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Médico. Psicoterapeuta. Doutor em Psiquiatria e Diretor do Centro de Ciências Médicas da Universidade Federal da Paraíba. Contato: [email protected]

Titulando a dose

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publicado em 31/08/2021 às 07h58
atualizado em 31/08/2021 às 05h07

Vem das olimpíadas, uma nova cara prateada do vôlei. Digo nova para quem não acompanha esse esporte todo dia.  Vem de Rosamaria, jeito explosivo, personalidade forte, mulher diferenciada, que ajudou a incendiar a destacada seleção. No grito, na determinação. Vem dela uma confissão de adolescente: por muito tempo, teve vergonha de sua altura, e como se sentia por fora. Isso me trouxe o ensejo para falar sobre como, na adolescência, as diferenças podem ser sentidas de modo depreciativo, mesmo quando, de verdade, podem ser pontos fortes desse indivíduo.

Procuro ser continente com pessoas. Principalmente, com aquelas que estão em momento de transição e, portanto, mais susceptíveis a críticas e dissabores. Sei que muita coisa mudou, desde que fui adolescente. Ou mesmo, desde que iniciei minha ação profissional como médico e psicoterapeuta. Ouço menos, adultos se referirem a eles como “aborrecentes”. E o que esses adultos queriam de um sujeito que está mudando suas referências, com relação à vida, a personagens de sua história e a seu próprio corpo?

É isso. Eles estão passando por mudanças físicas; mudanças psicológicas, seja nas questões de responsabilidade, experiências, conflitos; por mudanças sociais quanto a sua identidade social, inter-relacionamentos; ou no comportamento sexual, onde se inserem interesses sexuais até então adormecidos; tanto quanto conflitos que vão de um extremo de dependência anterior, à uma fantasiada independência sem nenhum controle externo.

Imagino o que não foi a mudança física de uma atleta de vôlei. Um “estirão” não muito dentro do normal, tornando o corpo em construção, uma morada de ossos e músculos fora do lugar, deselegante, e, quiçá, inadequado para a mente que ainda se vê com corpo de criança.

Por isso os protejo de qualquer tipo de ataque, ou de críticas, senão aquelas que analisam junto, para que eles percebam a inadequabilidade de determinados comportamentos, ou a falta de dimensão de alguns desejos, que precisam, com as devidas contenções e referências, torná-los mais congruentes com a realidade social, sem exceder ou podá-los evidentemente.

Aceitar seus medos, sem depreciá-los, assim como, conter suas impulsividades fora de propósito, sem inibi-las.  Mais do que tudo, protegê-los dos perigos, dos descaminhos, das influências vãs que podem torná-los presas fáceis dos riscos que entram em nossas casas, e penetram em suas mentes, através dos celulares e redes sociais. Sobre isso, é impossível manter controle, salvo se formos além de cuidadores, bons orientadores. Sem arrogância, e da inteira confiança deles. Não podemos ser, para eles, adultos intolerantes ou aborrecidos, mas na dose certa, para que tenham a força e o sucesso de Rosamaria, apesar dos supostos defeitos.  Sei, e você me dirá: não há dose certa! Mas podemos ir titulando a dose, igual fazemos com os remédios.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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