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Francisco Leite Duarte é Advogado tributarista, Auditor-fiscal da Receita Federal (aposentado), Professor de Direito Tributário e Administrativo na Universidade Estadual da Paraíba, Mestre em Direito econômico, Doutor em direitos humanos e desenvolvimento e Escritor. Foi Prêmio estadual de educação fiscal ( 2019) e Prêmio Nacional de educação fiscal em 2016 e 2019. Tem várias publicações no Direito Tributário, com destaque para o seu Direito Tributário: Teoria e prática (Revista dos tribunais, já na 4 edição). Na Literatura publicou dois romances “A vovó é louca” e “O Pequeno Davi”. Publicou, igualmente, uma coletânea de contos chamada “Crimes de agosto”, um livro de memórias ( “Os longos olhos da espera”), e dois livros de crônicas: “Nos tempos do capitão” …

Madrinha Liá

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publicado em 14/07/2023 às 07h00
atualizado em 13/07/2023 às 18h36

Areias nunca mais será a mesma. Uma das suas matriarcas, depois de noventa e dois anos, voltou à singularidade da energia inicial e diluiu-se nos braços dos mistérios que estão ocultos para os que, ainda vivos, ficaram.

Madrinha Liá. De crisma, de batismo, de São João?  Não lembro, mas nunca foi preciso, pois ela foi dessas madrinhas que não carecia de qualificação para exercer o seu mister, nem eu era doidivanas para ir contra as recomendações de mãe: “Já deu a bênção a sua madrinha?”

Madrinha Liá ria, ria e ria. E oferecia à sua comadre um café fresco, quentinho na cozinha da sua casa. Um “Deus te abençoe” e um suco de goiaba para mim, um menino magrinho de cinco anos ainda pendurado nos cóses da saia da mãe, orgulhoso por ser afilhado daquela mulher que tinha um ar majestoso, uma risada contida, um gosto em receber sua comadre na sua casa, que era limpa, radiante, bem cuidada e amor.

Morávamos aos pés da Serra do desterro, no Sítio Saco, município de Uiraúna. Ela, no povoado de Areias.  Areias é um desses povoados encalacrados no alto sertão da Paraíba, uma capelinha linda de doer nos olhos entre duas ruazinhas compridas e que, hoje, sua lembrança me mata de saudades.

Saudade de Madrinha Liá, seu suco de goiaba, sua bênção, sua casa, sua fala mansa, seu carinho, o arroz branco, galinha caipira, farofa de cebola roxa, o melhor almoço do mundo e uma conversa longa e proveitosa.

Todos falam bem dos mortos, mas, assim, eu sempre falei da minha madrinha, em vida, a vida toda. Em meu livro “Os longos olhos da espera”, lá está ela, na primeira comunhão, nos dias das eleições, nos dias das festas da padroeira, em outras ocasiões em que minha mãe ia visitar a comadre.

Deixou filhos e filhas, que os criou bem; deixou o esposo José de Veizé. Boa esposa, boa mãe, boa vó. A gente não conhece os mistérios da morte, mas uma verdade há de estabelecer aqui: Madrinha Liá merece o reino do céu.

@professorchicoleite

Auditor, jurista e escritor

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