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Professora Emérita da UFPB e membro da Academia Feminina de Letras e Artes da Paraíba (AFLAP]. E-mail: [email protected]

Os heróis da saúde

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publicado em 23/07/2020 às 10h19

Nossa primeira graduação foi em Enfermagem e nela nos fixamos profissionalmente. Fizemos pós-graduação na Escola Nacional de Saúde Pública, do Rio de Janeiro. Atuamos na área ambulatorial, na docência e na administração universitária. Participamos atuando com profissionais de saúde pois a área de Saúde Pública é uma área interdisciplinar. Estudamos muito sobre endemias, epidemias e pandemias. Uma coisa é você saber e outra coisa é viver. Hoje temos a oportunidade de vivenciar essa pandemia que nada tem com os conteúdos científicos que na nossa época indicavam. As pandemias costumam provocar pânico generalizado na população, principalmente quando não se tem total conhecimento sobre a doença — é o caso da infecção pelo novo corona vírus. São outros protocolos e novas metodologias fugindo dos padrões antes preconizados. Até porque surgem novos microrganismos que infectam de maneira diferente e outras formas de tratamento e medicamento.

Queríamos nesta crônica fazer uma homenagem aos militantes de saúde que nesse momento estão arriscando suas vidas numa batalha para levar cuidados aos pacientes com o COVID 19. Acompanhamos a rotina de um médico e uma enfermeira intensivista; esta possui uma criança que ainda amamenta mas agora só o faz quando o horário lhe permite. É uma correria que implica em sacrifícios, medo, angustias e renúncias. Isto está acontecendo com milhares de trabalhadores da saúde que estão em atividades. Alguns adoecem e outros morrem. Muitos não voltam para suas casas ante a possibilidade de contaminação de suas famílias. Estão sem ver companheiros(as) e filhos(as). Trabalham em turnos ininterruptos, sem tempo para comer ou até mesmo para ir ao banheiro. Nas atividades entram em contato com o vírus, recebendo uma grande carga viral. Para eles a maior preocupação é a transmissão da doença para os familiares. A saída do hospital não ocorre imediatamente. Há um protocolo de higienização que os fazem chegar tarde em casa. Ao chegarem em sua residência entram pela área de serviço, tiram as roupas e as colocam para lavar, em seguida passam para o banho. Quando vão ficar livres dessa higienização já são 8 horas da noite. O stress é tanto que muitos hospitais estão disponibilizando psicólogos para fazer o acolhimento emocional. Há pânico, medo e incertezas o que os deixam fragilizados gerando ansiedade e sentimento de tristeza, Não esqueçamos que esses profissionais são seres humanos como todos nós; são desafiados diariamente para salvar vidas. Devemos render-lhes todas homenagens, pois participam como verdadeiros heróis, esforçando-se para dar o melhor de si. São soldados que enfrentam o inimigo mesmo antes do paciente, que deixam família, filhos, pais, irmãos. Cada um que coloque-se no lugar do outro profissional e paciente.

O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), ao analisar a situação do Brasil no combate ao novo corona vírus, nessa terça feira (7), confirma que 1.668.589 casos de COVID  19 já foram notificados no país, incluído o presidente da República, que teve seu diagnóstico para a doença confirmado. No total, são 66.741 óbitos acumulados em decorrência da infecção respiratória, sendo 1.254 novos registros adicionados nas últimas 24h.  A taxa de letalidade da doença no Brasil é de 4%. No mundo, o Brasil é a segunda maior nação em número de casos totais do COVID-19 e em óbitos pela doença respiratória. Todavia, 927.292 pacientes (cerca de 55,5%)já tinham se recuperado da COVID -19, segundo o Ministério da Saúde, que diariamente atualiza os dados via Plataforma SUS, incluindo gráfico com evolução de número de casos, de recuperados e de óbitos.

Os Estados e Municípios, que são unidades da federação autônomos, decretaram estado de calamidade pública diante da declaração de pandemia de corona vírus pela OMS. Cada um segue protocolo diferente no tratamento do COVID 19, conforme a situação local. Adotam diversos procedimentos para tentar conter a transmissão da doença, abrangendo escolas, universidades, transporte público, serviços de saúde, comercio, órgãos públicos e eventos.  A Paraíba, segundo publicação da Agencia Brasil, estabeleceu até o dia 5 deste mês uma série de providências. Nas cidades que tenham casos de corona vírus confirmados, e nas respectivas regiões metropolitanas, proibiu a atividade de academias, ginásios e centros esportivos púbicos e privados; shoppings, centros e galerias comerciais, bares, restaurantes, casas de festas, casas noturnas, boates e estabelecimentos similares; cinemas, teatros, circos, parques de diversão; comércio; embarcações turísticas, de esporte e lazer, em todo o litoral paraibano. Liberou restaurantes e lanchonetes localizados em rodovias, apenas para o fornecimento de alimentação pronta, devendo priorizar o atendimento a motoristas de transporte de carga, respeitando a distância mínima de 1,5 metro entre os clientes. Restaurantes e lanchonetes podem funcionar, mas exclusivamente para entrega em domicílio (delivery), inclusive por aplicativo e com pontos de coleta pelos próprios clientes. Além de outros processos disciplinadores para supermercados, estabelecimentos bancários, casas lotéricas, oficinas, concessionárias e outros setores julgados essenciais para a população. Disciplinou também o trabalho de funcionários acima de 60 anos; gestantes e lactantes; pessoas que tenham histórico de doenças respiratórias ou doenças crônicas, que utilizam medicamentos imunossupressores ou que apresentem sintomas respiratórios, como febre, tosse, coriza ou dificuldade de respirar.

