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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Moca já foi

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publicado em 15/12/2021 às 08h06

Logo cedo encontrei Neto Dominicano, amigo singelo da nossa infância. Eu sempre gosto de vê-lo no mar.

Já estava em casa, trabalhando, quando ele me avisa que Moca havia morrido. É, o nome dele era Moca e não importa se o Damocles vinha antes, ou era o nome oficial. Muitos o chamavam de Zé Moca.

Moca era um homem bonito, filho de Expedido Holanda e Dona Ilka. Não sei se viveu muito, porque no sertão a idade parece outra, mas Moca não estava mais na minha memória.

Ela era um homem velho que estava dormindo. Logo logo ele vai acordar. Acho que dos homens, era o filho mais jovem da família. Moca poderia ter acordado o mundo, se tivesse migrado, mas ficou lá no sertão, dia e noite.

Casou com Enalda Mendes, que era linda e ainda é, tiveram filhos e netos e depois cada um foi para o seu lado.

Moca era do mundo, mas não era de todos os lugares.  O mundo se espreguiça em plena pandemia, mas nunca vai saber que Moca morreu numa quarta-feira.

Tudo está sempre em estado de mudança, incidindo ao mesmo tempo para que a vida se torne uma espécie de milagre, basta que alguém as reúna numa história, a história de cada um e as coincidências são o amor de alguém por uma narração.

Vi recentemente umas fotos da cidade que nasci, Jatobá, e fiquei perplexo com a devastação das casas. A calçada da nossa casa, apenas o poste onde encostávamos as cadeiras de ferro cobertas por fios de plásticos para puxar uma conversa. Não me lembro de Moca na nossa calçada.

Me lembro dele na farmácia da família, cabelo ao vento, jovem e bonito. Não me lembro dele no açude sangrando, na “barraguinha” e nem sei porque chamávamos assim no diminutivo. Há muitos anos não via Moca

A morte de Zé Moca é quase um arrastado de tristeza, quando os  vínculos não existem mais a nos reconhecer o igual no diferente e o diferente no igual. Vida besta.

A morte estabelece pontes entre o passado e o presente; desdobra o presente em novidades e recarrega as palavras de concretude e proximidade com as coisas.

Morrer é uma forma de inventar possibilidades, que às vezes se tornam verdades. Moca era alegre e divertido, era tudo que ele conseguiu ser.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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