil, roboticamente escravizados.

Trata-se de um movimento amplo, o império do digital, a compressão do tempo. Privilegia-se textos curtos, livros de poucas páginas, as mesmas palavras, as construções linguísticas forjadas na informalidade. A isso chamam simplicidade.

Paradoxo da modernidade. Busca-se reduzir a complexidade pela criação de complexidade maior. Evita-se tudo que for palavras que excedam ao conhecimento mediano com seu universo reduzidíssimo de palavras para compor a vida em mundo cada vez mais complexo e contingente. Que loucura!

@professorchicoleite

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