João Pessoa, 07 de novembro de 2020 | --ºC / --ºC
Dólar - Euro

Um projeto de inéditas chamado “Feliz da vida”, da cantora Angela Ro Ro gravado no Theatro Net Rio, registrado e lançado nos formatos CD e DVD Ao vivo (o segundo DVD de sua carreira), pela Biscoito Fino, está disponível no Canal da Biscoito no Youtube. Traz Ro Ro e convidados como Roberto Frejat, Diogo Nogueira, Jorge Vercillo, Sandra de Sá, Maria Bethânia e Moska.
O setlist privilegia a veia autoral de Angela em canções compostas em parceria com Ana Carolina, Antônio Adolfo e alguns dos convidados escalados para o projeto. Jorge Vercillo divide os vocais em “Capital do Amor”, (dele e de Ro Ro); Sandra de Sá participa em “Beijos na boca”, composta pelas duas, Moska, parceiro de Ro Ro em “Feliz da Vida!” e Maria Bethânia é a convidada especial em “Fogueira”, clássico lançado pela baiana no álbum “Ciclo” de 1983. Roberto Frejat completa a lista com “Amor meu grande amor” e “Malandragem”, originalmente composta por ele e por Cazuza para Ro Ro gravar, coisa que só aconteceu nesse registro.
Durante a década de 1970 (entre 1971 e 1974), no auge da ditadura militar brasileira, Angela foi para a Europa. Primeiro para a Itália, onde conheceu Glauber Rocha. Depois, mudou-se para Londres. Ao voltar para o Rio de Janeiro, apresentou-se em casas noturnas de espetáculos em Ipanema até ser contratada pela gravadora Polygram (atual Universal Music). O primeiro LP lançado em 1979 exclusivamente com composições da cantora se chama “Angela Ro Ro”. Esse disco tornou-se um clássico da MPB, com as canções “Gota de Sangue”, “Balada da Arrasada”, “Agito e Uso”, “Tola Foi Você” e “Amor, Meu Grande Amor” (que voltou à tona com a regravação da banda Barão Vermelho, em 1996).
O segundo disco “Só Nos Resta Viver”, trouxe a faixa-título e a regravação de “Bárbara”, (Chico Buarque e Ruy Guerra), presente na peça de teatro Calabar, além de “Meu Mal é a Birita”, na qual a cantora fala sobre a fama de alcoólatra. “Escândalo”, de 1981, apresentou uma capa em formato de jornal. A canção “Escândalo” dá título ao álbum, foi composta por Caetano Veloso.
Fomos encontrar Angela RoRo em Saquarema, região dos lagos do Rio de Janeiro. Na entrevista ao MaisPB pelo telefone, a artista fala desse show que celebrou seus 33 anos de carreira e conversou abertamente sobre uma série de coisas ao seu modo, sem papa na língua. Angela Maria Diniz Gonçalves, Angela RoRo, é uma grande artista brasileira.
Confira a nossa conversa
MaisPB – Angela, a Biscoito Fino lançou as plataformas CD e DVD dos 33 anos de sua carreira, um presente para os fãs que não compraram na época…
Angela – Eu achei ótimo. Primeiro, antes de mais nada, saudade de todos, sorte e paz para todo mundo. Qualquer iniciativa com relação a música, eu acho bem vinda, especialmente aquela que se refere ao meu trabalho. A Biscoito Fino é muito simpática, apesar de não ser poderosa, no caso de uma multinacional ela detém um elenco de primeira qualidade. Os melhores artistas passam pela Biscoito. (seus últimos discos, Feliz da Vida e Selvagem tem o selo da gravadora) E tem mais: pode haver um ressarcimento financeiro de direitos autorais, mas eu não ganho milhões, não tenho peitões, sou um ser sagrado.
MaisPB – Tem faixas separadas?
Angela –Sim, duas em estúdios, com Paulinho Moska ( Feliz da Vida que dá nome ao trabalho) e Maria Bethânia ( Fogueira), o resto é o show.
MaisPB – Vamos para Londres, 1972. No disco “Transa” de Caetano Veloso, você toca gaita na última canção “Nostalgia”?
Angela – Toco sim, mas Gal (Costa), a maravilhosa, que é insuperável e que Elis não me escute, Gal abre a faixa Nostalgia, um rockzinho, e sua voz é melhor do que qualquer gaita. Gal é divina, mas eu faço minhas brincadeirinhas, pequeno solo. Eu ganhei até um dinheiro que deu para pagar uma semana de aluguel, comprar um bota nova que estava ficando frio. Foi muito bom, Caetano, Gil, Jardes Macalé, são pessoas muito importantes para mim. Esse disco “Transa” é um dos mais valiosos do mundo.
MaisPB – Você estava morando em Londres, nessa época?
Angela –Eu estava começando a morar em Londres. Antes eu passei por Paris. Fui para Europa sozinha e encontrei com Glauber (Rocha) na Itália, revi uma namorada que eu tinha que já está morta, desde 1977. Eu findei o namoro com ela, porque senti um negócio estranho. Eu tenho premonição. Na Itália nós ficamos hospedes de Glauber.
