João Pessoa, 08 de maio de 2025 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Primeiro eu, segundo eu, terceiro eu e depois o resto…
Vivemos em tempos que a autossuficiência é celebrada como virtude suprema. O “eu me basto” está cada vez mais presente e associado à ideia de independência e empoderamento. Mas até que ponto essa mentalidade realmente fortalece — e quando ela começa a isolar? Ser autossuficiente é importante, mas somos seres sociais e precisamos de apoio, escuta e afeto. O equilíbrio está em reconhecer que não precisamos dar conta de tudo sozinhos — e que compartilhar a jornada com os outros não nos diminui, nos enriquece.
Obviamente não precisamos discutir sobre quão é importante sentir-se bem, ter uma autoestima elevada e amar a si próprio, o fato é que amar-se está sendo sinônimo de bastar-se e são pontos bem distintos. O ser humano é, um ser social, por isso temos nossas forças e fraquezas diferentes uns dos outros, para que possamos nos completar – e isso serve para todos os tipos de relação.
Nas redes sociais – talvez a forma mais revolucionária e recente na mudança das relações pessoais – percebemos, além desse, alguns outros fenômenos consequentes e um deles é a seletividade que pautamos o convívio nesse mundo paralelo, no qual vemos apenas o que queremos ver e eliminamos (bloqueamos) o que não queremos. Desse modo, o grande ponto é a falta do exercício do contraditório (tão necessário para o amadurecimento das pessoas) e o estímulo à cultura do individualismo.
Nas conversas online, as reações e emoções são moldadas e maquiadas pelas ferramentas de apagar e editar o conteúdo, e forma bem distinta das conversas cara a cara, elas são editáveis de forma a não passar diretamente as emoções, mas aquilo que eu quero que o outro pense que é a minha verdade. E assim caminha a humanidade…
Alguns teóricos estão chamando esse fenômeno de Umbigocentrismo, a crença de que o mundo gira em torno de si, com a ideia de que tudo o que acontece é relacionado a ele mesmo. É uma visão egocêntrica, na qual o indivíduo considera-se o centro do universo e ignora ou minimiza a importância dos outros e do mundo ao seu redor.
Em um grande monólogo coletivo, no qual muitos falam e poucos escutam, as pessoas se tornam cada vez mais isoladas. As críticas àqueles que fogem do “meu escopo” são frequentes e acirradas. O mundo gira ao redor do umbigo, mas ninguém olha para o seu próprio para entender o que pode melhorar e efetivamente contribuir com o outro, inclusive o simples ato de ouvir – de verdade – torna-se cada vez mais raro.
As relações se tornam superficiais e utilitárias, baseadas no que o outro pode me oferecer, criando relações tipicamente líquidas e frágeis segundo Bauman. O querer fazer o outro feliz, ou contribuir para o bem-estar do alheio, é tomado pelo egocentrismo, e assim nos distanciamos de um princípio milenar que continua atual e urgente: amar ao próximo como a ti mesmo. Este ensinamento bíblico e universal revela-se um antídoto necessário na contramão do que vivemos.
As pessoas foram feitas para se complementarem e para construírem juntas as trilhas da vida, sobretudo porque não se totalizam em si mesmas. A cultura do “eu me basto” pode parecer libertadora, mas muitas vezes mascara uma recusa em se conectar e transforma vulnerabilidade em fraqueza, dependência em vergonha, e vínculos em ameaças à nossa autonomia. O resultado? relações superficiais, medo da intimidade, crítica aguçada para com o outro e uma consequente sensação de solidão.
Ao final, percebemos que a vida ideal e paralela vivida nas mídias sociais, passa a ser a que traz felicidade e encantamento, enquanto a vida real fica cada vez mais distante. E recordando a banda Ultraje a Rigor quando cantava: “eu me amo, eu me amo, não posso mais viver sem mim…” acreditamos que amar a si próprio e se valorizar, em momento algum exclui o amar e fazer pelo outro, de abraçar, entregar-se e do principal: viver a vida real, pois é essa que verdadeiramente arrepia a espinha e brilha os olhos.
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BOLETIM DA REDAÇÃO - 08/05/2025