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Professora Emérita da UFPB e membro da Academia Feminina de Letras e Artes da Paraíba (AFLAP]. E-mail: [email protected]

A morte de um irmão amado                  

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publicado em 03/11/2023 às 07h00
atualizado em 02/11/2023 às 17h05

Escrevo sobre as coisas da vida e estou a dizer dos fatos que acontecem no dia a dia das pessoas que representam atividades incessantes do ser que as impulsionam e as fazem caminhar. São as realizações. É o tempo de existência do nascimento até a morte. Ao aprofundar esse tema, sempre me ocorre uma sensação que vagamos com perguntas sem respostas. Explicações que não encontram justificativas. Batem os sentimentos do vazio, de dor e de sofrimento, que ferem e desnudam a alma, da incerteza em aceitar o inaceitável. Volta-se à realidade e constata-se a finitude do homem. Diante do imponderável não há como buscar razões.  Reluto em falar da morte, mas constato que ela deve ser registrada principalmente quando necessitamos ressaltar e reavivar a memória de alguém a quem desejamos homenagear para fazer justiça e testemunhar seus feitos e o legado deixado para a posteridade, imortalizando-o. É o que faço agora com profunda tristeza notificar a morte do amigo e cunhado de meu irmão, Bráulio Pereira Lins, com 74 anos, ocorrido em Brasília, dia 28 de agosto próximo passado. Ele deixa a esposa, Isolda Moura Lins, os filhos Bráulio Pereira Lins Junior, Estefany Lins e Alexandre Moura Lins e quatro netos, Artur, Thais, Gabriel e Alexandre.

Conheci Bráulio através de Gumercindo, e de meu esposo Itapuan Bôtto Targino que na época era diretor da antiga Escola Técnica Federal. Bráulio era aluno do Curso de Mecânica destacando-se como aluno brilhante. Foi monitor elogiado e reconhecido por todos os docentes. Realizou Curso de Licenciatura de Curta duração. Contratado como professor auxiliar da Área de Mecânica, chegou a Coordenador do Curso e Diretor da Escola Técnica por quatro anos, de 1991 a 1995, onde consolidou as iniciativas existentes e criou programas de incentivo à cultura, a atividades artísticas e desportivas e perseguiu melhorias contínuas de qualidade de ensino. Merece destaque a implantação da informatização da instituição, que no início dos anos 1990 já se mostrava necessária para atender a demanda do desenvolvimento para que se desprezassem os processos analógicos e se adotassem as tecnologias da cibercultura informática. Isto tanto no âmbito administrativo, buscando construir estrutura de apoio que viabilizasse mais rapidez e eficiência aos processos, como também no âmbito didático pedagógico, procurando o aperfeiçoamento do ensino com mais rendimento e eficácia. Na área social ocupou a presidência, em 1979, da Associação dos Servidores do IFPB. Notabilizou-se como administrador escolar, com repercussão em nível nacional. Ao se aposentar, ainda moço, e com larga experiência exitosa, foi convidado a trabalhar no Ministério da Educação e Cultura, em Brasília, como Assessor e Coordenador do Programa de Expansão da Educação Profissional no Brasil – PROEP, que tinha o apoio do BID.

Foi diretor, por vários anos, da Faculdade de Ciências e Tecnologia – FACITEC, Instituição de Ensino Superior originária de Minas Gerais que se tornou referência acadêmica no Distrito Federal, com estrutura das mais modernas, integrada ao mercado de trabalho. Com um corpo docente dos mais qualificados a FACITEC obteve para seus cursos o conceito máximo do MEC. O êxito obtido deve-se em parte ao denodo, desempenho e eficiência administrativa empreendida pelo professor Bráulio, consequência da sua atuação para alcançar o grau de excelência de ensino, hoje inteiramente consolidada. Depois de vários anos atuando afastou-se quando foi acometido de um câncer que durou 18 anos, que o impediu de continuar suas atividades no ritmo costumeiro, pois já não conseguia desenvolver-se como desejava e estava acostumado a desempenhar suas atividades. Mas continuou dando assessoria e aconselhamento a Instituição. Todos os dirigentes o respeitavam e reconheciam seu trabalho.

Primeiro membro da família a fixar-se em Brasília, incentivou sobrinhos e parentes a morarem na capital federal, dando-lhes apoio logístico em sua adaptação. Hoje estão casados, constituíram família. São unanimes em afirmar: “Tio Bráulio foi mesmo que um pai para nós”. O traço de humanista ele trazia em sua personalidade, o que demonstrava ao tratar com alunos, colegas e pessoas mais humildes. Era rígido e disciplinado para cumprir com a competência pedagógica cobrada pela Instituição. Extremamente humano sabia ser solicito quando chamado a resolver problemas. Adotava uma postura tranquila e serena. Isto é tão verdadeiro que na família surgia como líder conciliador e orientador, o que foi constatado após o seu falecimento pelos depoimentos  prestados, como o do Governador do Estado, João Azevedo Lins, seu irmão, bastante emocionado, assim se referiu: “Hoje perdi a minha referência maior de dignidade, caráter, honestidade e solidariedade, se foi meu herói, meu super-herói, ninguém foi mais valente do que ele, ninguém foi mais corajoso, ninguém amou a vida tanto quanto ele, ninguém se dedicou a fazer o bem como ele; lutou dezoito anos contra uma doença que para muitos seria apenas a luta de alguns meses, derrotou ano após ano as limitações impostas pela doença; renascia após cada crise e levantava após cada queda. Um gigante que deixa um exemplo de coragem e superação. Vá meu irmão, amigo e conselheiro, Deus lhe receberá com uma grande festa, como merecem todos os heróis. Pobre de nós que perdemos sua companhia, que não teremos mais o seu sorriso e o seu abraço. Estou órfão mais uma vez”.

