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Antônio Colaço Martins Filho é chanceler do Centro Universitário Fametro – UNIFAMETRO (CE). Diretor Executivo de Ensino do Centro Universitário UNIESP (PB). Doutor em Ciências Jurídicas Gerais pela Universidade do Minho – UMINHO (Portugal), Mestre em Ciências Jurídico-Filosóficas pela Faculdade de Direito da Universidade do Porto (Portugal), Graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Autor das obras: “Da Comissão Nacional da Verdade: incidências epistemiológicas”; “Direitos Sociais: uma década de justiciabilidade no STF”. E-mail: [email protected]

Comoditização na Educação Superior – Parte 2

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publicado em 23/08/2021 às 07h31

José Salibi Neto e Sandro Magaldi, na obra “Estratégia Adaptativa: o novo tratado do pensamento estratégico”, diferenciam as estratégias de longo e de curto prazo, conforme o pensamento de Gary Hamel e C. K. Prahalad. Na estratégia de curto prazo, a competitividade é determinada predominantemente pelo preço e pela performance do produto.

Por outro lado, as estratégias de longo prazo bem-sucedidas baseiam-se na capacidade das organizações de consolidar tecnologias e habilidades para criar as competências essenciais, com o menor custo e a maior rapidez possíveis. Tais competências geram valor aos clientes na medida em que propiciam a criação de produtos de qualidade superior e/ou reduzem significativamente os custos de produção. O que se espera, a partir da aplicação das estratégias de longo prazo é que o consumidor perceba o benefício que o produto lhe traz, que a empresa tenha acesso a novos mercados e que os concorrentes da empresa tenham mais dificuldade de imitar os seus produtos.

O cenário atual da educação superior revela uma profunda e crescente comoditização. Os cursos online de R$ 99,00 (noventa e nove reais) – promovidos, notadamente, por grandes grupos educacionais – são a maior evidência de que diplomas de graduação se tornaram commodity. Tais cursos, entretanto, podem não desenvolver as competências que se espera de um profissional graduado.

John Erpenbeck, (foto) no artigo “Competency-based quality securing of e-learning (CQ-E)” prevê quatro dimensões de competências individuais a serem desenvolvidas também no e-learning: a) competências pessoais, como criatividade, responsabilidade pessoal, autenticidade etc; b) competências sociocomunicativas, como tolerância, persuasão e outras habilidades de comunicação; c) competências activity-related, como energia, resiliência etc; d) competências profissional-metodológicas, como know-how específico de uma atividade.

A educação por competências consiste em conduzir os estudantes para que esses interiorizem, mobilizem e articulem conhecimentos, habilidades e valores necessários para o desempenho de atividades profissionais, bem como para o exercício da cidadania. Assim, o graduado deve ser capaz de se auto-organizar para fazer uso dos conhecimentos, habilidades e valores assimilados na sua trajetória acadêmica para lidar com as diversas situações nas esferas pessoal e social.

Passar quatro anos na frente de uma tela de computador clicando “AVANÇAR”, como se estivesse a instalar um software, não me parece a melhor forma de se conquistar a capacidade de auto-organização acima mencionada. Paulo Freire posicionava-se contra aquilo que denominou “educação bancária”, caracterizada pelo constante depósito de conhecimentos na cabeça dos alunos. Cursos de graduação online 100% assíncronos e impulsionados tão somente pelo propósito de baratear os custos e os preços (estratégia de curto prazo) podem substituir a “educação bancária” por uma “educação download”, tão ineficiente quanto a primeira, em que pese o seu véu de modernidade.

No quadro atual do mercado da educação superior, as grandes corporações educacionais sairão fortalecidas com a venda e o descredenciamento de centenas (talvez milhares) de faculdades isoladas. Nesse cenário, as demais instituições de educação superior da livre iniciativa podem ser tentadas a igualar a oferta dos grandes grupos, adotando a estratégia de curto prazo de reduzir os preços. Na guerra de preços, contudo, as grandes corporações sempre terão vantagem competitiva.

Ao fim e ao cabo, creio que aqueles alunos que apostarem na educação superior puramente assíncrona, sem acompanhamento por parte de professores, não conseguirão desenvolver as competências que o mercado já demanda. Entendo que as faculdades privadas isoladas que priorizarem a estratégia de desenvolvimento de competências essenciais (longo prazo) terão mais condições de atravessar esse momento difícil. Tais instituições terão mais chances de se adaptar rapidamente para oferecer novos serviços educacionais, a partir das tecnologias disponíveis.

Em suma, a atual conjuntura do mercado da educação superior impele algumas instituições de ensino superior a adotar uma estratégia de preços, a partir da concessão de descontos e do corte indiscriminado de custos. A estratégia de desenvolvimento de competências essenciais, contudo, parece favorecer mais a longevidade dessas instituições, razão pela qual considero fundamental priorizá-la.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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