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Professora Emérita da UFPB e membro da Academia Feminina de Letras e Artes da Paraíba (AFLAP]. E-mail: [email protected]

A empresa e o social

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publicado em 11/03/2021 às 06h27

Empresa e social andam juntos. Empresa é a organização constituída de uma ou mais pessoas para exercer um trabalho, com tarefas para a realização de um objetivo ou empreendimento. Organização econômica, civil ou comercial, que objetiva explorar um ramo de negócio e oferecer ao mercado bens e/ou serviços. Sente, a empresa, necessidade de se integrar ao contexto do ambiente onde está inserida. Constata-se que ela terá sempre uma função social, no entendimento que não deve visar somente o lucro, e também preocupar-se com os reflexos que suas decisões tem perante a sociedade, seja de forma geral, incorporando ao bem privado uma utilização voltada para coletividade, ou de forma especifica, trazendo realização.

Conversava com uma professora de Educação Física do município e de universidades privadas onde leciona e desenvolve atividades de extensão. Foi quando tomei conhecimento da Alpargatas. Esta empresa fabrica calçados dos mais variados tipos, desde a havaiana, sandálias, tênis da linha rainha, mizuno e outros. Possui várias fábricas em diversos estados do Brasil, mantendo o Instituto Alpargatas, que desenvolve trabalho social através do projeto “Educando através do esporte”. Este, consiste em estabelecer parcerias com as secretarias de educação e prefeituras dos municípios. Cada escola elabora um projeto. Aqui na Paraíba, a primeira experiência ocorreu no município de Santa Rita, por estar inserida em sua circunscrição. A secretaria de educação indica ao Instituto as escolas municipais que irão participar e os professores de Educação Física responsáveis pela elaboração e execução do projeto. Os conteúdos são os mais diversos: uns são voltados para modalidades esportivas, outros abordam a própria educação física escolar e outros atuam dentro da interdisciplinaridade. São trabalhados durante todo o ano e, ao final, devem apresentar os resultados do aproveitamento ao Instituto Alpargatas, através de relatórios que permitam avaliar o que foi desenvolvido na área de atuação. Dependendo da avaliação do projeto, se der certo e obtiver bom aproveitamento, o professor é chamado “professor nota 10” e a escola em que ele leciona será beneficiada com recebimento de material escolar, ou revitalizada em alguma carência que possua. O professor será contemplado com material didático para o exercício das aulas de educação física para ele e os alunos. Estes recebem tênis e roupas de ginástica. O docente ao final do ano letivo é chamado para apresentar seu trabalho em congresso pedagógico, sendo-lhe fornecidas passagens, diárias e hospedagem durante o evento.

Com essa iniciativa a empresa não só valoriza o profissional de educação física mas procura integrar-se na sociedade onde se insere, promovendo o incentivo educacional por entender que, por seu intermédio, conseguirá transformar o homem e sua realidade através do processo conscientizador estabelecido. Nesse sentido, o filósofo, sociólogo e intelectual francês Raymond Aron (foto)(2002), sintetizando o pensamento de Comte, diz: “a propriedade privada é necessária, inevitável, indispensável; mas só é tolerável quando assumida, não com o direito de usar e abusar, mas como o exercício de uma função coletiva por aqueles que a sorte ou o mérito pessoal designou para isso. Comte assume, portanto, uma posição intermediária entre o liberalismo e o socialismo.”

No mundo pós moderno a atividade empresarial passou por transformações estruturais e conjunturais. Hoje, não só objetiva o lucro gerado mas volta-se para a responsabilidade social. Isto para atender o que diz a Constituição de 1988 sobre igualdade e justiça. Há preocupação com o individual e o coletivo. Isto chama-se Estado Democrático de Direito, que tem a finalidade de assegurar os direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, garantidos nos fundamentos sobre a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, a livre iniciativa, dentre outros… Estabelece as bases relacionais do Estado com a iniciativa privada. Antes prevalecia a mentalidade individualista e mercantil, hoje tornou-se coletiva. Essa função social não só ocorre no âmbito interno da empresa quando se preocupa com o bem estar dos empregados, exercer a justiça, praticar relações morais e pagar salários dignos capazes de fornecer boa condição social aos trabalhadores, mas extrapola seus muros e alcança a comunidade onde está situada.

A empresa, para atingir sua função social, tem que ter maturidade organizacional, em harmonia com as concepções do mundo moderno onde a função social compromete-se com a valorização da dignidade da pessoa humana. Isto implica em resultados econômicos, dinamismo financeiro e eficácia em suas relações sociais, constatado pelas ações concretas que repercutem no desenvolvimento sustentável do país.

Não se trata de nova definição, porém de novo enfoque adotado nas relações humanas. É o exercício da boa cidadania empresarial, que se configura no respeito à dignidade da pessoa humana. É a redefinição dos paradigmas no crescimento socioeconômico. O lucro contabilizado pela empresa somente é legitimado se esta atender ao cumprimento de sua função social, o que implica no encaminhamento da solução dos problemas sociais. Nessa direção, a função social assume uma força transformadora das ideias no quadro de valores das pessoas, das instituições e da sociedade que está em seu entorno. Com essa prática construiremos uma sociedade aberta, justa e solidária. A empresa Alpargatas transparece isto e já expande sua função social para outros municípios paraibanos. Se todos tivessem essa prática teríamos outro Brasil. Parabéns, Alpargatas!

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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