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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Eu “soul” assim

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publicado em 01/10/2023 às 08h15
atualizado em 02/10/2023 às 07h53

Caetano Veloso sabe lembrar das pessoas, dos talentos, dos amores. Na canção “Trilhos Urbanos”, do disco que leva o mesmo nome, de 1979, ele canta: “como eu sei lembrar de você” e fica explícito que é para Gal Costa. “Pena de pavão de Krishna, maravilha, vixe, Maria mãe de Deus, será que esses olhos são meus? Cinema transcendental, Trilhos Urbanos Gal cantando o Balancê, como eu sei lembrar de você “.

Isso dele lembrar, é a certeza de que um artista como Caetano, da sua importância, “da maior importância”, desde há muito, faz citações de nomes de artistas (e amigos) nas canções, até usando signos, para que a gente faça a interpretação da letra, como está na canção “A Bossa Nova é Foda”, o bruxo de Juazeiro numa caverna do louro francês e o magno instrumento grego antigo.

No último disco “Meu Coco”, ele homenageia muita gente. Na canção GilGal (que significa”círculo de pedras eretas”) CV cita Wilson Bahtista, ao dizer que “vem de Pixinguinha a Jorge Bem, Pousa em Djavans, Wilson Baptista, Jorge Veiga, Carlos Lyra e o imenso Milton Nascimento”.

O Selo Sesc  produziu um disco lindo, junto com um livrinho organizado por Rodrigo Alzuguir, focado na obra do sambista Wilson Baptista. São dois discos que traz o clássico “Meu mundo é hoje – Eu sou assim “, que eu ouvia no rádio quando era garoto.

Com músicas inéditas do compositor fluminense Wilson Baptista, o trabalho do pesquisador, músico e produtor carioca Rodrigo Alzugir, biógrafo do artista nascido há 110 anos e morto há 55, é coisa para colecionador. “Soul” grato.

O álbum ganhou arranjos novos e participações de Alexandre Rosa Moreno, Ana Bacalhau, Áurea Martins, Ayrton Montarroyos, Beatriz Rabello, Cristina Buarque, Dori Caymmi, Filó Machado, Ilessi, João Bosco, Joyce Moreno, Larissa Luz, Lívia Nestrovski, Maíra Freitas, Marcos Sacramento, Mônica Salmaso, Moyseis Marques, Nei Lopes, Ney Matogrosso e Pretinho da Serrinha.

Wilson Baptista era o máximo, vem ala dos “marginais da música”, dos sambistas delirantes, da hora, “que andavam com amizades suspeitas pela Lapa, pelos cabarés e pelos pontos do jogo do bicho”. Nada demais, Wilson conhecia a malandragem como ninguém. Tinha amigos da pesada e agia como um malandro autêntico: sempre alinhado e com navalha no bolso. Imagina a figura!

Li que o Baptista não gostava do trabalho, queria viver de boa, tranquilo, sem dar duro, até que encontrou o melhor caminho: o samba e fez coisas incríveis. Eu faria também.
Era conhecido como compositor fértil, autor de mais de 700 músicas. Um brasileiro que não pensava no futuro – tá vendo, não existe o futuro. Vivia o presente, como se o mundo fosse acabar no dia seguinte, completamente feliz.

Entre os clássicos do Baptista, músicas que revelam a atemporalidade do compositor como a social “Pedreiro Valdemar”, de 1948 que fala do operário que constrói casas para muita gente e não tem uma para morar – mais atual impossivel – e “Nega Luzia” (aquela que “recebeu o Nero” e “queria botar fogo no morro”). Genial.

Baptista, um brasileiro que vivia na dele, sem arrependimentos e estava certo, pra que querer saber de arrependimentos, de sacanagens. A maior legião que existe hoje é dos ofendidos, dos magoados, de gente que só quer pra si. Seja circunstanciado, seja Cicero, seja Homero, seja o Baptista

Kapetadas
1 – Odeio que tudo que quer me dar é demais é pesado não há paz tudo que quer de mim irreais expectativas desleais. Delirante, né?
2 – Saco cheio de falar “eu acho” quando claramente eu tenho certeza.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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