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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Olá, como vai?

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publicado em 12/06/2021 às 08h35
atualizado em 12/06/2021 às 10h03

Se a rua da sua casa mudasse de mão e sua vida mudasse de rumo, você começaria tudo outra vez? Esquece. A vida é real e de viés, está lá na canção do Caetano.

Se você soubesse escrever hai-kais e lesse na janela da sua casa, isso seria um gesto humanitário? Se você não ouvisse o guarda que pernoita vestido num colete a prova-balas, você aprovaria? Balas? E a modelo negra Kathlen Romeu, que foi morta no Rio esta semana?

Se você tivesse uma ínfima noção do que é não ter casa, do que é viver pelas ruas, não ter uma bicicleta para pedalar, você que eu digo é “nós”, não reclamaríamos tanto, né? Vamos pra frente.

Escrever não só sentar aqui e escrever. É sentir.

Fui com meu filho ao médico e, num sinal fechado da avenida Ruy Carneiro, avistamos uma mulher negra gravida, pedindo dinheiro. Nosso carro era o quarto da fila. Nem o primeiro, nem o terceiro lhe deu nada. Quase ninguém é cidadão.

A imagem da mulher ao aparecer numa impotência transformada em ato de rua, (era quase fim de tarde), como poderia ser no amanhecer, com a noite o anoitecer, também é assim com o parecer que, acrescido do a, vem à luz.

Apareceremos nas redes. Somos bonzinhos? Somos lindos?

A cena da mulher negra você desenha como quiser, tudo o que imaginar dessa situação, de uma mulher que está preparando outra pessoa, você desenha como quiser.

Por ali a infelicidade e o mal-estar da vida contemporânea, refletidos nos retrovisores dos carros. A mulher estava só. Vale quanto pesa dar à luz a outra pessoa?

Uma mulher sai de casa grávida para pedir dinheiro, bem necessitada, numa época dominada pela infelicidade dessa pandemia.

Baixei o vidro do carro, tirei uma nota da minha carteira e dei a ela, que parecia não acreditar. Ficou muda. Chorou. Um sorriso se misturou com lágrimas. Ela não faz parte daqueles que esperam a morte chegar, porque quem carrega um filho no ventre, tem muita valentia.

O sinal abriu e ela ficou olhando para mim com uma alegria individual, jamais vista.

Meu filho não deu uma palavra, observou a cena e só quando dobramos a esquina, ele disse que eu era um homem justo. Um amigo amado, disse que eu sou generoso. Já fui chamado de prestativo. Não sei. Sou um homem comum.

Um dos milagres da vida – e aqui penso em milagre como maravilhamento mesmo; aquilo que se vê, que a gente planta, que a gente colhe e que nos espanta – é que, quando nos sentimos tocados por uma mulher grávida pedindo dinheiro, o sinal não abre.

Anoiteceu. A mulher negra grávida ficou para trás. A modelo Kathlen Romeu também estava grávida.

Um atalho na paisagem. Isso vale para todos nós que andamos apressados pelas ruas da cidade…

Escrever é uma das melhores coisas do mundo.

Olá, como vai?

Kapetadas

1 – Tudo vai dar certo. Mesmo que não dê.
2 – Eu soube que ao perder a corrida pra tartaruga o coelho quis revanche. Ela não deu. Mandou que corresse contra o siri, mas o coelho cochilou, enquanto o siri ia pra lá e pra cá, fazendo palíndromos até à chegada. O coelho quis revanche, o siri não deu. E por aí vai…
3 – Som na caixa: “Olá, como vai? Eu vou indo, e você, tudo bem?/Tudo bem, eu vou indo correndo, pegar meu lugar no futuro, e você?”, Paulinho da Viola.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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