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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

O paraíso

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publicado em 11/02/2023 às 07h00
atualizado em 11/02/2023 às 04h40

    Desde garoto que sou casado com os livros. O hábito vem de meu pai.

    A noção que Jorge Luís Borges (foto) tinha do  paraíso era uma biblioteca. Caetano Veloso canta no disco “Livro” 1998, que quase não tinha livros em casa e a cidade não tinha livraria. “Mas os livros que em nossa vida entraram, são como a radiação de um corpo negro, apontando pra expansão do Universo”

    Na minha cidade só tinha uma biblioteca do Colégio São José, que eu não arredava o pé e uns dez livros de meu pai.

    Fiquei a imaginar, se realmente a gente morasse numa biblioteca – não adoecíamos tanto. Não teria espelhos, certamente, comidinhas, e as lavandas. Ali mesmo dormiríamos e fazíamos amor.

     Acordaríamos bem-humorados, cantando “Partido Alto”  sem nenhuma ansiedade. O colesterol total legal e a glicose, nunca passaria de 80.

    Daríamos muitos beijinhos e recitaríamos os poemas de amor de João Cabral de Melo Neto e os eróticos de Bocage, o desbocado.

    Leríamos romances, entraríamos no enredo, porque somos muito emocionados e comeríamos cuscuz com ovo, galinha e feijão que tem gosto de festa.

    Seriamos os desenhos de nossas vidas, sem as notícias infelizes do câncer, do Alzheimer e do AVC. As dores nas costas não existiriam.

    Só os livros nos salvariam na melhor ou pior teimosia dessa vida.

    Seria proibido usar celular nas bibliotecas. Cigarros, nem pensar. Ninguém poderia falar alto, nem seriamos filmados.

    Entraríamos descalços na biblioteca, a mala e as mochilas atiradas para um canto do corredor, e viveríamos para sempre sem brigas, sem dor de dente, nem de cotovelo. Sem boletos, é claro.

    Nem a dor nos quartos, porque não teríamos tempo para envelhecer.

   Passaríamos cera no chão, limparíamos as prateleiras e poltronas, para a chegada de novos livros.

   As redes armadas para leituras depois do almoço e uma nuvem de cotão no céu. Não teríamos dor de cabeça, mas muito sossego. Quem lê tanta notícia, não consegue sossegar, né?

   Impetuosamente, em cada canto uma mesinha para estudar e ninguém poderia imaginar o bem-estar que os livros nos proporcionam.

   Seriamos mais educados, nunca nervosos – longe do isso é meu, isso é teu, nada de banco, nada que nos deixassem tristes e a alegria seria todo dia o dia todo e nem existiria bom dia, boa tarde, boa noite.

    Nunca seriamos ausências. 

Kapetadas

1 – Há quem se orgulhe dos livros que escreveu, já eu dos livros que li.

2 – Livros, essa eterna sequência de recomeços.

3 – A maior invenção do ser humano: fones de ouvido.

4 – Dormir é ir voluntariamente para um paraíso ignorado.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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