Sua irmã Janete Lins Rodriguez assim se pronunciou em sua fala na missa em sufrágio de sua alma: Mensagem a um amado irmão.

Amados irmãos e irmãs em Cristo. Escrevi uma mensagem que irei compartilhar com vocês, pela necessidade que senti no meu coração de falar sobre Bráulio. Ao nos conceder a vida, Nosso Deus, nos dá o seu dom, mas, a nós, caberá desenvolvê-lo, aperfeiçoá-lo, tornando-nos autores de nossas próprias existências. Por conseguinte, precisamos fazer escolhas certas, superar obstáculos para que nos tornemos dignos da criação divina. Contarei a vocês um pouco do caminhar pelo mundo, de Bráulio Pereira Lins, e de como ele via as pessoas através dos seus sentimentos e necessidades. Impossível seria, nesse momento, registrar todas as manifestações de solidariedade, de testemunhos recebidos nas últimas horas, pela família. Socializarei com vocês apenas duas: – Diante do seu inerte corpo, naquela capela de velórios, um rapaz chamado José, que entre lágrimas, emocionou a todos, afirmando em alta voz: que abaixo de Deus, tudo na sua vida, devia a Bráulio pois, segundo ele, ao chegar em João Pessoa vindo de Feira de Santana-BA e, buscando a antiga Escola Técnica Federal da Paraíba, nada possuía, além da vontade de realizar um curso profissionalizante. E foi, nosso irmão Bráulio, que deu um lugar para ele morar, saciou sua fome, e posteriormente, uma bolsa de estudos que possibilitou àquele jovem seguir no curso técnico. Tempos depois, José conseguiu uma boa oferta de trabalho em Brasília e, quis o destino, que os dois se reencontrassem na oficina do Clube do Puma de Brasília, local próximo onde ele morava. A partir de então, fortaleceram essa amizade, misturada com gratidão.  Uma segunda fala, veio do ex-aluno Jurandir que assim postou nas redes sociais: “nossos heróis estão “se indo”. Encantam-se no espaço. Deixam uma brisa a lembrar sua passagem aqui na Terra”…e continua tecendo lindos comentários…

Relatos sobre esse homem, chamado Bráulio, foram diversos. Destaquei apenas dois que mais me tocaram ao coração e os que demonstraram também quanto foi grande sua alma e sua sensibilidade com o sofrimento dos outros. Testemunhei como irmã o excelente filho, pai e avô que foi. Construiu uma linda família. Casado com Isolda Moura Lins, com três filhos: Bráulio Júnior, Alexandre e Estefânia e quatro netos: Arthur, Thaís Gabriel e Alexandre Filho. Viveu com honradez, solidariedade e união.

Merece um registro que considero de grande importância – o fato de Bráulio sentir prazer em acolher em seu próprio lar, familiares que por força do destino foram morar em Brasília. Os meus três filhos gozaram desse privilégio, inclusive meu genro, Alexandre que, ao ser aprovado em concurso em Brasília, foi inicialmente para um hotel e ele, ao saber, foi buscá-lo para sua casa. Todos nutrem muito carinho por ele, pelo tratamento paternal que sempre dedicou a todos.

Sua preocupação com o próximo acompanhou seu livre arbítrio enquanto viveu. Amava a vida como ninguém e caminhou pela vida enxergando as pessoas.

Deus o levou, Amado Bráulio e aqui seguiremos para testemunhar a toda gente, o seu exemplo de amor ao próximo, de valentia e de coragem, tal qual como a que demonstrou ao enfrentar o mal que lhe acometeu. Nos emocionávamos a conformação e a resignação com que aceitou e lutou contra a doença. Nunca reclamou ou blasfemou.

Siga, irmão amado no seu caminho de luz pois temos a certeza de que Deus te recebeu como herói. E aqui, permaneceremos aguardando a ressurreição para nos abraçarmos novamente.  Sua irmã, Janete!

