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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Somos todos do clube

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publicado em 21/04/2024 às 07h38

(para Jória Guerreiro)

O sonho, o menino, a escada, a mãe do Lô, a caipirinha, a cidade, a família, os patins, o belo e o horizonte, o sol, tantas vezes, o resto de sol, o nada e nunca será como antes. A rural, a esquina, o pão, a voz, o violão, o Wagner e o Tiso e o mais sublime nascimento da música de Milton. A coisa mais triste, mais alegre, a solidão, a saudade, outra travessia, o Brant e o Fernando, o trigo, o vinho, os amigos, a paixão e a fé, a brincadeira e o despertar, o juízo e o sem fim. A faca e o irmão. Tá tudo lá no filme “Nada Será Como Antes” de Ana Rieper.

A música do Clube da Esquina é um concerto, (é um documentário), é um filme que cresce a cada esquina, a cada tomada sobre o grupo de artistas responsáveis pela criação dos álbuns Clube da Esquina 1 e 2, mas não é exatamente sobre isso – mais sobre a voz, o estender das mãos, como se as trevas não existissem ou certamente esperassem o sol para não resistir.

Tanta gente não sabe quem é Milton Nascimento… Tanta gente não vai ao cinema – como se não fizesse sentido. O filme é mais que um documento, é alimento, quase um lamento, uma forma de não morrer sozinho. O fazer a fé e o sentido.

É um longa sobre a criação das canções desses discos, já disse, do Clube da Esquina, mas mostra o processo criativo da vida, o começo dos (a)fetos e amizade, que às vezes a lucidez esconde, a gênese, os Beatles e Debussy.

Lá estão os músicos Lô Borges que na época com 16 anos, hoje parece um garotão com se a vida fosse só alegria e tem o Nivaldo Ornelas, Toninho Horta, Beto Guedes, Robertinho Silva e Wagner Tiso.

As cenas mudam, mas as canções não, o cenário é o mesmo, porque o filme mergulha na musicalidade da nossa memória e todo processo criativo desses artistas que Minas deu ao mundo, e são excepcionais, incluindo os lugares, pessoas e outras referências que influenciaram a criação das mais belas canções.

Não tem como não se sentir pequeno diante da tela, pai e mãe, a mobília
e o fogo do sol nas imagens; um filme que fala de amor e todos brincam numa cidade que sonha com o tempo que não se perdeu. Um filme em que não restam cenas, talvez atalhos, de variar o nosso juízo, ainda que muitos prefiram o silêncio.
Um filme sem detalhes, devaneios, sem morte e glória, nada, só o idioma de Minas, como se Minas é que não fosse como era antes, cenas antigas coloridas misturadas a cidade malgasta de hoje, dando tanto anseio a quem ainda não está com o pé na estrada.

Passam os dias, passam as horas dos tempos em que só tínhamos para nos entreter as cantorias de roda, a voz que vinha das ruas. Somos todos desse clube, cada um com sua esquina e a triste realidade das pessoas que perdemos e haveremos de perder.

Caminhos de ferro, de barro, mas não tem os deuses da chuva, a ponta de areia, de me perguntar se há outras línguas? Outras léguas e se poderiam ter nos tocado tanto.

Janelas, quintais, casas esquecidas, imagens que não nos impediriam de chorar. O mundo de nos ser conhecido, os nomes e as vozes ecoando – uns gritam, outros cantam.

“Nada Será Como Antes” contorna às coisas, como então a vida se tornar difícil, o envelhecimento, a ofensiva lá foram com as imagens que se decompõem em cada olhar.

O sonho, o menino, a escada, o violão, o cego, um filme na palma da mão, um pinhão, uma luz radiante, um grão, uma pedra e a expansão mais bela do Clube da Esquina. Nós estamos lá.

Kapetadas

1 – Água mole em pedra dura, pra começar a água não é mole, é líquida.

2 -Se existe uma indústria bélica como podemos viver sem guerras?

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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