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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Uma palavra que seja  

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publicado em 08/10/2023 às 07h20

Dias longos, dias assombrosos, dias sem luz, entre tantos azuis. Dias de calor, os mais quentes, que passam longe da Estadia no Inferno, de Rimbaud (foto). Dias que nada nos importa, sequer a porta, dias perto do mar, sem ver mar, dias sem conseguir gozar, dias sem fim. É doido, né?

Dias intocados, dias inesperados, desesperados, igual à Primavera Árabe ou a Noite da Facas Longas, na Alemanha, sequer o massacre da Noite de São Bartolomeu. em Paris; dias longos e noites em claro. Isso é pouco, quase nada, para uma pessoa que está com depressão.

Uma amiga me ligou, antes mandou mensagens, gelei. Parecia enxergar seus olhos claros no escuro, olhei para cena pelo espaço rápido da réstia do sol, por um segundo, como se a dor do mundo fosse responsável por congelar a estirpe do que ainda chamamos vida.

Minha amiga num momento absolutamente ausente, dentro e fora de si, me dizendo que não aguenta mais sequer o sensorial, ouvir uma música, uma oração, o coração, a voz que vem dos arcanjos, Miguel, Rafael e Gabriel. Nada.

Sob a luz de um instante cruel, uma mulher fala monossilábica, uma linda mulher. e eu achei, eu penso, eu desejo e imploro a Deus que tire as mulheres da rota da depressão, elas já carregam um fardo muito grande.

A partir dessa situação, a agonia, o coração no batidão, corri para o portão, (falando com ela ao telefone), quando o rapaz dos Correio me entrega um arco que veio da China para meu filho Vitor, que logo montou o arco e começa a atirar num tapume.  Meu pensamento lá no apartamento da amiga, aflita, me pedindo a mão.

A vida mostra, não simula o tempo não recebido, o tempo perdido, não resolvido, o tempo de espera na fila dos desesperados esperançosos.

Minha amiga V, perde a voz e eu querendo saber onde mora o milagreiro, a mulher que rezava em mim quando eu era pequeno, mas milagre nenhum cura essa doença, que se instala na gente, desde dos primórdios, desde que somos felizes e infelizes.

Corri pra casa dela, beije seu rosto, fiquei juntinho. Eu não estou inventado, eu não estou falando da morte, eu não estou focado no outubro rosa, (outros outubros virão), eu sempre penso  nos tempos de antes de eu nascer e já disse isso tanas vezes.

Minha amiga querida na terceira distância paralisada, o olhar longe. Essa doença nos arrebata e não é fraude de eternidade, é uma flecha, um conjunto de sensações estranhas, de que perdemos a paz, a integridade, a autoestima, a energia contínua do universo. É cruel. Não existe doença pior.

Eu astuto, dando pulos de alegria quando ajudo, uma palavra que seja, não cruzo os braços, a sutileza de  uma criança querendo brincar – olho no outro, uma chuva de imagens  que ainda me fazem chorar. Descomunal os dias em que fiquei andando tropeçando, diante de uma agonia, que desgastava incessante a minha vontade de viver. Escapei ferido.

A memória martelando,  memória e sentido confusos, desde que minha amiga me procurou ou a notícia de mais uma pessoa com depressão, que mexe com tudo que é fisiológico, desorientação, paladar, o vínculo com a vida e a degradação do cotiano em si.


A vida reclama, nos trai, mutações, alaridos, volumes de dores, dimensões outras, Amém.

Kapetadas

1 – Todo mundo pode te aconselhar, mas ninguém tem o direito de te calar.

2 – Todos têm medo de voltar ao Nada. Mas, sinceramente, isso à nossa volta por acaso é Tudo?

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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