João Pessoa, 19 de outubro de 2013 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Poeta. Músico. Letrista. Dramaturgo. Crítico de cinema. Como diria Stanislaw Ponte Preta, se fosse um só, Vinicius de Moraes, cujo centenário de nascimento se comemora hoje, seria chamado de “Vinicio de Moral”. Certa, encomendaram ao poeta que ele próprio escrevesse um verbete sobre si próprio em uma enciclopedia. Vinicius limitou-se a enviar um trecho de seu poema “Poética I”: “Outros que contem/ Passo por passo/ Eu morro ontem/ Nasço amanhã/ Onde há espaço/ Meu tempo é quando”.
Quando morreu, em 1980, Vinicius de Moraes tinha 66 anos. Naquele ano, em março, requereu reingresso ao Itamaraty, de onde fora aposentado, com base na Lei da Anistia, recém aprovada. Estreou na poesia em 1933 com Caminho para Distância. Ao todo, foram 12 livros de poemas. Em 1998, para uma publicação da Nova Aguilar, o poeta Alexei Bueno organizou sua poesia reunida, além de acrescentar textos. No teatro, compôs quatro peças. O volume foi reunido em livro, em 1995, com o título Teatro em Versos, pela Companhia das Letras. A mais famosa delas: Orfeu da Conceição, de 1954. A montagem marcou um encontro decisivo na vida de Vinicius: com Tom Jobim. A peça foi adaptada para o cinema, em 1959, como Orfeu Negro, com direção de Marcel Camus. Venceu a Palma de Ouro, e o Oscar e o Globo de Ouro de filme de língua não inglesa.
Vinicius estudou em Oxford e morou em Los Angeles. De sua estada na Inglaterra e nos Estados Unidos, despertou para o jazz e o cinema. Parte de sua produção crítica foi organizada, em 1991, pela Companhia das Letras, no volume O Cinema de Meus Olhos. Os textos que escreveu sobre jazz foram também publicados, em edição deste ano, da Companhia das Letras, Jazz & Co.
Em todo Brasil, haverá comemorações marcando a data. Hoje e amanhã, em São Paulo, haverá o espetáculo Saravá! 100 Anos do Poetinha, que contará com a participação de artistas como Leila Pinheiro, Bruna Caram, Toni Ferreira e Odilon Wagner. Também em São Paulo, haverá apresentação do espetáculo Meu Tempo É Quando… Tributo a Vinícius de Moraes, com músicas e textos do homenageado.
No Rio de Janeiro, hoje, o CCBB se dá prosseguimento aos encontros musicais Vinicius, o Poeta do Encontro, o programa será com repertório da parceria com Tom Jobim. Haverá ainda atividades em Curitiba (uma exposição). Ontem, em Salvador, aconteceu um concerto com o maestro e cantor Paulo Chagas.
Fundamental para Tom
Embora o poeta João Cabral de Melo Neto tenha deplorado a dedicação do colega ao mundo da música, classificando-a como um “desperdício”, Vinicius compôs centenas de canções com variados parceiros. Foi fundamental na consolidação da Bossa Nova.
O biógrafo Ruy Castro, estudioso do movimento musical, em conversa com a reportagem, falou sobre o encontro de Vinicius com Tom. “Acho que a Bossa Nova aconteceria de qualquer maneira, com ou sem Tom, Vinicius e João Gilberto. Seria apenas diferente. Acho que tivemos sorte de ela ter se dado com esses protagonistas em particular – Vinicius, por seu profundo conhecimento da música brasileira do passado (sempre gostou de cantar, e fazia isso na casa de Anibal Machado em Ipanema, nos anos 1940: modinhas, sambas, marchinhas etc). Aliás, Tom e João Gilberto também conheciam tudo. Ou seja, a Bossa Nova foi feita por pessoas que conheciam a bossa velha. E a chegada de Vinicius na vida de Tom foi fundamental para Tom – deu-lhe a confiança para criar”.
Mas Vinicius de Moraes não foi apenas o autor restrito a um gênero. Em texto publicado no Jornal do Brasil, quando da morte do poeta, o crítico musical Tárik de Sousa apontou a diversidade estilística do compositor. “Apesar de ser um dos deflagradores do movimento conhecido como bossa nova, ele atuou em todos os gêneros. Compôs com a mesma propriedade seresta tradicional (‘Serenata do Adeus’), música e letras suas, imortalizadas pelo êxito de Elizeth Cardoso; e desafio sertanejo: ‘Pau de arara’, parceria com Carlinhos Lyra, escrita para a peça Pobre Menina Rica. Tanto letrou e musicou a ‘Valsa Eurídice’, da peça Orfeu da Conceição, com tintas eruditas quanto embrenhou-se pelos afro-sambas de Baden Powell, numa longa viagem de sucessos iniciada por ‘Berimbau’”.
OS MUITOS VINÍCIUS
O POETA – As obras de Vinicius foram relançadas pela Cia. das Letras e quatro livros estão em uma caixa: ‘Lovro de Sonetos’, ‘Poemas Esparsos’, ‘Para uma Menina com uma Flor’ e ‘Para Viver um Grande Amor’
O MÚSICO – Entre os discos de Vinícius como artista da música, as parcerias ganham destaque, como ‘Os Afro-Sambas’ (1966), com Baden Powell, e os vários com Toquinho, como ‘O Grande Encontro de Maria Creuza, Toquinho e Vinícius de Moraes’ (1979)
O CRÍTICO – Vinícius também escreveu sobre as obras dos outros. ‘O Cinema de Meus Ohos’ (oa lado) mostra suas ideias sobre a sétima arte. ‘Jazz & Co.’ versa sobre o gênero musical.
SOBRE O POETINHA – O livro O Poeta da Paixão, de José Castello, é ainda a principal biografia sobre Vinicius de Moraes. Há também o documentário Vinicius (2007), de Miguel Faria Jr., muito popular e que ganhou uma edição definitiva em DVD recentemente
Jornal Correio da Paraíba
NA CÂMARA - 02/10/2025