O Ministério da Economia informou, em nota, que “não há cronograma para o retorno ao trabalho presencial”. Com relação aos servidores de saúde, chama-nos atenção os problemas mentais decorrentes do isolamento e da solidão, sofrendo transtornos psicológicos, ansiedade e depressão. Alguns, hipocondríacos, ficam em pânico e já sentindo os sintomas da doença. A exemplo do que está acontecendo no Hospital Santa Casa de São Roque em São Paulo, onde há um Plantão Psicológico disponibilizado para auxiliar os profissionais que necessitam de acolhimento emocional neste momento. A psicóloga Ana Carolina Morais Peroni relata que tem recebido com frequência profissionais que compartilham dos mesmos sentimentos. “São profissionais de todos os setores que me procuram diariamente com medo, angústia e desamparo. O sentimento comum é de estarem num mesmo barco à deriva num mar turbulento e cheio de dúvidas. Temem o futuro e precisam viver um dia de cada vez. Alguns colaboradores que perderam familiares e não puderam viver o luto, estão sofrendo muito, pois esse ritual é importante para elaborar essa perda na nossa cabeça”, conta. “Continuem em casa. Nossa liberdade foi tirada, mas entenda que ficando em casa salvam-se muitas vidas. Organize a sua rotina, tenha um horário para acompanhar as notícias, distraia-se com filmes, brinque com seus filhos. Procure ocupar a cabeça com momentos alegres também”, reforça a psicóloga.

Como se constata, o drama que vivem os profissionais de saúde não tem precedentes. Deixam seus filhos com parentes ou mesmo com empregadas domesticas, vendo–os por chamadas de vídeos, o que os deixam ansiosos e tristes, pois lidam diretamente com o vírus. Um deles falou: “A rotina de trabalho no hospital foi transformada e adaptada a essa nova situação. Isto duplicou os procedimento com relação à assistência prestada e aos protocolos. A atenção foi redobrada com relação a desinfecção concorrente e terminal com as medidas de segurança; demonstra a preocupação com a transmissão do vírus.” Pode-se dizer que os referidos servidores, sem exceção, encontram-se afetados em seu psicológico até porque é um enfrentamento diferente com o desconhecido que alterou suas vidas, no convívio com a família, com os amigos e as pessoas. Situação que segundo Peroni “elas buscam   encontrar forças porque sabem que muitas pessoas contam com o seu trabalho”.

Diante desse quadro percebe-se que o profissional de saúde é um sacrificado, um missionário, dedicado e prestimoso, um ente que vive para servir sem escolher a quem, incompreendido e não reconhecido por muitos, que os menosprezam e os vilipendiam. No exemplo que demos da enfermeira que amamentava, seu filho não quis mais o seio e foi desmamado precocemente. Muitos têm que ficar dando plantões e pulando de nosocômio para complementar a renda. Cremos que ao término dessa pandemia as autoridades terão que repensar a política de saúde e tratá-la com mais dignidade. Falo daqueles profissionais que colocam amor no seu labor. Deixam de ir trabalhar no interior do estado por falta de condições para prestar serviços de qualidade. É essa a realidade. O usuário não quer saber se o sistema de saúde está deficitário. Quer a resolução para seu problema. Nada se resolve e fica-se empurrando a competência que era sua para outros entravando e congestionando, assim, o círculo da atenção primária, secundária e terciaria, como foi planejado para a estrutura do SUS, que serviu de modelo para outros países. Como aluna da pós-graduação em Saúde Pública, tivemos oportunidade de analisar o planejamento do SUS, a filosofia e a prática teórico-cientifica que o nortearam. Ele estava nascendo dentro de princípios idealistas que previam a socialização da saúde de qualidade para todos. Hoje constata-se um distanciamento entre o planejado e o realizado. Um exemplo concreto é o atendimento de saúde dado aos paraibanos que está concentrado nas maiores cidades da Paraíba, João Pessoa e Campina Grande, porque os outros municípios não resolvem os casos, encaminhando seus usuários para serem atendidos nessas duas cidades, quando deveriam ser assistidos no local onde moram. Estes serviços, por sua vez, se esforçam como podem para atender a demanda. As estatísticas da Secretária de Saúde comprovam esta problemática. Com a chegada da pandemia constatou-se a precária estrutura do sistema. Cremos que passada essa crise tem que se repensar a eficiência e eficácia da política de saúde com relação aos serviços e aos recursos humanos.

O trabalho dos profissionais de saúde é nobre e a rigor não tem preço. É como obra de artista, onde ele estipula um valor simbólico, pois trata-se de uma criação. Os militantes da saúde lidam com o ressuscitar da vida, o seu valor é imensurável. Constatamos na pele essa realidade. Saudemos os heróis da saúde!!

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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