MaisPB – Você disse que a Itália naquela época era uma Hollywood?
Angela – Sim, eu conheci Antonioni, Federico Fellini e Giulietta Masina, Nana Vasconcelos, eu conheci lá. Tudo acontecia ali. Depois segui sozinha. Peguei a barca e atravessamos o Canal da Mancha e fui para Londres. Foi aí que encontrei Jardes Macalé, Aldo Sousa, um baterista maravilhoso, Gilberto Gil e família e Caetano e família, acho que ainda não tinha nascido Moreno. Gal Costa também estava lá.
MaisPB – Onde você está nessa pandemia?
Angela – Estou em Saquarema, aqui no Rio. Graças a Deus eu tenho essa casa que era de meus pais. Meu pai era engenheiro cível, ele era baiano, minha mãe mineira e eu que não presto, nasci no Rio de Janeiro.
MaisPB – Você está compondo aí em Saquarema?
Angela – Devia estar compondo mais, mas meus animais estão tirando minha concentração. Mas já estou começando. Tem uma melodia que lembra Violeta Parra, com muita humildade. Tem algumas coisas esboçadas com meu querido Ricardo Maccord, (tecladista, maestro e arranjador) Trinta anos estamos fazendo agora em 2020 de companheirismo, claro que às vezes a gente se detesta. Ele é o maior parceiro meu. Em quantidade, sem desprezar os outros.
MaisPB – Você está ai sozinha, ou com novo amor?
Angela – Estou com minha gatinha pequena, ele não tem nome, mas tem garra pra caramba. É perigoso de amá-la, mas eu estou amando. Estou feliz aqui comigo mesma.
MaisPB – Você tem visto as lives que os artistas têm feitos?
Angela – Algumas quando tenho chance. Meu computador está com defeito, minha televisão não pega direito. Lives eu fiz duas e estou precisando de grana e já pedi grana as pessoas na Internet. Mas eu não posso ficar vivendo de esmolas. Quero trabalhar, quero fazer lives. Quero fazer muitas outras lives, com outros repertórios, mas sempre com os sucessos. A visualização tem sido muito boa.
MaisPB – Você está fazendo 37 anos de carreira?
Angela – Não, estou fazendo 40 anos. Meu primeiro disco saiu há quarenta anos. Com meu nome na capa, com minha assinatura.
MaisPB – Lembra de quantos disco você gravou?
Angtela – Muitos. “Angela RoRo (79) “Só nos Resta Viver” de 1980, “Escândalo” de 1981, e em 82 foi “Simples Carinho”. Em 87 “A vida é Mesmo Assim”, e depois “Eu Desatino”. Pela Som Livre em 1993, “Nosso amor”. Gravei muitos song books produzidos por Almir Chediak.. Gravei muito na década de 80, até gravar “Acertei no Milênio”, esse disco é muito importante para mim, que eu consegui expressar a minha volta, pois estava com a saúde precária. A música vence tudo.
MaisPB – Você lembra como aconteceu a história da música “Escândalo”, que Caetano fez para você?
Ângela – Ah, eu pedi a ele, que adiava um pouco, mas ele fez e eu adorei, Escândalo é minha cara.
MaisPB – Pensa em retomar os shows depois da pandemia?
Angela – Meu amor eu penso sim, mas agora eu quero fazer muitas lives, quero ganhar uma grana. Eu vim pra Saquarema antes da pandemia. Eu vivo no palco, jamais na vida.
Mais PB – Tem saudade de seu programa no Canal Brasil?
Angela – Não há mulher, não há romance que eu tenha tanta saudade, como o meu programa de TV, entrevistei pessoas fantásticas. Foram 52 programas, com gente maravilhosa.
MaisPB – Como você tem visto o Brasil?
Angela – O Brasil tá muito ferido, é um pedaço de terra dentro de um Planeta, mas que traz uma alegria muito mais forte do que esse momento atual e, qualquer poder, mesmo que seja com milhões de brasileiros fazendo merda e elegendo merda. É muito genocídio, burrice, milicianos e assassinos. Estamos cercados de neonazistas e fascistas. Não quero falar de nenhuma campanha, nem de partido. Muita homofobia, agora mais ainda, a falta de liberdade, a falta de respeito a verdade chegou ao ponto boçal. Temos que ter a consciência que vamos fazer o bem, o só o bem é grande na atitude diária de cada pessoa.
Mais PB – Você tem lido um bom livro?
Angela – Nada, detesto ler livros, ler pra mim é um inferno, eu prefiro escrever. Estou tentando dizer que vou lançar um livro já faz uns dez anos ( gargalhada) Eu sou muito preguiçosa. Mas tenho muita garra para trabalhar.
MaisPB – Você acredita em Deus?
Angela – Deus sou eu. O resto você pergunta para os mutantes. Eu acredito no bem querer, no bem fazer, na boa vontade e no bom caráter.

MaisPB
VIOLÊNCIA - 14/11/2025