No dia de sua morte, 28 de agosto de 2023, foi decretado luto oficial pelo Instituto Federal da Paraíba – IFPB por três dias. Foi determinada a suspensão das atividades, em todas suas unidades. O IFPB emitiu a seguinte nota: “É com pesar que o Campus João Pessoa informa à comunidade o falecimento do professor Bráulio Pereira Lins, que foi diretor da então Escola Técnica Federal da Paraíba no período de 1991 a 1995. Professor da área de Mecânica, apaixonado por carros antigos e colecionador, o ex-gestor faleceu na noite desta segunda-feira (28), em Brasília, depois de travar uma luta contra um câncer. Professor Bráulio Pereira era irmão do governador da Paraíba, João Azevedo. O Campus João Pessoa reconhece a dedicação e o trabalho do professor Bráulio para com a comunidade e se solidariza com todos os familiares e entes queridos, compartilhando os mais sinceros sentimentos para com todos”.

Autoridades se manifestaram na área política: A Assembleia Legislativa da Paraíba e a Câmara Municipal de João Pessoa emitiram notas de pesar pela morte do professor Bráulio. Expondo que era professor aposentado do IFPB, era possuidor de outras qualidades como a colecionador apaixonado por carros antigos. Na área educacional pronunciaram-se   a reitora Mary Roberta Meira Marinho que enalteceu o legado do professor Bráulio, assim se expressando: “Abriu as portas da instituição para comunidade externa e contribuiu para a consolidação e o avanço da educação tecnológica em nossa região”.  O ex-diretor Itapuan Bôtto Targino assim se referiu, reforçando a personalidade de Bráulio Lins: “É um exemplo de homem público, fez carreira dentro do próprio educandário. Foi monitor, auxiliar docente, professor, diretor de ensino, diretor administrativo e Diretor Geral. Competente, idealista, Bráulio deixa um legado de trabalho e compromisso com a causa da educação em nosso estado”. Exemplo de homem público Bráulio Pereira Lins foi um grande colaborador.  Muito justas as homenagens feitas pelo IFPB”. Outro Ex-Diretor, Almiro de Sá Ferreira, expressou; “ Lembro o papel de Bráulio ao “entrelaçar” duas características que entendo como importantes para formar grandes líderes: o pragmatismo e a transcendência. Até seguindo toda orientação anterior, dos diretores que por lá passaram, como professor Itapuan Bôtto Targino, professor Expedito Pereira, buscando sempre valorizar não só a técnica, mas também todos aqueles aspectos humanísticos importantes para o desenvolvimento do ensino e dos nossos alunos, muito consequentemente de todos que atuavam e atuam na área da educação tecnológica”. Concluindo acrescenta: “Bráulio foi um homem pragmático, objetivo, que sempre trabalhou com base em fatos, postulados científicos, sempre buscando alcançar propósitos, estabelecendo metas e agindo estrategicamente para obter resultados. Tinha também uma visão de transcendência e qualidade, sempre alicerçadas em valores marcantes de todo grande líder. Que ele era. A junção dessas duas grandes vertentes, pragmatismo e transcendência marcam a gestão do professor Bráulio “.

Colegas professores que trabalharam com Bráulio, lamentando a sua morte, fizeram questão de darem seus depoimentos dizendo: “Foi um servidor público exemplar, tratou a todos de forma igual, era uma pessoa séria, mas muito atencioso, é merecedor de todos os elogios, de todo o reconhecimento. Ele foi decisivo para a construção da Unidade de Ensino Descentralizada, como era chamado o Campus Cajazeiras”, afirmou professor Almiro de Sá que atuou como diretor entre os anos de 1995 e 2002.  A Professora Verônica Arnaud, que atua no curso de Mecânica do Campus João Pessoa, lembra com carinho do ex-professor e colega. “Era uma pessoa dinâmica, quando foi diretor percorria assim que chegava todos os setores da Escola Técnica, bastante prestativo, organizado, amava a instituição”. Professores colocaram: Aramis: “Nossos sentimentos, Governador! O Professor Bráulio foi um grande gestor na ETFPB/ CEFET hoje IFPB, que Deus conforte a todos os familiares”; Nivaldo Silva Tavares: “ Foi um pioneiro como diretor, perdemos um amigo, abraços”; Ivan Cabral “meus sentimentos, que Deus acolha a sua alma, e conforte toda família enlutada”; Edna Vilma: “Meus sentimentos. Excelente educador”; José Leonel de Moura: “Mensagem de Sentimento Verdadeiro do Coração e Alma. Fraternidade Estendida aos Horizontes Divino, Pureza da Alma, Deus é a Palavra, João Azevedo”.

Como se constata, os depoimentos são inúmeros e só contemplamos alguns. Eles   transparecem a vida ao longo do tempo que viveu Bráulio e nada melhor do que ouvir aquelas pessoas que se relacionaram e com ele conviveram, pois aí está o testemunho vivo de quem presenciou sua história e viu a construção de sua vida o que faz este relato fidedigno e incontestável.

Ao traçarmos a trajetória de Bráulio Pereira Lins, identificamos que sua vida foi ponteada por grandes gestos, obras e realizações, regida pelo seu temperamento firme, aguerrido, comprometido com a causa da educação, impregnado de sentimento humano, de compreensão e de amor. Por onde passou deixou sua marca sentida na mente de todos com quem conviveu e relacionou-se com ele. Estou consciente que fiz justiça em perpetuar sua memória e que todos aqueles que o conheceram a guardarão também na lembrança.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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